Título: O labirinto jurídico dos recursos
Autor: Otavio, Chico
Fonte: O Globo, 24/06/2007, O País, p. 3

No Brasil é possível prolongar um processo judicial por mais de 40 anos.

Oexcesso de recursos, garantido pelo princípio do duplo grau de jurisdição (direito da parte vencida na ação de ter a sentença reexaminada), é apontado como uma das causas centrais da impunidade no Brasil. Com recursos, é possível prorrogar um processo por mais de 40 anos no país - onde a pena máxima é de 30 anos - e garantir a impunidade. Para um drama em que todos culpam a legislação, o jurista Sérgio Bermudes, professor de direito da PUC-Rio, prefere outra explicação:

- É assim por causa da natureza humana. Ninguém se conforma com uma decisão contrária. Não se muda tão fácil esta natureza.

Embargo declaratório, agravo de instrumento, embargo infringente, recurso extraordinário são alguns dos muitos recursos oferecidos às partes, nos códigos processuais, para tentar mudar uma decisão. Na prática, as medidas eternizam o processo. Mas nem todos conseguem. Recorrer a eles é quase um privilégio, porque tais recursos exigem um vasto conhecimento jurídico dos advogados e capacidade financeira da clientela.

Encontrar uma saída para o problema é um desafio tão longo quanto o prazo de tramitação dos processos. Até os juízes reconhecem o drama. Para 86% deles, consultados no ano passado em pesquisa da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), o excesso de recursos é o aspecto mais importante para a existência da impunidade no país. A demora no encerramento do processo foi apontada por quase 84% dos juízes, enquanto 74% citam ainda a deficiência do inquérito policial.

Mas, na prática, pouco se faz para mudar o cenário. O direito das partes a uma segunda decisão não é exclusividade do Brasil. É um conceito jurídico internacional porque o juiz, quando toma uma decisão, pode cometer erros. Na história do Judiciário brasileiro, que completou 200 anos, não faltam erros. O problema é aplicar o conceito à realidade. A Justiça brasileira conta com apenas 1/3 dos juízes necessários. E os instrumentos de controle da produtividade, na maioria dos casos, são repelidos pela própria categoria.

Em São Paulo, por exemplo, um recurso demora até quatro anos para ser distribuído a um relator.

- A Justiça é um serviço público como qualquer outro. Tem as mesmas deficiências de um hospital ou de uma escola pública - diz Bermudes.

Ao lado, as inúmeras possibilidades de recursos