Título: Manobra de Renan vira tiro no pé
Autor: Lima, Maria e Vasconcelos, Adriana
Fonte: O Globo, 04/07/2007, O País, p. 3

SUCESSÃO DE ESCÂNDALOS

Mesa devolve processo ao Conselho, e diversos senadores pedem sua saída.

No comando de manobras e obstruções que há um mês e meio emperram as investigações do Conselho de Ética, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), sofreu um duro revés ontem, ao ver anulada, pela Mesa Diretora, da qual é presidente, a tentativa de arquivar o processo contra ele por quebra de decoro. Menos de 24 horas depois de o presidente do Conselho, Leomar Quintanilha (PMDB-TO), remeter o processo à Mesa, para que fosse arquivado, sete senadores do comando da Casa se reuniram no gabinete da presidência e, por unanimidade, decidiram devolver o caso ao Conselho para que seja concluída a investigação da denúncia de que Renan teve despesas pessoais pagas pelo lobista Cláudio Gontijo, da empreiteira Mendes Júnior.

À tarde, no plenário, Renan presidiu uma sessão constrangedora e inusitada. Mais de uma dezena de senadores - de oposição, da base governista e do seu próprio partido - sugeriram, pediram e cobraram seu afastamento da presidência. O argumento comum era que ele perdera as condições de comandar os trabalhos e que se defenderia melhor longe do cargo. Renan, da cadeira de presidente, reafirmou que é inocente e que não deixará o posto.

"A imagem do Senado ia pelo ralo"

Na reunião da Mesa, presidida pelo vice-presidente Tião Viana (PT-AC), Renan tentou evitar a derrota usando de todos os meios, mas não conseguiu. A Mesa deu ao Conselho plenos poderes para decidir se convalida e aprofunda as perícias feitas pela Polícia Federal nos documentos de defesa apresentados por Renan.

- Tínhamos que salvar a honra do Senado. Não era uma questão de amizade ao Renan, nem de salvar nossos pescoços. Pesou na decisão de todo mundo a certeza de que a imagem do Senado estava indo pelo ralo - disse Gerson Camata (PMDB-ES), segundo-secretário da Mesa.

- Mais grave que a questão do gado de Renan são as manobras e manipulações que estão sendo feitas e que ofendem a essência do Senado. Fomos atingidos no coração da instituição, e temos de defendê-la. Para o bem do Senado e de todos os seus integrantes, o senador Renan tem a obrigação de se afastar da presidência da Casa para que nenhuma de nossas decisões fique sob suspeição - disse o presidente do PSDB, Tasso Jereissati (CE), após reunião da bancada, de manhã, que decidiu defender o afastamento do presidente do Senado.

Também no plenário, Renan ouviu companheiros contestando sua estratégia de defesa no Conselho de Ética.

- Eu não ando mais no Brasil sem ser questionado sobre a situação do Senado. Como está não dá, não dá para nós e nem para Vossa Excelência, muito menos com ameaças ridículas que estão sendo feitas - afirmou Sérgio Guerra (PSDB-PE)

- Seria melhor para o Senado e para a democracia que a Casa tivesse outro presidente neste momento - emendou Cristovam Buarque (PDT-DF)

Integrante do Conselho, Demóstenes Torres (DEM-GO) afirmou:

- Não adianta clamar por sua licença, que já deveria ter sido pedida. Por isso, temos de cumprir nossa obrigação, que é a de promover um julgamento justo. Estamos apodrecendo em praça pública.

A um Renan impassível na presidência da sessão, Pedro Simon (PMDB-RS) aconselhou:

- Seria melhor Vossa Excelência entrar para a História com um ato de grandeza do que como alguém que esmagou o Senado. Assim nem o apoio de Lula resolve.

Agripino Maia (DEM-RN), que disputou a eleição com Renan em fevereiro, disse:

- Perdi a eleição, não guardo mágoa pessoal. Mas gosto mais da instituição do que de Vossa Excelência. A rua lhe condenou.

"Todos chegaram de cabeça feita"

Desde cedo, Renan sabia que o dia não seria fácil. Não participou da reunião da Mesa, mas acompanhou tudo de seu gabinete pessoal. Certo de que teria maioria na Mesa, foi surpreendido pela reviravolta provocada pela certeza de que o desgaste da imagem do Senado chegara ao limite.

- As pessoas já chegaram à reunião de cabeça feita. Não havia a menor condição de aprovar o arquivamento ou mandar o processo para o STF - disse César Borges (DEM-BA), terceiro-secretário da Mesa.

Os consultores do Senado participaram da reunião e explicaram que todos os chamados "vícios" do processo contra Renan podem ser corrigidos pelo plenário do Conselho. Da mesma forma que o Conselho é que decidirá sobre os limites da investigação.

- Na Mesa sanamos o problema da admissibilidade (da representação do PSOL contra Renan) e não interferimos na atribuição do Conselho, que é quem vai decidir se as perícias já feitas serão convalidadas e se serão ampliadas - disse Tião Vianna que, na presidência da reunião, teve postura independente e votou com a maioria.

- Nada volta a estaca zero. Tudo pode ser corrigido no Conselho. O processo continua de onde foi interrompido - concordou César Borges.

O presidente do Conselho, Leomar Quintanilha (PMDB-TO), que estava sumido desde que foi eleito, quinta-feira, foi obrigado a reaparecer com a decisão da Mesa e reunir o colegiado à noite. Sob cobrança de colegas por causa de processo por fraudes e corrupção que responde no Supremo Tribunal Federal, Quintanilha tinha pela frente o desafio de escolher um novo relator e estabelecer um cronograma de trabalho para o caso Renan.