Título: Como agir contra a corrupção
Autor: Samans, Richard
Fonte: O Globo, 19/06/2007, Opinião, p. 7

Entre as barreiras na eliminação da corrupção está a crença de que, como a morte e os impostos, ela é inevitável. Entretanto, essa visão é paradoxal à atual redução da tolerância da opinião pública global em relação a essa prática. Governos, ONGs (como a Transparência Internacional) e organizações multilaterais estão obtendo importantes avanços no combate ao problema. Em 1998, mais de 35 nações (entre elas o Brasil) assumiram compromissos rígidos com a Organization for Economic Cooperation and Development (OECD) contra a prática de propina. Recentemente, mais de 100 países assinaram a Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção (Nations Convention Against Corruption, Uncac).

As iniciativas que tentam resolver a questão apenas pelo lado da demanda de corrupção (setor público) são essenciais, porém insuficientes. Para eliminar o problema, o flanco da oferta também deve ser combatido. Nesse sentido, as empresas, que freqüentemente são os agentes que executam pagamentos ilícitos aos governos ou outras organizações, têm um papel primordial na luta contra práticas corruptas. De acordo com o Banco Mundial, praticamente 50% da ajuda financeira para o desenvolvimento internacional é perdida em subornos. Segundo o Instituto do Banco Mundial, US$1 trilhão é pago globalmente todos os anos em propina. Esse montante equivale ao valor de mercado das empresas brasileiras listadas na Bovespa.

Mesmo assim, hoje, projetos globais anticorrupção envolvendo o setor privado alcançam menos de 1% dos negócios mundiais. Atualmente, o único programa global que aborda esse tema, e que conta com apoio empresarial, é a Iniciativa de Parceria Contra a Corrupção do World Economic Forum (Partnering Against Corruption Initiative - Paci). O Paci foi lançado em 2004, quando empresas do mundo inteiro, auxiliadas pela Transparência Internacional e pelo Instituto de Governança de Basiléia, criaram uma série de princípios contra a corrupção. Por meio da aceitação dessas regras, as companhias se comprometem a implementar uma política de tolerância zero contra subornos e a desenvolver e implementar um programa abrangente e efetivo contra a corrupção para nortear o comportamento dos seus funcionários. Esses modelos são de suma importância na medida em que regulamentam e oferecem definições claras de padrões éticos em casos duvidosos como, por exemplo, contribuições para partidos políticos, doações para instituições de caridade, patrocínios, pagamentos para facilitar processos, presentes e hospitalidade, mostrando a partir de que ponto esses pagamentos são considerados subornos.

Além disso, o Paci está trabalhando com as quatro principais firmas de auditoria contábil globais para a criação de um sistema de verificação independente.

Acontecimentos recentes mostram que o setor privado brasileiro está muito comprometido na luta contra práticas corruptas e propina. Entre as 120 companhias envolvidas com o Paci - que representam mais de US$600 bilhões em receitas - estão duas brasileiras. Além disso, o programa uniu forças com o Pacto Brasileiro para Integridade e Combate à Corrupção (Pacto) do Instituto Ethos, para trabalharem essa questão em conjunto. A meta é de assegurar a participação de um número maior de empresas brasileiras e internacionais em ambas as iniciativas e de aumentar a conscientização empresarial para combater a corrupção.

O Paci também colabora com o Banco Interamericano de Desenvolvimento para combater a corrupção e o suborno na América Latina. O trabalho abrange pequenas e médias empresas, especialmente as fornecedoras das grandes multinacionais. Um dos ângulos da ação se foca em exigir certificados anti-suborno dos participantes de concorrências em grandes contratos. Ou seja, incluir uma cópia do código de conduta e das políticas contra a corrupção entre os documentos de licitação, evidenciando seu compromisso com essa questão.

É importante ressaltar que a prática representa um custo significativo para todas as organizações, já que é freqüentemente ligada a regimes de repressão que causam pobreza e criam condições operacionais mais difíceis. É um problema grave, que representa bilhões de dólares e priva sociedades menos privilegiadas dos investimentos que tanto precisam. A corrupção reduz o patrimônio nacional, enfraquece a lei, reduz a confiança nos sistemas políticos e incentiva a exploração irracional dos recursos naturais. Ela reduz também a competitividade das nações. A Pesquisa Executiva do Relatório de Competitividade Global, do World Economic Fórum (que no Brasil inclui opiniões de 200 dos seus principais líderes empresarias), mostra que durante os últimos cinco anos a corrupção está entre os dez maiores impedimentos na hora de fazer negócios no país.

Não é suficiente tomar uma postura contra a corrupção. Todos precisam se comprometer e agir para acabar com ela. Sem dúvida, essas são práticas criminosas, e devem ser punidas dessa forma.

RICHARD SAMANS é diretor-administrativo do Instituto Global para a Parceria e a Administração, do World Economic Forum.