Título: O lobby do irmão do presidente
Autor: Aggege, Soraya e Macário, Lincoln
Fonte: O Globo, 09/06/2007, O País, p. 3
Gravações indicam que Lula sabia de ações de Vavá no governo e tentou impedir.
Gravações telefônicas feitas pela Polícia Federal, com autorização judicial, na Operação Xeque-Mate indicam que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sabia das atividades de lobista do irmão mais velho, Genival Inácio da Silva, o Vavá, e que tentou impedi-lo de continuar fazendo isso. Mesmo assim, nas gravações, o irmão de Lula pede dinheiro a um dono de casas de caça-níqueis, fala de suas tentativas de negociações em órgãos como Correios e Superior Tribunal de Justiça (STJ) e que temia que a PF estivesse monitorando seus passos.
Numa das gravações, Dario Morelli Filho, preso pela PF, ameaça avisar ao "titio" (que, para a PF, seria o presidente Lula) sobre as "picaretagens" de Vavá. Outro preso pela PF, Nilton Cezar Servo, acusado de comandar uma quadrilha de jogos ilegais em vários estados, chama o irmão de Lula de "véio cara de pau" e "picareta".
Um dos telefonemas transcritos pela PF, feito às 20h de 20 de maio, mostra que um homem de São Caetano do Sul, no ABC Paulista, identificado apenas como Roberto, procurou Vavá, supostamente a pedido de Lula. Vavá conta a Roberto que seguiria para Brasília para outro assunto. Roberto explica que precisa conversar com ele exatamente sobre Brasília. Pede que Vavá não viaje antes de conversar:
- Tem umas broncas da p. - diz Roberto
"Há algumas broncas lá"
Vavá pergunta o motivo, e explica que o objetivo de sua ida a Brasília seria mesmo conversar com Lula.
- O Lula quer que você vá lá um dia para conversar com ele à noite - diz Roberto, explicando que Lula lhe pediu para ir junto, para uma conversa em sua casa, à noite, com tranqüilidade.
Roberto pede para Vavá escolher um dia e ele responde que pretende ir e voltar no mesmo dia. Roberto reage, argumentando que há "algumas broncas lá" e que ele precisa saber antes, reclamando que Vavá "anda apresentando uma pessoa no Ministério".
Em seu relatório, a PF descreve: "Observa-se também que o presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva (o nome está grafado em letras maiúsculas) não tem qualquer participação ou mesmo conhecimento da prática dos crimes de tráfico de influência ou exploração de prestígio por parte de seu irmão Vavá."
Dois dias depois, às 9h22m, Vavá revela, em outro telefonema, que pretende fazer lobby nos Correios em favor de um homem não identificado, que inclusive já teria comprado sua passagem para Brasília. Nessa conversa com outro interlocutor, identificado como Rinaldo, do Banco do Brasil, Vavá pede R$2 mil emprestados. Rinaldo diz que não tem e indica outra pessoa, identificada como Marcelo.
O GLOBO localizou Marcelo ontem, pelo celular. Ele se recusou a fazer comentários e disse que não conhece Vavá. O irmão de Lula reclama que o negócio do irmão de Rinaldo está indo bem e Rinaldo pergunta se Vavá não iria ver também "o negócio do Correio". Vavá responde que iria lá (Brasília, segundo a PF) ver o caso ainda naquele dia. Ele conta que "o cara" já tinha passagens e que "o negócio vai sair sim". Rinaldo responde que é preciso acertar tudo para "o negócio ficar legal". Vavá, então revela ter conhecimento da ação da PF:
- Mas eu não fui (hoje para Brasília) porque a Polícia Federal está filmando muito, né Rinaldo? Vou esperar passar mais uns dias aí eu vou lá - disse, possivelmente se referindo à Operação Navalha.
Minutos depois, outro homem não identificado reclama que Vavá não foi para Brasília.
O irmão de Lula diz que não pode ir porque teria que fazer uma cirurgia na bacia e argumenta que "o cara vai estar na Câmara, o Marcos" e que, no dia seguinte estariam lá, Paulo e Vagner, para uma conversa. Os três ainda não foram identificados pela PF, mas seriam colaboradores de Vavá. Nos dias seguintes, Vavá recebe até pedidos pequenos, como a transferência de um policial federal, insatisfeito no Rio Grande do Sul. Ele explica que seu irmão, o presidente Lula, está envolvido com outros problemas, mas que ele poderia fazer o caso chegar ao ministro da Justiça (Tarso Genro).
Em um dos diálogos com Servo, gravado em 25 de março, Vavá diz que esteve com Lula por meia hora e se gaba do parentesco, alegando até que conversou com o presidente sobre bingos. Vavá diz que falou com Lula "sobre o negócio das máquinas lá, que esse pessoal precisa andar mais rápido".
E grita:
- O Lula é meu irmão!
Em seguida, Vavá diz que Lula lhe pediu para "pegar (ininteligível) para levar para ele (Lula) lá". Segundo a PF, a análise da conversa indica que Vavá está usando o nome de seu irmão para conseguir dinheiro junto a Servo, que, por sua vez, tentava vender a suposta influência de Vavá para terceiros, como indicam outras gravações.
Três dias antes, porém, Servo foi flagrado em outra ligação, para Dario Morelli Filho. Vavá teria prometido tentar intervir em uma ação no STJ.
- Bem que você falou, aquele véio é picareta mesmo, viu? E cara-de-pau! Ainda que me ligou agora e falei: pô Vavá, que falta de consideração do c., hein pô... Meu irmão, pô!.
Servo conta a Morelli que Vavá se justificou e ainda lhe pediu R$2 mil. Morelli responde que Vavá é "um filho da puta", louco, mas é interrompido por Servo:
- É irmão do cara.
Morelli responde:
- É irmão, mas tenho vontade de falar pro titio... Falar pro titio ó... só fala pro seu irmão lá pra parar de ficar pedindo dinheiro pros outros que ele tá meu..., tá f. hein!
Servo diz que "é melhor que o cara já comece errando no início que depois, no meio ou no fim", e pede para Morelli não contar ao "titio", no caso o presidente Lula, segundo a PF.
Edison Inácio da Silva, filho de Vavá, disse ontem à noite que não comentaria essas gravações enquanto não as ouvisse. Ele afirmou que ontem conversou com os advogados contratados para defender o seu pai. Segundo Edison, os advogados lhe disseram que o volume de gravações e documentos é muito grande.
* da Rádio CBN