Título: Fazendas estão em nome de outros
Autor: Gois, Chico de e Gripp, Alan
Fonte: O Globo, 21/06/2007, O País, p. 9

Artifício permitiu a Renan manter patrimônio oculto até o início de denúncias.

BRASÍLIA. Nem todas as fazendas citadas pelo senador Renan Calheiros (PMDB-AL) para justificar a venda de gado pertencem a ele ou estão registradas em seu nome. Entre os documentos entregues por ele ao Conselho de Ética do Senado, constam Guias de Transporte de Animais (GTAs) atestando como um dos locais de origem dos bois vendidos para abate a Fazenda Vila D"Água, que não consta das declarações de bens incluídas por Renan em sua defesa.

Outras três fazendas aparecem nas GTAs entregues pelo senador: a Santa Rosa, a Vale da Serra e a Furquilha. A primeira é a principal propriedade dos Calheiros em Murici, interior de Alagoas, e pertence ao espólio do patriarca da família, Olavo Calheiros. A fazenda é da mulher de Olavo, Ivanilda Calheiros, e dos seis filhos do casal, entre eles Renan. A Vale da Serra, o presidente do Senado declara apenas explorá-la.

Senador não pôs em seu nome fazenda comprada do irmão

Já a Furquilha, o senador declara ter comprado em 2003, por R$300 mil, do irmão, Olavo Calheiros, e de sua mulher, Ana Werusca. No entanto, curiosamente, até hoje, quase cinco anos depois, a propriedade não foi transferida para o nome de Renan, como mostram certidões obtidas pelo GLOBO em Alagoas.

O mesmo aconteceu com a fazenda Alagoas, no município vizinho de Flexeiras, que Renan declara ter comprado, mas que não está escriturada em seu nome. A propriedade, segundo a declaração de bens do presidente do Senado, foi adquirida, em 2004, por R$400 mil, de Tito Uchôa, um aliado político de longa data. As duas propriedades têm juntas mais de 1.200 hectares, segundo as certidões.

Especialistas dizem que o fato de Renan não ter transferido os bens para o seu nome não configura uma irregularidade. Mas o artifício permitiu ao senador manter seus bens ocultos publicamente até o início das denúncias contra ele, já que as declarações de renda são protegidas pelo sigilo fiscal, e as certidões de cartório podem ser obtidas por qualquer cidadão.

Além disso, pode criar problemas para quem vendeu as terras e ainda as tem em seu nome.

- É a mesma coisa que comprar um carro e não transferir para o seu nome. As multas vão continuar chegando para o antigo dono. No caso de imóveis, dívidas podem ser executadas com a penhora dos bens dele - diz o advogado Marcos Raposo, que trabalha na principal imobiliária de Maceió.

Valor declarado de uma propriedade foi de R$120 mil

Segundo Raposo, muitos compradores de imóveis em Alagoas adiam a transferência dos bens para seus nomes para escapar dos altos impostos e taxas cobradas na hora de lavrar as escrituras.

Renan tem ainda outra fazenda na mesma região, de Mata Atlântica. A Novo Largo foi declarada por ele no IR referente a 2003, no valor de R$120 mil.