Título: Por onde vai o PT
Autor: Cruvinel, Tereza
Fonte: O Globo, 26/06/2007, O Globo, p. 2

Uma nova rodada da pesquisa CNT-Sensus deve ser divulgada hoje, indicando que o presidente Lula continua deitado na popularidade, apesar da crise aérea e dos escândalos tangentes. O PSDB trancou na gaveta uma pesquisa que, entre outros resultados buscados, confirma a situação confortável de Lula. Essas são indicações tentadoras para o PT, que fará em agosto seu congresso: pode atolar de novo, se acreditar que a reeleição de Lula e sua popularidade representam uma anistia aos erros de 2005.

O que essa situação favorável propicia ao PT é a oportunidade de se redimir, externa e internamente, desperdiçada em muitos aspectos. Há duas semanas, quase 30 deputados petistas se insurgiram contra a orientação partidária, favorável ao voto em lista fechada. Juntaram-se ao PSDB e bloquearam a primeira tentativa de aprovação da reforma política. Mas, como hoje em dia tudo na política deixa de ser assunto no dia seguinte, porque outro fato mais grave sempre se alevanta, pouco se falou do ocorrido. A indisciplina acintosa de um terço da bancada passou quase em brancas nuvens. Apesar do obsequioso silêncio interno, nem todo mundo achou normal e admite que vire moda. É o caso do governador Marcelo Déda.

- A meu ver, ali o PT cruzou novamente uma fronteira importante. Deu outro mau passo para deixar de ser partido e tornar-se uma legenda. Apenas mais uma legenda. A questão era doutrinária, e a indisciplina foi ampla. No meu tempo na Câmara, havia espasmos por uma simples manifestação de voto, a explicitação de divergência com a orientação oficial, embora votando com ela - diz o governador de Sergipe.

Os preparativos para o congresso prosseguem, não produzem alarido nem despertam entusiasmo. Convocado no auge do sufoco da crise 2005, quando se falava em encolhimento e até em extinção do partido, o congresso perdeu muito de sua razão de ser. Apesar de tudo o que houve, o partido foi o mais votado para a Câmara e Lula foi reeleito por uma maioria formidável.

Essas vitórias é que são perigosas e tentadoras. Se tomá-las como sinal de que o eleitorado concedeu-lhe anistia e indulgência plena pelos pecados de 2005, não terá entendido nada, não deixará para trás a ferida ética e a crise de identidade. Lula foi reeleito por outras razões, numa pactuação direta com o eleitorado, que sabiamente o levou ao segundo turno para confrontar dois projetos e escolher um. Que elegeu governadores como Jaques Wagner (BA), Déda (SE), Wellington Dias (PI), Binho Marques (AC) e Ana Júlia (PA), expressões do PT de origem, e não do PT paulista. As tensões estão contidas, mas devem ganhar fervura com a aproximação de agosto.