Título: Prefeito anuncia licitação de 13 cemitérios
Autor: Motta, Cláudio
Fonte: O Globo, 05/07/2007, Rio, p. 14

Cesar diz que prazo de concessão à Santa Casa terminou há mais de um ano, mas entidade afirma que vai até 2009

Uma das concessões mais antigas do Rio está prestes a acabar. A prefeitura publicará, ainda este mês, o edital de licitação dos 13 cemitérios e do crematório municipal administrados pela Santa Casa de Misericórdia. Entre os cemitérios, estão o de São Francisco Xavier, no Caju, o de Inhaúma e o São João Batista, em Botafogo. O prefeito Cesar Maia ressaltou que será o fim de uma história de 420 anos.

Mas esse rompimento começou há mais de um ano, quando terminou o prazo de concessão. Cesar Maia então formou um grupo de estudos para este caso e decidiu realizar a concorrência. Para a Santa Casa de Misericórdia foi mais um golpe na crise financeira que está enfrentando. No mês passado, por exemplo, os 22 coveiros fizeram uma paralisação por falta de pagamento.

- Pela complexidade do caso, fizemos consultas à área jurídica do Município e a juristas externos. Concluímos que seria inevitável uma licitação pública. Trata-se de um contrato com prazo expirado e de uma exigência da lei. Seria mais confortável prorrogá-lo, como acontecia com o passar dos anos, mas não teríamos cobertura legal - disse o prefeito.

Para marcar a nova fase, a prefeitura deve colocar no edital uma exigência de medidas de controle ambiental. Também serão modernizados os serviços funerários e cemiteriais, que hoje são terceirizados.

Em Inhaúma, ossos expostos e lixo

Os cemitérios públicos recebem a grande maioria dos sepultamentos da cidade. Em 2006, foram 49.187. No último mês de maio, 4.201. Em 2006, foram realizadas 2.070 cremações (o crematório fica no Caju) e em maio deste ano, 226. O Rio conta ainda com outras sete unidades particulares, funcionando por meio de permissão pública.

Repórteres do GLOBO percorreram, ontem de tarde, os cemitérios de Inhaúma e de São Francisco Xavier. Em ambos os locais, há sepulturas abertas, quebradas e com partes de metal furtadas. No Caju, o mato alto cobre muitas sepulturas. Lixo, flores secas, pedaços de caixões no caminho, mau cheiro e uma colméia numa das gavetas denunciam a falta de conservação. Cachorros passeiam e dormem sobre túmulos.

Em Inhaúma, moradores de comunidades próximas andam pelos muros, soltam pipas e brincam pelo cemitério. Ossadas podem ser vistas não só dentro de tumbas quebradas, mas também entre um jazigo e outro. Não há ar-condicionado em nenhum dos cemitérios.

A Santa Casa de Misericórdia informa não ter conhecimento do vencimento das concessões dos cemitérios da cidade e afirma que elas valem até 2009. Quanto à falta de conservação, a Santa Casa alega ser fruto da falta de segurança, que leva ao fechamento das capelas à noite. Ainda de acordo com a entidade, sepulturas saqueadas - fazendo com que haja tumbas quebradas e ossadas expostas - são conseqüência da insegurança.

A Diretoria de Cemitério da prefeitura fiscaliza os 20 cemitérios. Em 2006, foram expedidas 853 intimações para cemitérios e capelas, para a realização de serviços de limpeza, manutenção e conservação, entre outros itens. Este ano, já foram expedidas 252 intimações.

ENTIDADE CRIADA EM 1582

Fundada em 1582 pelo padre José de Anchieta (jesuíta espanhol que chegou ao Brasil em 1553), a Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro é uma instituição filantrópica que, além dos 13 cemitérios, dois educandários e um asilo, administra cinco hospitais com 1.256 leitos, 75 enfermarias, 69 quartos particulares, 69 ambulatórios e 27 salas de cirurgia. Em 2005, foram realizadas mais de 400 mil internações. O número de altas chegou a 16 mil.

A Santa Casa também desenvolve um trabalho educacional, administrando duas instituições que abrigam um total de 500 crianças. Segundo o historiador Milton Teixeira, o imperador dom Pedro II deu a concessão dos cemitérios à Santa Casa, por medida de controle sanitário. A instituição foi escolhida para conter epidemias de cólera e peste bubônica. A autorização foi renovada ao longo dos anos.

Em março de 1582, pouco depois da fundação, a instituição ficou famosa por ter atendido a tripulação da esquadra de Castela, que havia contraído peste.

Crise atinge hospitais

Maternidade restringiu atendimentos

A crise que afeta a Santa Casa de Misericórdia arrasta-se há anos. No sábado passado, O GLOBO noticiou que a maternidade, na Rua Santa Luzia, no Centro, restringiu os atendimentos: dos dez a 15 partos diários, apenas dois estavam sendo feitos. A falta de insumos também fez o setor de neurocirurgia dar alta a seus pacientes e suspender operações. Em nota, a Santa Casa afirmou ontem ter restabelecido o fornecimento de medicamentos às enfermarias de neurocirurgia e à maternidade, normalizando os serviços.

Os atrasos no pagamento dos salários fizeram com que 22 coveiros cruzassem os braços, no dia 21 de junho passado, no Cemitério de Irajá. Eles alegaram que, há mais de dez anos, o dinheiro referente ao FGTS não é depositado.

Com dívidas acumuladas superiores a R$25 milhões, a entidade quase firmou uma parceria para a sua reestruturação com a Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan). O acordo chegou a ser anunciado em agosto do ano passado, mas em abril deste ano a Firjan informou que não iria mais auxiliar a Santa Casa.

Em 2005, O GLOBO também mostrou o precário estado de conservação nos cemitérios São João Batista e do Caju.