Título: Juiz acusa ministro do STJ de adulterar sentença
Autor: Galhardo, Ricardo
Fonte: O Globo, 26/06/2007, O País, p. 5

Em liminar, Medina teria ignorado trechos que manteriam preso condenado por narcotráfico, que agora está foragido

SÃO PAULO. Em ofício enviado ao presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Nilson Naves, em 29 de maio, o juiz da 3ª Vara Federal de Campo Grande, Odilon de Oliveira, acusa o também ministro do STJ Paulo Medina - afastado desde a Operação Furacão - de suprimir trechos de uma sentença para justificar a concessão de um habeas corpus. O beneficiado foi Fahd Jamil, condenado a 20 anos de cadeia por narcotráfico em junho de 2005. Solto em janeiro deste ano, ele está foragido até hoje.

Aos 66 anos, Jamil é conhecido nas cidades de Ponta Porã (MS) e Pedro Juan Cabalero (Paraguai) por seu envolvimento com o narcotráfico. Ele foi incluído pelo presidente dos EUA, George W. Bush, na seleta lista de pessoas proibidas de negociar com empresas e cidadãos americanos.

Ao conceder o habeas corpus, Medina alegou que Jamil tem bons antecedentes e atribuiu essa afirmação à sentença do juiz Odilon de Oliveira.

"Não obstante ser o paciente (Jamil) primário e possuir bons antecedentes, circunstâncias essas reconhecidas na sentença, determinou-se, para exercer o direito de recorrer, sua manutenção na prisão sem que se tenha apontado os motivos cautelares para tanto", diz a liminar de Medina.

No ofício ao presidente do STJ, Odilon contesta a informação. Segundo o juiz, Medina suprimiu partes da sentença, e a alegação de bons antecedentes não corresponde à verdade.

"A decisão de sua excelência (Medina) suprimiu os antecedentes do paciente (Jamil) e ainda registrou haver este juiz reconhecido, na sentença, possuir ele bons antecedentes. A decisão (...) contém declaração que não corresponde à realidade", diz o juiz.

Na página 178 da sentença em que condenou Jamil a 20 anos por tráfico, Oliveira enumera em 21 linhas uma série de inquéritos contra o acusado por evasão de divisas, contrabando, falsificação e apropriação indébita.

Jamil foi condenado de novo em dezembro de 2006

Em dezembro de 2006, um mês e meio antes da liminar de Medina, o juiz Oliveira voltou a condenar Jamil a 12 anos e meio de cadeia pela remessa ilegal de R$29 milhões ao exterior.

Medina está afastado do STJ, por suposto envolvimento no esquema de venda de sentenças a bicheiros.

O advogado do ministro, Antônio Carlos de Almeida Castro, se recusou a comentar o ofício do juiz Oliveira.

- Recuso-me a entrar em decisões sobre o mérito de decisões anteriores. No Brasil, não existe o crime de hermenêutica (interpretação das leis). Cada juiz tem direito a decidir com base em sua consciência - disse o advogado.

O advogado de Jamil, Antonio Cláudio Mariz de Oliveira, foi procurado mas não comentou o caso. O juiz Odilon de Oliveira não quis comentar o ofício enviado ao presidente do STJ.