Título: Uma grife à prova do tempo
Autor: Juppa, Fábio
Fonte: O Globo, 24/06/2007, Esportes, p. 45

Após cinqüenta anos, a marca Pelé se mantém forte como o mito.

`Muito prazer, eu sou Jimmy Carter, você não precisa se apresentar. Pelé todo mundo conhece¿, brincou o ex-presidente americano num encontro com o Rei do Futebol. De fato, desde que apareceu como garoto-prodígio aos 16 anos, defendendo um combinado Vasco-Santos, no Torneio Morumbi, em 1957, Pelé passou a ser figura de domínio público. Entre 19 e 29 de junho daquele ano, nascia o personagem, paralelamente à construção do mito e ao lançamento de uma marca que, ao completar 50 anos, pode até não exibir o viés inovador consagrado nos gramados, mas mantém a força e a potência para explorar novos mercados.

¿ Os problemas de ordem familiar, com os filhos, até o fizeram ficar menos exposto, mas nestes anos todos ele soube gerenciar muito bem sua imagem ¿ explica César Ortiz, diretor de planejamento da agência Young & Rubicam, que no ano passado fez uma pesquisa em que Pelé apareceu como uma das celebridades mais valiosas do país: ¿ Ele transmite confiança, prestígio e tem um traço incomum para o mundo em que vive: pés no chão.

Selo de qualidade no início da carreira

Dono de uma memória prodigiosa, José Macia, o Pepe, companheiro de Pelé por 14 anos na temida ala esquerda do Santos, lembra-se com detalhes dos jogos contra Belenenses, Dínamo de Zagreb, Flamengo e São Paulo em que o menino franzino de Três Corações, ainda desconhecido, pintou e bordou, ganhando as páginas dos principais jornais do país com elogios entusiásticos. Dali por diante, transformaria-se em chamariz de público e dinheiro para o clube mundo afora. Homem-espetáculo, antes de se tornar marca, Pelé foi selo de qualidade. Com ele em campo, o preço a ser pago para ver o Santos era sempre mais caro.

¿ Depois do primeiro título mundial do Pelé, em 1958, o Santos excursionava e, se ganhava US$60 mil, US$10 mil eram para ele. A nós cabia o bicho ¿ diverte-se Pepe, que, como padrinho do casamento do Rei com sua primeira mulher Rose, ajudava-o a contabilizar seus ganhos. ¿ Ele me chamava no quarto para contar dinheiro.

À medida que a carreira de Pelé deslanchou, ele consolidou sua marca emprestando a imagem a produtos de todos os segmentos: nas décadas de 60 e 70, vendeu açúcar, bicicleta, material esportivo, brinquedo, aparelhos de TV, pilhas e até drops, este último por conta de um contrato de seis anos que lhe rendia 500 cruzeiros mensais, valor irrisório se comparado, por exemplo, aos 20 mil que recebia pelo comercial da Ray-O-Vac. Nessa época, até relações públicas de banco foi.

Unicidade, um dos atributos valorosos

Nas duas décadas seguintes, Pelé lucrou ainda mais com campanhas publicitárias e licenciamentos esporádicos. Por quase vinte anos, foi garoto-propaganda de uma empresa de cartões de crédito. Paralelamente, entre outras coisas, vendia produtos alimentícios, eletrodomésticos e remédios que prometiam saúde, como Vitassay e mais recentemente o Viagra, do qual foi a estrela do lançamento no país. A denúncia de que uma de suas empresas em sociedade com Hélio Vianna, a Pelé Sports & Marketing, teria ficado com US$700 mil movimentados em torno de um evento beneficente que nunca ocorreu, a favor da parte argentina do Unicef, em 2001, causou arranhões em sua imagem, mas sem comprometer seu potencial mercadológico.

¿ Até hoje ele continua emprestando valor a diversos produtos, o que prova ser uma marca saudável ¿ explica Ortiz. ¿ Um de seus principais atributos é a unicidade, não existem vários como ele.

Há dois anos, os empresários José Alves Araújo, um antigo amigo do Rei, e Marco Parizotto adquiriram os direitos da marca Pelé por 20 anos, prorrogáveis por mais 20. Em troca, o ex-jogador tem um percentual sobre o faturamento da empresa, a Prime. A idéia é transformar, num prazo de dez anos, a marca numa das grifes mais poderosas do mundo explorando diversos grupos consumidores. Entre os principais projetos, está o investimento pesado no bilionário mercado de produtos infantis dos Estados Unidos, assim como nos ramos de material esportivo e calçados. Três negócios que levam o nome do Rei estão fora do universo da Prime: o Café Pelé, cujos direitos são da Cacique; as academias Pelé Club, que pertence a um pool de investidores e o site de notícias Pelé.Net, da Uol. O império construído pelo Rei, no entanto, continua tendo valor incalculável.

¿ Não há como traduzir em números o valor da marca ¿ afirma Alejandro Pinedo, diretor no Brasil da consultoria Interbrand.