Título: E os outros?
Autor: Cruvinel, Tereza
Fonte: O Globo, 03/07/2007, O Globo, p. 2

Deu-se ontem o que estava previsto: a representação do PSOL contra o senador Renan Calheiros foi devolvido à Mesa pelo presidente do Conselho de Ética, Leomar Quintanilha. Renan não poderia ter remetido o processo ao Conselho antes de ouvir os demais membros da Mesa que preside. Agora é fácil dizer que ele calculou o angu que criaria para embolar seu julgamento. Mas onde estavam os outros senadores que não protestaram, não levantaram uma simples questão de ordem? São todos ignorantes do regimento ou fingiram que não viram?

Qualquer uma das possibilidades acima é desoladora, em se tratando da câmara alta do Congresso. A combinação das duas, então, é de doer. Mas como a Mesa deve saber a quantas anda a imagem da Casa, não deve tomar a atitude mais temerária, que seria o arquivamento do caso, dispensado qualquer averiguação. Nem deve revalidar todos os atos do Conselho de Ética, que carregam não só o vício de origem, a tramitação sem a apreciação dos membros da Mesa.

Renan enviou o processo ao Conselho de Ética no dia 31 de maio. Há mais de um mês, portanto. No dia seguinte, comunicou o fato ao plenário e recebeu elogios de alguns senadores. Valter Pereira (PMDB), Jayme Campos (DEM) e Ideli Salvatti (PT), pelo menos, louvaram a celeridade da decisão. Renan justificou-se: com o envio rápido, evitava qualquer suspeita de protelação e demonstrava sua confiança no julgamento do Conselho, que tudo esclareceria. Naquele dia, o único a manifestar alguma estranheza quanto ao rito foi Pedro Simon, que pela primeira vez falaria sobre a conveniência do afastamento da presidência, enquanto a investigação transcorresse. Registre-se também que o senador Sibá Machado, recém escolhido presidente do Conselho, devolveu à Mesa o processo que lhe fora encaminhado pela Corregedoria. Para obedecer aos trâmites legais, explicou. Mas Renan não ouviu a Mesa e enviou o caso diretamente ao Conselho.

Se tudo calculou, teve êxito: viciou o processo e determinou sua volta à estaca zero. A seu favor pode-se dizer que, se quisesse, naquele momento, teria obtido da Mesa até mesmo a decisão pelo imediato arquivamento. Talvez, naquela hora, confiasse demais na composição do Conselho, numa solução que poupasse a própria Mesa.

Agora, diante dos pareceres da Consultoria Jurídica e da Advocacia Geral da União, os que nada viram e disseram manifestam falsa surpresa. Falsa porque já se sabia do primeiro vício e dos outros. O ministro do TCU Raimundo Carrero, que por 13 anos foi secretário-geral da Mesa do Senado, advertiu informalmente alguns senadores e ex-colegas do Senado, e seus comentários circularam (foram até comentados aqui). Outros senadores alertaram depois para a inconstitucionalidade do pedido de perícia à PF. Com mais vigor, Romeu Tuma.

O Conselho de Ética já conseguiu dilapidar toda sua credibilidade. Ele é uma parte do Senado, não o todo. Mas agora é a vez da Mesa, que é plural e representa a Casa. Sanar vícios e incorreções tem sua utilidade. Como diz o líder Romero Jucá, isso evita até um pedido de nulidade no futuro. Mas se a Mesa for além, resolver imitar o Conselho, comprometerá a própria instituição.