Título: Com dia e hora para continuar
Autor: Doca, Geralda e Alvarez, Regina
Fonte: O Globo, 22/06/2007, Economia, p. 23

APAGÃO AÉREO

Aeronáutica ordena mais uma prisão e promete medidas para conter controladores.

AAeronáutica determinou ontem mais uma prisão administrativa: o vice-presidente da Federação Brasileira das Associações de Controladores de Tráfego Aéreo (Febracta), Moisés Gomes de Almeida, ficará detido a partir de segunda-feira, por uma entrevista dada à Rádio CBN há uma semana. A prisão do presidente da federação, Carlos Trifilio, também por entrevistas não autorizadas pela Força Aérea Brasileira (FAB), já havia sido ordenada. Desde a tarde de ontem, já se sabia que o Comando da Aeronáutica preparava uma dura reação à operação-padrão dos controladores de vôo do Cindacta 1 (Brasília), que causou novo apagão aéreo no início da semana - os atrasos nos aeroportos ontem chegavam a 38,1%. Segundo fontes, o comandante da Força Aérea Brasileira (FAB), Juniti Saito, reuniu ontem seus auxiliares e determinou acionar um plano imediato para minar o movimento.

Entre as medidas, está a convocação de controladores de outras regiões para fazer o trabalho dos sargentos que se recusarem a abrir consoles (equipamentos para monitorar os vôos) para atender a um maior fluxo de aviões. Brasília é considerado o principal foco de resistência. Novas prisões não estão descartadas, mesmo que em número elevado, disse um oficial. O comandante do Cindacta 1, coronel Eduardo dos Santos Raulino, reteve ontem à noite os cerca de 60 sargentos do Cindacta 1 para uma reunião. Segundo fontes, Raulino disse que colocaria ordem na casa, que estava sob pressão e que não admitiria qualquer tipo de desmando. Ele acusou controladores pelo caos desta semana.

Desde a noite de terça-feira, apenas dois dos cinco equipamentos que monitoram o tráfego em São Paulo (de intenso movimento) estavam em operação. A FAB diz que não há problemas com as máquinas, mas os sargentos dizem que há borrões nas telas.

Na reunião com assessores diretos, afirmou um oficial da FAB, Saito garantiu que as providências não passariam de hoje. Na quarta-feira, quando estava em Paris, onde participava de uma feira aeronáutica, Saito recebeu uma ligação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que cobrou uma solução rápida. Em outra ocasião, Lula já havia cobrado dia e hora para a crise acabar, mas os problemas continuaram.

Depois de voltar de uma viagem a Belo Horizonte, Lula reiterou a Saito que o Comando da Aeronáutica deve tomar as medidas que considerar adequadas para restabelecer o fluxo e a segurança do tráfego aéreo.

A insatisfação dos controladores de Brasília já contagia outros estados. Em São Paulo, a tensão se agravou com o anúncio da prisão administrativa do sargento Trifilio. Seus colegas ameaçam uma nova greve, a exemplo do movimento desencadeado em março pelos sargentos do Cindacta 1.

- Quando dizemos que o sistema está caótico, não estamos inventando. Agora, (um novo protesto) é possível. No limite, uma nova paralisação - afirmou um controlador. - O grupo está bastante insatisfeito.

Governo desmente saída de brigadeiro

Moisés disse que vai procurar defesa na Justiça, apesar de achar que tem poucas chances. Ele crê que também está ameaçado de prisão o presidente da Associação Brasileira dos Controladores de Tráfego Aéreo (ABCTA), Wellington Rodrigues, igualmente por entrevistas não autorizadas.

Trifilio e seu advogado, Tadeu Correa, vão apresentar, entre hoje e segunda-feira, um mandado de segurança à Justiça Militar de São Paulo para tentar evitar sua prisão, por 20 dias, a contar de 2 de julho. Trifilio ficará preso na Base Aérea do Aeroporto de Cumbica, em São Paulo. Correa pretende apresentar também um pedido de habeas corpus preventivo à Justiça Federal comum:

- A Constituição não prevê habeas corpus para punição administrativa militar. Porém, essa mesma Constituição diz que qualquer pessoa tem direito à defesa. Meu cliente não teve o direito à ampla defesa.

Trifilio foi informado da punição na quarta-feira à noite, por infringir o artigo 10 do regulamento da corporação, que proíbe dar entrevistas sem autorização e criticar as autoridades. O sargento falou a duas revistas sobre a rotina dos controladores. Seu advogado diz que Trifilio poderia falar sem consentimento prévio, já que preside uma associação que representa a categoria. Além dos 20 dias de prisão, ele terá de cumprir quatro dias de detenção administrativa, a partir de segunda-feira, por ter usado um telefone exclusivo de serviço.

No Planalto, a avaliação é que já passou da hora de a Aeronáutica resolver as dificuldades, mas reconhece-se que a situação é difícil. O desafio seria coibir as rebeliões e seus líderes sem perder o controle sobre o grupo. O Planalto ainda desmentiu rumores sobre a demissão do presidente da Infraero, José Carlos Pereira. Sobre os rumores, o brigadeiro disse à BandNews que não tem apego ao cargo.

A posição oficial do Comando é que não interessa à Força entregar o controle aéreo a civis, pois, além dos recursos do Fundo Aeronáutico, perderia poder. Mas, entre os oficiais dos centros de controle, há uma corrente a favor da desmilitarização imediata. Para fontes da Defesa, a desmilitarização será inevitável, pois a atividade-fim da FAB já está prejudicada.