Título: `Falam dos abusos, não dos acertos'
Autor: Passos, José Meirelles
Fonte: O Globo, 01/07/2007, O Mundo, p. 36

Diretor de agência de segurança defende técnicas como grampos contra o terror.

NOVA YORK. O almirante John Mike McConnell, nomeado em fevereiro diretor-geral da Agência de Segurança Nacional (NSA, em inglês) dos EUA, esteve no meio de um fogo cruzado esta semana: uma comissão do Senado decidiu questionar a Casa Branca por causa dos meios usados pela NSA para investigar cidadãos suspeitos de terrorismo dentro dos EUA, entre eles o grampo telefônico, sem permissão judicial. A agência dirigida por McConnell orgulha-se de patrocinar o projeto Argus (homenagem ao gigante da mitologia grega que tinha cem olhos) de vigilância da mídia internacional, que monitora um milhão de reportagens por dia, em 195 países e 21 línguas. Agora, o plano do novo diretor é investir pesadamente em tecnologia para formar uma plataforma de dados biométricos capaz de identificar suspeitos de terrorismo no mundo inteiro. Em entrevista ao GLOBO, McConnell defende o grampo como instrumento de defesa nacional, diz que estrangeiros nos EUA serão os principais alvos desta vigilância e alerta que há grupos planejando ataques em massa contra os EUA.

Marília Martins

A inteligência americana tem sido muito criticada por seus abusos...

JOHN MIKE MCCONNELL: Todos falam dos abusos e ninguém fala dos acertos. Os abusos rendem manchete e os acertos ficam no silêncio. E os acertos dos serviços americanos de inteligência superam amplamente os eventuais abusos. Já salvamos muitas vidas.

Por que o senhor defende o grampo e pede mais verbas para tecnologia?

MCCONNELL: O projeto de modernizar tecnologicamente a agência visa a nos proteger de ameaças concretas. Temos fortes evidências de que há grupos que planejam atacar os EUA e o Irã apóia muitos deles. Nós já desbaratamos dez planos de ataques terroristas aos EUA desde o 11 de setembro de 2001. É claro que vamos proteger a privacidade de cidadãos americanos. Para isto, precisamos adaptar a lei: se a investigação envolver um americano, pedimos autorização à Justiça, mas não faremos isto se envolver estrangeiros. Queremos vigiar estrangeiros suspeitos, onde quer que eles estejam. Escuta telefônica e fiscalização da internet são essenciais. Além disto, precisamos de uma lei que proteja as companhias telefônicas e os provedores que nos ajudarem. Esta cooperação não pode estar sujeita a processos judiciais.

Mas neste momento o terrorismo doméstico está crescendo nos EUA...

MCCONNELL: Este é um grande desafio. A inteligência americana sempre se concentrou em alvos fora do território nacional. Por isto, fracassamos em prever o 11 de setembro. Hoje, há terroristas dentro dos EUA. Eles eram invisíveis para a agência nacional de inteligência. Agora, eles vão estar sob vigilância constante. O Reino Unido tem vasta experiência em vigiar internamente os suspeitos de pertencer ao IRA. Eles tiveram que partir para a vigilância doméstica. Se alguém dentro dos EUA tem contato com um grupo terrorista num país estrangeiro, a inteligência americana deve ser capaz de ir até este país e investigar esta ligação. Muitos terroristas dentro dos EUA foram recrutados em países estrangeiros ou em contato com estrangeiros. Temos que investigar estas organizações terroristas onde quer que estejam. Muitos americanos estão vivos hoje porque estamos vigilantes, prevenindo ataques.

E um terrorista americano que não tenha ligações no exterior, como é o caso de Timothy McVeigh, que atacou Oklahoma City?

MCCONNELL: Bem, neste caso, trata-se de uma situação criminal, ele deve ser tratado como criminoso comum, dentro das leis penais americanas. É assim que o sistema legal americano funciona.

Oficiais da inteligência americana disseram recentemente ter provas de que o Irã fornece armas para rebeldes iraquianos e para insurgentes do Talibã. É verdade ou é uma afirmação para alimentar o debate político?

MCCONNELL: Eu não tenho agenda política. Minha missão é dizer a verdade: há fortes evidências de que o Irã municia terroristas no Iraque. Eles agora usam projéteis explosivos manuais de fabricação iraniana. Isto é um fato, não é uma suspeita. No Afeganistão, ficamos em dúvida, apesar de encontrar armamento de origem iraniana, porque o governo do Irã é xiita e os militantes do Talibã são sunitas, ou seja, eles são inimigos entre si. Então perguntamos: por que os xiitas iranianos iriam querer armar os sunitas do Talibã? A resposta é a seguinte: para fazer com que a presença americana no Afeganistão custe cada vez mais caro em termos de vidas humanas. Assim, aumenta a pressão para que as tropas voltem para casa. O que eles fazem é um jogo político, alimentando o conflito.