Título: Contando a História errada
Autor: Damé, Luiza
Fonte: O Globo, 07/07/2007, O País, p. 4

Site oficial da Presidência da República contém erros e cultua Lula.

BRASÍLIA. O espaço no portal da Presidência da República destinado a dar informações a crianças sobre a história política do Brasil está cheio de erros factuais e conceitos imprecisos, aponta o historiador Marco Antônio Villa. A página da Presidência na internet (http://www.presidencia.gov.br/criancas) diz, por exemplo, que Duque de Caxias participou do afastamento de Dom Pedro II, em 1889, pouco depois de informar corretamente que o militar morreu em 1880. O site, na avaliação de Villa, é também personalista, destinando mais espaço ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, citado inclusive nas biografias de outros políticos.

- Do ponto de vista pedagógico, o site é um desastre. É melhor tirar aquilo do ar - disse Villa, professor da Universidade Federal de São Carlos (SP), que reconhece a inexistência de uma boa biografia de Duque de Caxias.

Sobre Caxias, diz o texto do Planalto no item dedicado aos heróis militares: "Ele participou de momentos marcantes da História do país, como o afastamento de D. Pedro II e a regência da Princesa Isabel".

Outro erro identificado pelo professor é a inclusão de Júlio Prestes na galeria de ex-presidentes, uma vez que ele não chegou a assumir o cargo. A primeira linha da biografia de Prestes, no site, diz que ele foi eleito, mas não tomou posse. Prestes venceu as eleições de 1930, mas não assumiu o cargo, pois um mês antes (outubro) começou a revolução que levou Getúlio Vargas ao poder.

Também há informação equivocada sobre o ano da primeira Constituição brasileira, no Império. O correto é 1824, segundo Villa, mas o portal diz que é 1822, ano da Independência. "O Brasil se tornou uma nação em 1822, quando o país ganhou sua primeira Constituição, depois de declarada a independência de Portugal", diz o texto da Presidência.

- Fiquei estarrecido. Há muitos erros históricos. Quem lê aquilo desaprende História do Brasil - afirmou Villa.

Ele disse que há imprecisões sobre a relação entre os três Poderes. O site afirma que o presidente nomeia os ministros do Supremo Tribunal Federal, "e, assim, controla o Judiciário". De fato, o presidente da República indica os ministros do Supremo, mas seus nomes precisam ser aprovados pelo Senado. Além disso, pela Constituição, os poderes são independentes e autônomos.

Tão grave quanto os erros, na avaliação do historiador, é o culto ao atual presidente. Além de ter uma farta biografia não só no espaço para as crianças, mas também em outros ambientes do portal, Lula é citado nas biografias de ex-presidentes como Ernesto Geisel, João Figueiredo, Fernando Collor, José Sarney e Fernando Henrique Cardoso.

Na biografia de Geisel, Lula é apontado como líder da primeira greve de metalúrgicos desde 1964, ocorrida em maio de 1978, em São Bernardo do Campo. Villa contesta essa informação, dizendo que houve greves anteriores de metalúrgicos em Contagem e Diadema.

Lula também é lembrado como um dos líderes do impeachment de Collor. "Passados dois anos, Lula liderou uma mobilização nacional contra a corrupção que acabou no impeachment, processo que afastou Fernando Collor da Presidência", diz o texto. Para Villa, com base nas informações veiculadas no site, a História do Brasil nos últimos 30 anos girou em torno de Lula.

- A figura do presidente se sobrepõe à instituição Presidência da República. Há uma partidarização da Presidência da República, um culto à personalidade e um aparelhamento do Estado. Isso é lamentável porque deseduca as crianças - disse o historiador.

A assessoria de imprensa da Secretaria de Comunicação Social (Secom), responsável pela página da Presidência, reconheceu que o portal está defasado e superado não só do ponto de vista do conteúdo, mas também de acesso e navegação. Segundo a assessoria da Secom, o portal será reformulado e sofrerá uma revisão de conteúdo e informação.