Título: Maluf, eleito, agora quer punir promotores
Autor: Farah, Tatiana
Fonte: O Globo, 27/06/2007, O País, p. 9

Ex-prefeito responde a mais de 30 processos, e só foi punido em um deles; mas está com os bens bloqueados.

SÃO PAULO. Com prisão decretada nos Estados Unidos por crime financeiro, respondendo a processos de evasão de divisas, formação de quadrilha, lavagem de dinheiro, corrupção passiva e improbidade administrativa, e com os bens bloqueados, o deputado Paulo Maluf (PP-SP) é um homem que diz acreditar na Justiça brasileira. Ex-prefeito e ex-governador de São Paulo, Maluf, de 75 anos, é acusado de diversos desvios de verbas de obras públicas. A mais grave é a da Avenida Água Espraiada, que, ano passado, resultou em 41 dias de prisão pela Polícia Federal, em São Paulo, ao lado do filho Flavio. Foi libertado por habeas corpus concedido pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Maluf responde a ações propostas desde 2004 e que somam US$344 milhões.

- Se ninguém foi punido é porque não tinha base jurídica. Todos os ministros do STF, todos, são de ilibada reputação e notável saber jurídico. Todos. Inclusive um ministro do STF declarou que quem mais comete improbidade administrativa, muitas vezes, são os promotores públicos - disse o deputado, completando: - O Brasil tem uma Justiça justa e séria.

Promotor público tenta levar Maluf à cadeia há seis anos

Enquanto o deputado comemora o que considera uma "Justiça muito boa", o promotor público Silvio Marques, do Ministério Público Estadual, completa este mês seis anos de uma novela sem fim para tentar levar para a cadeia o ex-prefeito. Marques é uma das principais pedras no sapato de Maluf. O promotor vem levantando provas no país e no exterior de supostas operações financeiras irregulares da família Maluf e de empresários e doleiros que seriam ligados a ela, num emaranhado de bancos e empresas off-shore que envolvem a remessa ilegal de dinheiro para paraísos fiscais, como Luxemburgo e Ilhas Jersey, e ainda para Estados Unidos, Inglaterra, Suíça e França.

Marques diz acreditar que Maluf não pode ser considerado o ícone de impunidade brasileira, mas admite: apesar dos mais de 30 processos contra o atual deputado federal, houve apenas uma punição, além da prisão por poucos dias: a que obriga o ex-prefeito a devolver pouco mais de R$60 mil aos cofres públicos, por propaganda indevida, quando era prefeito de São Paulo:

- A maior punição ao ex-prefeito até agora é o bloqueio de bens. Todos os bens da família, declarados por Maluf, em torno de R$36 milhões, estão bloqueados pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça). E, no exterior, o patrimônio paralelo dele, que é de US$100 milhões, está bloqueado também.

Marques, no entanto, lamentou a posição do STF que libertou Malu:

- A Justiça não pune com rigor os criminosos de colarinho branco. Mesmo com todo o trabalho que temos, que a Polícia Federal tem, mesmo com a apuração dos documentos no estrangeiro. No caso do habeas corpus de Maluf, mudou-se a jurisprudência, infelizmente.

Se no Brasil Maluf tem foro privilegiado, por ter voltado ao cargo de deputado federal desde janeiro deste ano, no exterior sua situação é bem embaraçosa. O parlamentar teve prisão decretada pela Justiça americana em março e pode ser extraditado caso desembarque em países com acordo de extradição com os EUA.

"Ele é um fugitivo da Justiça de Nova York"

O motivo da prisão é o processo em que Maluf é acusado de crime financeiro e corrupção no caso das obras da Avenida Água Espraiada, cujo dinheiro obtido com propinas teria sido enviado por ele aos EUA. O ex-prefeito nega que tenha contas no exterior.

Para Marques, Maluf não está totalmente impune:

- Já existem provas da prática dos crimes. Ele já ficou preso 41 dias. Na área civil, os bens dele estão bloqueados. Em quatro países, ele e a família têm bens bloqueados. E ele está com prisão decretada lá. Se colocar o pé fora do país, vai ser preso. Ele é um fugitivo da Justiça de Nova York.

O promotor é um dos que se revoltaram com o projeto de lei 265/2007, que altera a lei de improbidade administrativa. Proposto por Maluf, o projeto visa a multar promotores e procuradores que, na visão dos tribunais, tenham entrado com processos de "má-fé" contra administradores públicos. Além da multa, estão previstas pena de prisão e indenização:

- Isso é mais uma medida a favor dos corruptos e dos maus gestores. É típico de quem está devendo para a Justiça.

Segundo Marques, se a intenção da mudança na lei é punir promotores e procuradores que agiriam por suposta má-fé, a alteração é desnecessária:

- O Código de Processo Civil, o Código Penal e a lei de abuso de autoridade já tratam desse tipo de crime. O projeto é redundante e absurdo.