Título: Em 2008, a eleição do tanto faz
Autor: Maia, Cesar
Fonte: O Globo, 22/06/2007, Opinião, p. 7

O Democratas realizou uma pesquisa nacional, através do Instituto GPP, com duas mil entrevistas entre os dias 19 e 22 de maio último, na qual procurou seguir metodologia utilizada na França e cujos resultados foram publicados no "Nouvel Observateur" antes das eleições locais. No enquadramento do eleitor para fins de cruzamento, além das questões clássicas quanto a gênero, idade, renda e nível de instrução, foram incluídas outras. Por exemplo: 45,9% dizem que não costumam ler jornais, 34,5% não costumam ouvir rádio e só 11% não costumam ver os noticiários na TV. E mais: 21,6% dizem que eles ou seus parentes são beneficiados pelos programas assistenciais do governo federal, sendo que 18,6% pelo Bolsa Família.

A primeira importante conclusão do estudo é que os eleitores estão muito otimistas neste momento. Isto se conclui através das respostas a duas perguntas: em relação a seus pais vocês estão em melhor situação? Seus filhos estarão melhor do que vocês no futuro? Somando muito melhor com um pouco melhor, 74,8% disseram sim em relação aos pais e 71% em relação aos filhos. Números que não me lembro de ter visto em pesquisas em muitos anos. Apenas 5,5% se autolocalizam nas classes altas; 54,9% se vêem como classe média, média e baixa; e 36,3% dizem pertencer à classe baixa ou trabalhadora. Mas há 36,2% que não conseguem situar-se ideologicamente. Entre os que têm até o primeiro grau, este valor sobe para 45,2% e chega a 46,4% entre os de famílias que ganham até dois salários mínimos.

Do total, 14,4% se dizem de esquerda (mas vai para 24,5% se somarmos os de centro-esquerda), 16,6% se dizem de centro e 17,2% se consideram de direita, sendo que se a eles somarmos os de centro-direita teremos um resultado de 22,7%.

Daqui em diante, vêm as informações mais relevantes. Uma delas diz que o eleitor brasileiro é basicamente conservador, não importa qual seja a sua referência ideológica. Aliás, somente uma faixa pequena dos entrevistados situa-se coerentemente sobre ideologias. Mesmo os que responderam não fazem a menor conexão entre idéias e valores e ideologias.

Quando se pergunta sobre o que o eleitor considera bastante positivo, 75,2% respondem religião; 71,7%, trabalho; 71,2%, moral; 69,1%, nação; 67,5%, livre iniciativa; 62,6%, ordem, etc... As maiores rejeições são relativas à privatização, 27% acham positivo e 41,1% negativo, e ao MST, 18,9% e 50,7%, respectivamente.

Uma informação relevante: o eleitor não entende direito o que é distribuição de renda. Parece pensar que se trata de tirar dinheiro dele, pois 32,6% acham negativo. Corrijam, pois, a comunicação.

Todos ou quase todos são a favor do Bolsa Família: 75,5%. Neste outro bloco, seguem respostas de corte claramente conservador: contra casamento de pessoas do mesmo sexo, são 56,8%; contra a legalização da maconha, 80%; contra a legalização do aborto, 73,3%. Quanto à adoção de regime militar para menores detidos, 69,7% são a favor; 50,3% querem reestatizar a Vale do Rio Doce e 59,5% querem rever a CLT e reduzir os encargos das empresas.

Quando se cruzam estes dados com os que se dizem de esquerda (pura) e de direita (pura), as porcentagens não mudam muito. Contra casamento do mesmo sexo: esquerda, 54,9% e direita, 58,8%. Contra aborto: esquerda, 71% e direita, 79,8%. Regime militar para menores infratores: esquerda, 69,9% e direita, 69,4%. E por aí vai.

As notas dadas a Lula são quase iguais: esquerda, 6,4 e direita, 6,6. E seguem assim as notas para segurança (3,6 e 4,1), saúde (6,3 e 6,6), demonstrando que os que se dizem de direita são até mais generosos em relação a Lula. Da mesma forma, quando a pergunta é onde Lula foi melhor os resultados foram: programas para os pobres (33,5%) e economia (27,6%). No primeiro, os de esquerda são 39,1% e os de direita, 34,3%, enquanto no segundo, 30% e 24,1%.

Onde Lula vai pior? Segurança, para 44,1% (esquerda 46,4% e direita 48,6%), e saúde, para 22,8% (21,4% esquerda e 20,3% direita).

Os que querem reduzir a idade penal são 24,3%, sendo 24,7% de esquerda e 22,9% de direita. Exército nas ruas é opção para 15,2%, sendo 16,2% de esquerda e 15,5% de direita. Na saúde, o que se quer é construir e reformar hospitais: 38,6%, com 37,2% entre os de esquerda e 42,9% de direita. Saúde da família, o carma dos sanitaristas de esquerda, é destacado por 12,2%, sendo que apenas 9,8% entre os de esquerda e 11,4% nos de direita.

Todos os partidos têm imagem negativa, que gira em torno de 40%. O curioso é que o PT é o que tem melhor imagem entre os de direita. O PMDB é percebido quase numa linha horizontal e o PSDB cresce em direção à direita. O DEM/PFL não tem marca.

A conclusão final é que o eleitor brasileiro é CONSERVADOR, valores, importância do Estado... Nada tem de IDEOLÓGICO e neste momento está muito otimista.

Lula, com 38% das notas de 8 a 10, não está acomodado e pode ser corroído. Seu governo, no mínimo, não mudou o eleitor brasileiro, que continua tão ou mais conservador que antes. Segurança e saúde são os pontos fracos do presidente e devem ser cada vez mais colados a ele pela oposição.

O PT e Lula, que não navegavam nas águas da direita, agora o fazem, provavelmente legitimados pelos de direita que estão sempre nos governos, ou por suas políticas - tão iguais às de antes. Pelo que nos diz a pesquisa do DEM, 2008 pode ser a eleição do tanto faz.

CESAR MAIA é prefeito do Rio.