Título: Magistrados e delegados reagem a limitar grampos
Autor: Carvalho, Jailton de
Fonte: O Globo, 12/06/2007, O País, p. 5

SUCESSÃO DE ESCÂNDALOS: Até a OAB faz críticas à restrição.

"O problema é o vazamento da escuta", diz Rodrigo Collaço.

BRASÍLIA.A decisão do ministro da Justiça, Tarso Genro, de desengavetar o projeto que restringe o uso de escuta telefônica e ambiental por parte da Polícia Federal e das polícias civis provocou forte reação de magistrados e policiais que estão na linha de frente do combate ao crime organizado. Até o presidente a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Cezar Britto, vê com reservas a proposta, embora defenda a imposição de limites às investigações policiais. Há duas semanas, Tarso determinou a reelaboração do projeto que restringe escutas e dificulta a divulgação, pela imprensa, do conteúdo de investigações sigilosas, como revelou ontem o GLOBO.

As escutas são alguns dos instrumentos mais temidos por políticos, lobistas, empresários e servidores públicos flagrados nas operações da Polícia Federal de combate à corrupção. Pela proposta, que está sendo elaborada pela equipe de Tarso, as autorizações para as escutas telefônicas e ambientais terão que ser amparadas em pareceres favoráveis do Ministério Público. Hoje, a PF faz o pedido diretamente ao juiz de cada caso. O projeto encurta os prazos em que a polícia pode recorrer ao monitoramento telefônico ou às escutas ambientais.

- Esse projeto vai comprometer a agilidade e a eficiência da autoridade policial. Às vezes, eu tenho críticas pontuais à pirotecnia e vazamentos. Mas acho que a PF está fazendo um trabalho em prol da sociedade - afirmou Walter Nunes, presidente da Associação Nacional dos Juízes Federais (Ajufe).

Nunes criticou a proposta de obrigar magistrados a compartilhar com procuradores decisões sobre quebra de sigilo telefônico. Segundo ele, os magistrados têm capacidade e independência para deliberar sobre os pedidos da polícia e resguardar as garantias individuais dos investigados. O presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), Rodrigo Collaço, considera o projeto desnecessário. Segundo ele, as escutas são instrumentos que têm ajudado muito na produção de provas contra o crime organizado:

- O problema não é a escuta. O problema é o vazamento da escuta. Mas isso não precisa de uma nova lei. Já é crime.

Polícia deveria investigar vazamentos, diz Collaço

Para o magistrado, eventuais excessos poderiam ser coibidos com investigações rigorosas da própria polícia sobre vazamentos seletivos. Parte da crítica é partilhada até pela OAB. O presidente da entidade, Cezar Britto, defende a imposição de limites às escutas. Para ele, a polícia deveria ser proibida de fazer escutas em escritórios de advocacia. Ele compara a atividade do advogado à atuação de um jornalista numa redação ou a de um padre num confessionário. Ainda assim, ele entende que a inclusão do Ministério Público nas deliberações sobre escutas torna o sistema criminal ainda mais burocrático:

- É normal que se regulamente o grampo no Brasil para que o grampo não seja utilizado como elemento de perseguição ou formação de culpa. Mas o Ministério Público não pode ser avalista do grampo.

A reação mais forte partiu do presidente da Associação Nacional dos Delegados da Polícia Federal, Sandro Torres. Segundo ele, o assunto vem sendo discutido por delegados da PF desde que o tema foi posto em pauta pelo ex-ministro Márcio Thomaz Bastos, em 2003. Os delegados que comandam as grandes operações têm sido unânimes em criticar a imposição de limites. Para eles, a redução de prazos de escuta pode inviabilizar as grandes operações da PF:

- Se limitar os prazos, vamos ter que combinar com os bandidos para que eles falem no telefone tudo de errado num prazo de 30 dias. Só tem um detalhe : isso é um impossível.

A professora Ada Pellegrini, ex-presidente da comissão especial encarregada de elaborar o projeto de restrição às escutas telefônicas, na gestão de Thomaz Bastos, elogiou a iniciativa de Tarso. Segundo ela, a lei de monitoramento telefônico em vigor é frouxa:

- Hoje não há controle algum. Ninguém sabe de quem é a responsabilidade das escutas, se é do juiz, da operadora telefônica ou da polícia.

O projeto elaborado pela comissão presidida por Ada só permitia a escuta para investigações de 14 crimes. Entre eles, não estão casos de corrupção. Um dos trechos do projeto prevê penas ainda mais duras para funcionários públicos que vazem informações sigilosas para a imprensa. A Associação Nacional do Ministério Público elogiou a iniciativa de Tarso.