Título: Avanços e limites
Autor: Leitão, Mìriam
Fonte: O Globo, 14/06/2007, Economia, p. 28

O crescimento do PIB divulgado ontem, que, na comparação com o trimestre anterior, foi magro, de apenas 0,8%, deve garantir - e pode até aumentar - a expectativa do mercado para o ano. Há três trimestres que o PIB cresce acima de 4% contra o mesmo período do ano anterior. No fim do ano, pode aumentar além dos 4,5%. Consumo das famílias cresce há 14 trimestres e o investimento também tem mostrado força. Há várias boas notícias nesse resultado. O problema é que, mais uma vez, o país parece não aproveitar o bom momento para garantir um crescimento sustentável por anos.

O resultado veio um pouco abaixo daquilo que parte do mercado esperava. Mesmo assim, muita gente continua achando que isso não vai abalar as expectativas de um crescimento do PIB de 4,5% no ano, espécie de meta estipulada pelo governo. Algumas pessoas no mercado acham, inclusive, que o resultado pode ser maior. No ano passado, o dado do primeiro trimestre em relação ao mesmo período do ano anterior também foi forte, de 4,1%; mas, ao longo do ano, as previsões foram sendo reduzidas, e o crescimento do PIB de 2006 acabou abaixo disso. Este ano a história não deve se repetir.

Há, de fato, bons sinais. O melhor deles é que a Formação Bruta de Capital Fixo, ou seja, o investimento, continua crescendo; e bem. Foram 7,2% no trimestre contra o mesmo período do ano passado. Na comparação com o trimestre anterior, também cresceu, 2,1%.

- Na margem, o número é muito bom. Os 2,1% dão quase 9% anualizado. Boa parte disso é fruto da estabilidade. Os empresários estão investindo mais porque confiam na estabilidade do país, e também na estabilidade dos preços - comenta José Júlio Senna, da MCM Consultores.

O Credit Suisse, na sua avaliação sobre o PIB, chamou a atenção para o forte aumento dos investimentos. Destaca que eles "cresceram, na margem, em ritmo superior ao dobro do PIB". Aumento da formação bruta de capital fixo é sempre um bom sinal de que a economia tem chances de continuar crescendo.

Porém há uma questão em se tratando deste aumento recente dos investimentos. Alguns analistas observam que está havendo um aumento maior do número de máquinas e equipamentos comprados que uma ampliação efetiva do parque industrial. Os empresários adicionam novas máquinas, mas não constroem novas fábricas. Investimento é sempre bom. Porém o melhor é que seja mais vigoroso, ampliando a capacidade de o país produzir.

O consumo das famílias é outro que vem dando notícias positivas. Há 11 trimestres, desde 2004, cresce mais que 4% na comparação com o mesmo período do ano anterior. Desta vez, mesmo que tenha aumentado 0,9% na margem, cresceu 6% contra o primeiro trimestre de 2006. E deve permanecer nesta toada. O crédito continua se ampliando e a queda dos juros faz com que ele fique ainda mais barato e se expanda. A renda também está aumentando. Isso posto, o consumo das famílias, item mais relevante da composição da demanda do PIB, deve ter mais trimestres de forte alta.

As exportações, a despeito do câmbio, ainda mostram força no PIB. A extrativa mineral - leia-se Petrobras e Vale - trouxe mais uma vez um bom número e foi o destaque da indústria. Mesmo o dado que veio negativo, o da agropecuária, está causando certa estranheza entre os analistas de mercado, pois, pelos números com que se vinha trabalhando, ninguém esperava uma queda como a de 2,4%, na comparação com o trimestre anterior. O que veio alto foi o consumo do governo, que aumentou 3,5% contra o último tri de 2006.

Mas, se os dados do PIB exibiram diversos bons sinais, eles acabam disfarçando várias questões graves do Brasil. Muitas são antigas, mas parecem não sair nunca da lista de preocupações. Duas delas se destacam.

A primeira é não saber aproveitar o bom momento, o bom nível de atividade, para fazer reformas e mudanças que vão garantir o crescimento futuro. Desde o começo dos anos 80, um dos grandes problemas do crescimento brasileiro é que o PIB sobe por períodos curtos entremeados por épocas de baixa. Esse desafio, por mais que haja hoje boas notícias, não desapareceu do nosso horizonte. Mas as discussões para tentar resolver os gargalos estão paradas.

A outra questão diz respeito aos modelos que são usados para enfrentar os problemas. Esta semana foi dado um péssimo sinal com o pacote de ajuda a alguns setores industriais, sob o argumento de que eles são vítimas da política cambial e que, por isso, precisam ser ressarcidos. Com essa decisão, o governo conseguiu reapresentar o que há de pior na política industrial dos anos 70; uma política que levou à concentração de renda e a várias distorções na economia brasileira.

Colhemos bons dados, mas eles, em vez de trazer mais avanços, têm produzido paralisia e retrocesso. Melhor que uma boa notícia é ter boa notícia no mercado futuro. Essa tem sido a decepção no Brasil, cresce-se sem garantia de que isso vai se manter no futuro.