Título: Para juízes infratores, punição é quase um 'prêmio': a aposentadoria
Autor: Brígido, Carolina
Fonte: O Globo, 24/06/2007, O País, p. 8

Nos tribunais, não há investigação judicial, só pelas corregedorias

BRASÍLIA. A punição máxima para um juiz condenado em processo disciplinar está mais para prêmio do que para castigo. Como a investigação feita pelas corregedorias dos tribunais é administrativa, e não judicial, a maior pena aplicável é a aposentadoria proporcional do infrator. Ou seja: se um magistrado em fim de carreira for pego pedindo propina em troca de uma liminar, por exemplo, ele será agraciado com a chance de não trabalhar mais e continuar recebendo o salário integral, pago pelos cofres públicos.

Foi o que aconteceu com o ex-ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Vicente Leal. Apontado como integrante de um esquema de venda de sentenças judiciais a traficantes de drogas, Leal foi afastado de suas atividades em abril de 2003, quando o tribunal decidiu, por 30 votos a zero, abrir uma investigação interna para apurar o caso. Em março de 2004, a apuração disciplinar ainda não havia sido concluída, mas os rumores de que o ministro seria punido cresciam diariamente. Leal se antecipou e pediu ele mesmo sua aposentadoria.

Magistrado que vendeu sentenças recebe R$15 mil

Como já havia completado 30 anos de serviço público, ele foi aposentado com o salário integral de ministro do STJ, no valor de R$23.275. Paralelamente, tramitava contra o ministro uma investigação judicial no Supremo Tribunal Federal (STF). Nesse processo, se fosse condenado, ele poderia ser afastado definitivamente da magistratura, sem direito à aposentadoria. Como o caso estava em segredo de Justiça, o resultado das investigações não foi divulgado.

Também foram apontados como integrantes do mesmo esquema de venda de sentenças outros dois juízes federais, Eustáquio da Silveira e a mulher dele, a juíza Vera Carla da Cruz Silveira. Em novembro de 2003, o Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região, em Brasília, decidiu por unanimidade aposentar o casal compulsoriamente. Ambos já haviam sido afastados preventivamente de suas atividades em fevereiro de 2003.

A punição aplicada a Eustáquio e Vera Carla garante que eles continuem recebendo seus vencimentos proporcionalmente ao tempo de serviço. No caso de Eustáquio, que já tinha completado 30 anos de serviço público, a aposentadoria corresponde ao salário integral - cerca de R$15 mil. Já Vera Carla, que era juíza havia dez anos, obteve o direito de receber 56,7% do salário de R$12 mil - ou seja, em torno de R$6.840.

Atualmente, o ministro Paulo Medina, do STJ, corre o risco de ser aposentado compulsoriamente. Ele e outros três magistrados estão sendo investigado em procedimento administrativo por suposto envolvimento com o esquema de venda de sentenças à máfia dos caça-níqueis desvendado pela Operação Hurricane (furacão, em inglês), da Polícia Federal. Os magistrados podem se tornar os primeiros punidos pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Com isso, conquistarão o direito ao salário integral com dispensa vitalícia do trabalho.

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