Título: Onda de ameaças deixa Senado em pé de guerra
Autor: Lima, Maria e Vasconcelos, Adriana
Fonte: O Globo, 22/06/2007, O País, p. 11

SUCESSÃO DE ESCÂNDALOS: Agripino Maia, Demóstenes Torres e Jefferson Peres seriam o alvo dos ataques pessoais.

Assessores e aliados de Renan estariam espalhando notícias sobre vida pessoal de senadores para intimidá-los.

BRASÍLIA. O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), teve de ir ontem ao plenário da Casa para negar que seus assessores e aliados estavam espalhando ameaças veladas a líderes da oposição que dificultam sua situação no Conselho de Ética. Desde terça-feira, pessoas próximas a Renan contavam, pelos corredores do Senado, fatos pessoais que deixariam em dificuldades pelo menos dois senadores: um teria viajado com a namorada para os Estados Unidos com as despesas pagas pelo Congresso; outro teria uma dívida de R$50 milhões num banco oficial.

A possibilidade de que Renan estivesse fazendo ameaças para intimidar adversários provocou a reação irada dos envolvidos, logo identificados como o líder do DEM no Senado, Agripino Maia (RN) - no caso da dívida -, e do senador Demóstenes Torres (DEM-GO), no caso da viagem com a suposta namorada. No rastro dos boatos, integrantes da tropa de choque de Renan tentaram levantar suspeitas inclusive de parlamentares do chamado grupo ético do Congresso, como o senador Jefferson Peres (PDT-AM).

Demóstenes explicou que todos os anos viaja a Nova York, onde participa da sessão da ONU, e leva uma assessora parlamentar porque não fala inglês. Disse que as insinuações deixaram a assessora em situação delicada, e que ela realmente é linda, mas não é sua namorada ou amante.

- O Renan disse que ia chamar todo mundo para o mesmo nível. Mas ele que fique sabendo que essa tática do cangaço não funciona. É uma tentativa imbecil de nos desqualificar. Fica ruim, porque hoje eu sou solteiro, mas naquela época eu era casado. Não foi cometida nenhuma ilegalidade nem imoralidade. Como as informações são de que um dos que estão espalhando isso contra mim, o Agripino e o Jefferson Peres é o Douglas, seu assessor de imprensa, tenho que acreditar que a ordem partiu do chefe - reagiu Demóstenes.

No plenário, antes de discursar, Agripino conversou com Renan na Mesa, mostrando desconforto. Renan, então, pediu um aparte para se defender, antes de Agripino falar. Segundo a assessoria do líder do DEM, a dívida dele com o Banco Noroeste é de cerca de R$2 milhões e não de R$50 milhões, e não foi paga porque está sendo contestada na Justiça.

- Nesse processo kafkiano de ataques especulativos, de que algumas pessoas são vítimas, diariamente surgem muitas intrigas. Mas o Senado, que me conhece sobejamente, sabe muito bem que ameaças e insinuações não fazem parte da minha personalidade. Eu queria, senador Agripino, com a sua aquiescência, dizer isso da presidência do Senado Federal, para que não haja dúvida com relação a qualquer tipo de intriga que daqui por diante houver com relação a nenhum senador - disse Renan.

- Realmente, a Casa está inundada de boatos, atingindo e colocando sob suspeita muitos. Eu não podia esperar outra atitude, até porque, na relação que existe entre os senadores, não cabe outra atitude que não seja marcada pela franqueza. E franqueza pressupõe que, se há alguma coisa, que se diga logo, que não se ameace... Então, como considero Vossa Excelência homem de caráter, acolho completamente a manifestação de Vossa Excelência e acho que ela, de certa forma, sepulta as especulações que, devo reconhecer, tomaram conta da Casa no dia de hoje - respondeu Agripino.

No plenário, a reação dos senadores é de perplexidade com a evolução do clima.

- Se o Renan fizer isso, partir para ameaças, ele morre. Não acho que seja o estilo dele, que é extremamente frio - comentou o senador Heráclito Fortes (DEM-PI).

Depois de ter sido abandonado pelos próprios aliados, na última reunião do Conselho de Ética, anteontem, Renan está disposto a partir para o tudo ou nada e afirma que não abrirá mão, em hipótese alguma, de permanecer no comando da Casa até a conclusão do processo. Ainda que isso possa desgastar a instituição ou comprometer a governabilidade.

Renan estaria irritado com postura dos petistas

Embora continuasse inconformado com a mudança de posição do senador Valter Pereira (PMDB-MS) - um aliado que aderiu à tese de adiamento da decisão -, Renan estava ontem especialmente irritado com o PT, de quem se sentia um credor pela postura solidária que manteve diante das inúmeras crises deflagradas no primeiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Renan já teria feito chegar ao Palácio do Planalto advertências sobre os possíveis desdobramentos do processo contra ele.

Nenhum dos quatro petistas - Eduardo Suplicy (SP), João Pedro (AM), Augusto Botelho (RR) e Sibá Machado (AC) - que participaram da reunião do Conselho se alinharam à sua estratégia de arquivar o processo.

- Os petistas não têm coração, não sabem o que é uma amizade. Quando a crise é com eles, acham que todos têm de ajudar. Mas correm quando a crise é com seus aliados - disse um interlocutor do presidente do Senado, que concordou com o desabafo que ouviu de Renan, quarta-feira à noite.

Segundo esse interlocutor, Renan teria inclusive falado de ameaças ao governo. A disposição do presidente do Senado seria a fazer tudo para levar outros juntos, caso sua situação se complique ainda mais.