Título: Sinal verde para energia nuclear
Autor: Tavares, Mônica e Alvarez, Regina
Fonte: O Globo, 26/06/2007, Economia, p. 17
Depois de 21 anos, Brasil decide construir Angra 3, numa derrota para ambientalistas.
OConselho Nacional de Política Energética (CNPE) aprovou ontem a retomada da construção da usina nuclear Angra 3, suspensa há 21 anos, que deverá entrar em funcionamento em 2013. Ela terá capacidade semelhante à de Angra 2, com potência de 1.350 megawatts (MW). Foram nove votos a favor: a única posição contrária foi a do Ministério do Meio Ambiente, que defendia uma discussão mais ampla da energia nuclear pela sociedade. Serão necessários investimentos de cerca de R$7,2 bilhões para concluir o empreendimento.
- Hoje, devido a todos os condicionantes, Angra 3 é a alternativa de menor custo e melhores condições, inclusive ambientais. Não tem emissão de gás carbônico, cabe muito num momento em que o mundo inteiro está discutindo a questão da mudança climática - disse o ministro interino de Minas e Energia, Nelson Hubner.
Para retomar a obra, é necessário um decreto regulamentando a comercialização da energia produzida por Angra 3 pela Eletronuclear. O decreto também trará alguns parâmetros para estabelecer a tarifa. Os estudos anteriores, que indicavam tarifa de R$140 por MW/hora, terão de ser atualizados. Hubner não quis fazer projeções:
- Se, por um lado, aumentaram os custos dos equipamentos no mercado externo, por outro, as condições da economia do país melhoraram muito - afirmou, apostando em tarifas favoráveis.
Hubner não deixou claro se haverá nova licitação para as obras civis da usina. Ele admitiu que os contratos existentes poderão ser aproveitados se forem considerados vantajosos.
Marina não chegou a tempo da reunião
Segundo Hubner, o licenciamento de Angra 3 já está bastante adiantado. O local já tem licença, disse, porque é o mesmo onde funcionam as outras duas usinas. Também já houve um trabalho de recuperação ambiental da área. Foram realizadas na semana passada, pelo Ibama, três audiências públicas sobre a construção da usina: em Angra dos Reis, no dia 19; em Paraty, dia 20; e em Rio Claro, dia 21.
- A aprovação de Angra 3 considerou as necessidades de energia do país e o custo dessa fonte térmica. O país já gasta muito dinheiro só na conservação dos equipamentos imobilizados - disse o ministro.
Com relação ao urânio, matéria-prima da energia nuclear, Hubner disse que o país tem reservas suficientes para 500 anos de funcionamento das três usinas, e domina todo o ciclo de processamento, não havendo necessidade de importação do produto ou da tecnologia. Hoje, segundo ele, isso não é feito no país porque não é economicamente vantajoso.
O CNPE discutiu também a questão dos rejeitos das usinas. Segundo Hubner, a proposta é colocá-los em depósitos intermediários. Atualmente, o lixo de Angra 1 e Angra 2 é depositado em uma espécie de piscina na área das próprias usinas.
A Associação Brasileira das Indústrias de Base (Abdib) considerou positiva a retomada de Angra 3. A entidade estima que a obra significará mais de R$3 bilhões em encomendas de bens e serviços. O presidente da Abdib, Paulo Godoy, afirmou em nota que "a retomada das obras é fundamental para garantir mais segurança energética à matriz brasileira".
A votação do CNPE marcou mais uma vez a posição contrária da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva. A ministra, que se encontrava no Rio, em um evento da Câmara Americana de Comércio, não teve tempo de participar da reunião do conselho. Mas mandou como representante seu secretário-executivo, João Paulo Capobianco. Marina afirmou à Agência Brasil que o alto investimento não deve ser destinado a uma fonte energética se não se sabe o que fazer com os resíduos que esta produz. Para ela, é melhor investir em fontes que não tragam o "risco da energia nuclear".
O ecologista e secretário-executivo do Instituto Sócio-ambiental da Baía da Ilha Grande (Isabi), Ivan Marcelo Neves, é contra Angra 3. Ele afirmou que o Brasil tem fontes alternativas de energia em abundância, como hidrelétrica, solar e eólica. Segundo Neves, se os R$7,2 bilhões previstos para construir a usina fossem aplicados em programas de eficiência energética, seria possível, em pouco tempo, ampliar a oferta de energia em cerca de 50 mil MW, praticamente a metade da atual capacidade instalada no país. O ecologista destacou que somente as perdas técnicas de energia no sistema brasileiro chegam a 20%, enquanto a média mundial é de 6%. Segundo ele, isso mostra que o sistema tem equipamentos obsoletos.
Já o professor titular do Programa de Energia Nuclear da Coppe/UFRJ Aquilino Senra afirmou que construir Angra 3 não é apenas fundamental para atender ao mercado de energia para 2012, como para não desperdiçar o que foi investido até agora. Senra lembra que, somente para desenvolver o enriquecimento do urânio, foi gasto cerca de US$1 bilhão, e que as reservas brasileiras de urânio estão entre as seis maiores do mundo.
Em comparação a outros países, o Brasil tem um setor nuclear modesto. Segundo a Agência Internacional de Energia Atômica, a França tem 59 usinas nucleares, que geraram 78,1% da energia doméstica. Os EUA têm 103 reatores em uso, responsáveis por 19,4% da energia do país. Na China, que tem 11 reatores e está construindo mais quatro, essa proporção é de 1,9%. Na Argentina, é de 6,9%.
COLABOROU Henrique Gomes Batista, com agências internacionais