Título: Brown inicia nova era trabalhista
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Fonte: O Globo, 25/06/2007, O Mundo, p. 19

Blair entrega a sucessor liderança do partido após 13 anos.

MANCHESTER, Inglaterra

Após 13 anos sob a liderança do atual primeiro-ministro Tony Blair, o poderoso Partido Trabalhista britânico passou ontem para o comando do ministro das Finanças, Gordon Brown. A formalidade abre caminho para que Brown, que há anos é rival de Blair na liderança trabalhista, assuma o cargo de premier na quarta-feira, quando o primeiro-ministro vai deixar o cargo, conforme já anunciado, uma década depois de sua primeira eleição. Candidato único ao posto de líder dos trabalhistas, Brown foi escolhido na conferência do partido, realizada na cidade de Manchester. A grande surpresa, no entanto, ficou por conta da escolha da secretária de Estado para a Justiça, Harriet Harman, como a número dois do partido, em meio a pelo menos outros três nomes apontados como mais fortes.

Brown não fez comentários sobre seu futuro Gabinete, que só será anunciado na quarta, mas deu sinais de como pretende governar, sem perder a oportunidade de alfinetar seu antecessor:

¿ Serei o primeiro-ministro da mudança. Esta semana marca um novo ponto de partida, uma possibilidade para a renovação. O partido que lidero precisa ter mais que um conjunto de políticas, precisa ter uma alma. É com humildade, orgulho e um grande senso de dever que aceito o privilégio e a grande responsabilidade de mudar nosso país ¿ disse.

Tony Blair, indiferente às provocações, procurou fazer elogios a seu sucessor.

¿ Brown tem todas as qualidades para ficar marcado como um grande primeiro-ministro ¿ disse, logo após a transferência da liderança do partido.

O clima entre os dois, no entanto, estava mais tenso que de costume, por causa de uma reportagem publicada ontem pelo jornal ¿Independent¿, que teve acesso a documentos oficiais que confirmam que Blair pretendia demitir Brown do Ministério das Finanças logo após as eleições de 2005. O objetivo do premier, segundo o jornal, era transferí-lo para um outro posto com menos poder e enfraquecê-lo perante o partido ¿ numa tentativa de desfazer a crença de que Brown era seu sucessor natural. Segundo o jornal, Blair voltou atrás por conta da popularidade de Brown como líder da saudável economia do Reino Unido, num tempo em que o governo sofria duras críticas por conta da invasão do Iraque.

A rivalidade entre Blair e Brown começou com a disputa da presidência do Partido Trabalhista em 1994, quando os dois teriam, segundo a imprensa britânica, chegado a um acordo de que Brown sucederia Blair após cinco anos, o que não ocorreu.

Apesar de não ter feito comentários sobre a reportagem do ¿Independent¿, Brown fez questão de tocar num dos pontos fracos de Blair durante posse ontem: a guerra no Iraque. O provável futuro premier anunciou que permitirá que manifestações contra a guerra sejam feitas ¿em qualquer lugar de Londres, inclusive na porta do Parlamento¿, o que estava proibido pelas autoridades sob o comando de Blair por questões de segurança.

¿ Nossa política exterior a partir de agora refletirá a verdade. Sabemos que para derrotar o terrorismo é preciso mais do que a força militar ¿ disse Brown, apesar de ter descartado uma retirada rápida das tropas britânicas do Iraque. ¿ Vamos cumprir todas as nossas obrigações internacionais.

O sucessor de Blair também já havia anunciado que pretende melhorar a educação e as condições habitacionais do Reino Unido. Segundo o ¿Independent¿, o futuro Gabinete do premier deve ter um perfil bem diferente do atual, com mais cargos entregues a mulheres. Uma tendência que pode ficar ainda mais forte se a nova vice-líder do partido, Harriet Harman, for confirmada como vice-premier. No Parlamentarismo britânico, nem sempre o vice-líder do partido que tem a maioria dos parlamentares se torna vice-primeiro-ministro, mas a combinação costuma ocorrer.

Os trabalhistas ganharam, em 2005, a maioria de cadeiras no Parlamento britânico até 2010. Como premier, Brown tem até lá, portanto, para convocar novas eleições gerais.