Título: Um cheque de conta encerrada para pagar gado
Autor: Gois, Chico de e Gripp, Alan
Fonte: O Globo, 21/06/2007, O País, p. 9

SUCESSÃO DE ESCÂNDALOS: Nos documentos, há cheques de outra empresa pagando pela compra da Carnal.

Três supostos fornecedores de gado para Renan Calheiros sequer abriram contas nas agências citadas nos recibos.

MACEIÓ e BRASÍLIA. A papelada entregue pelo presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), ao Conselho de Ética está complicando ainda mais sua situação. Há casos em que os supostos clientes para os quais teria vendido gado de suas fazendas nunca abriram conta nas agências bancárias em Maceió mencionadas nos recibos. Três supostos fornecedores de Renan têm conta nas mesmas agências, o que sugere, segundo um especialista da Receita Federal ouvido pelo GLOBO, que elas podem ter sido abertas em nome de laranjas.

Segundo os recibos entregues ao Conselho de Ética, em 9 de fevereiro de 2005, o senador atesta que recebeu da empresa Carnal R$ 42.333,87 pela venda de 40 bois. O pagamento teria sido feito por intermédio de dois cheques: um de número 002277, do Bradesco, agência 3411 (localizada na Avenida Fernando Lima, no Farol), e outro, de número 838199, do HSBC, agência da Rua do Livramento, no Centro de Maceió. Em 7 de março do mesmo ano, Renan teria voltado a vender para a Carnal. Dessa vez, o valor da transação foi de R$20.857,20. Dois cheques serviram de pagamento: das mesmas agências do Bradesco e do HSBC.

Tudo estaria de acordo, não fosse um detalhe: a Carnal nunca teve conta no HSBC, e sua conta no Bradesco, de número 10.410, foi fechada em junho de 2004 - mais de sete meses antes da suposta emissão dos cheques, de acordo com os recibos de Renan.

Dados da Secretaria da Fazenda de Alagoas atestam que o açougue foi desativado em agosto de 2005. Tinha como sócios João Teixeira dos Santos e José Vicente Ferreira. Nos documentos de Renan, há cheques de outra empresa pagando pela compra da Carnal.

Conta encerrada em janeiro

Outro estabelecimento que tem conta nas mesmas agências e bancos que a Carnal é a GF da Silva Costa. A Secretaria da Fazenda informa que ela está inabilitada desde 16 de agosto de 2005. Seu proprietário era Genildo Ferreira da Silva Costa. A GF comprou de Renan, segundo os recibos, R$164.788,77. Foram oito transações, que começaram em junho de 2005 e terminaram em abril do ano passado. Os pagamentos da GF pelos bois de Renan foram feitos em cheques do Bradesco e do HSBC, nas mesmas agências onde a Carnal teria conta corrente.

A conta do Bradesco, como informa um dos recibos, era de número 2931. O GLOBO procurou a agência para supostamente fazer um depósito nessa conta, mas foi informado que ela foi encerrada em janeiro deste ano - cinco meses depois de a empresa ser desativada na Secretaria da Fazenda de Alagoas.

Na segunda-feira, o GLOBO já havia noticiado que o mesmo número de cheque da agência do Bradesco aparecia em duas transações diferentes da GF da Silva Costa com Renan. O presidente do Senado não explicou de que forma isso ocorreu.

No HSBC, a conta foi fechada no "finzinho de 2005 ou início de 2006", como informou um funcionário. Porém, em abril do ano passado a GF ainda movimentou R$14.930,20 para pagar ao senador.

Outro cliente que faz movimentações na mesma agência que os outros dois açougues é a Stop Carnes. Ela tem quatro contas, embora o estabelecimento seja minúsculo. O açougue é considerado inativo pela Secretaria da Fazenda desde agosto passado, mas permanece com a porta aberta, em Satuba, cidade vizinha a Maceió.

* Enviado especial