Título: Collor de novo presidente
Autor: Krieger, Gustavo
Fonte: Correio Braziliense, 05/03/2009, Política - Tema do Dia, p. 2

Depois de uma disputa na qual não faltaram ataques, senador de Alagoas vai comandar a Comissão de Infraestrutura da Casa

Desde ontem, Fernando collor de Mello (PTB-AL) pode ser chamado novamente de presidente. É verdade que a presidência da Comissão de Infraestrutura do Senado é bem menos importante que o comando da República. Mas, para collor, o cargo representa uma volta por cima. O senador, que passou os dois primeiros anos de mandato em ostracismo, assume agora um dos principais cargos do Congresso. Vai dirigir a comissão pela qual passa a discussão dos principais projetos estruturais do Brasil, entre eles o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). No mesmo Senado que cassou seu mandato de presidente da República em 29 de dezembro de 1992, sob acusação de liderar um esquema de corrupção no governo.

Não foi fácil. collor teve de superar a petista Ideli Salvatti (SC) numa disputa pelo voto secreto, no plenário da comissão. Venceu por 13 votos a 10, ao final de uma sessão tensa, com troca de provocações entre os parlamentares. Sua eleição quebrou duas tradições do Senado. A primeira, de resolver por acordo o comando das comissões permanentes. E a segunda, de obedecer a proporcionalidade do tamanho das bancadas na distribuição dos cargos.

Pela proporcionalidade, o cargo caberia ao PT, que anunciou há meses a escolha de Ideli. Mas collor e o PTB bateram o pé e se recusaram a ceder. O Palácio do Planalto e os líderes governistas tentaram um acordo até a última hora. Os líderes do PT e PTB se reuniram ontem para um café da manhã, numa última tentativa de conciliação. Conversaram até o momento marcado para o início da sessão da comissão. Mas collor se manteve irredutível. Sabia que a contabilidade dos votos apontava sua vitória, mesmo que por margem estreita.

Única comissão disputada no voto, a de Infraestrutura concentrou as atenções. Faltaram cadeiras em sua acanhada sala de reuniões para acomodar os senadores interessados em participar da discussão. Parlamentares ficaram em pé nos corredores laterais e se revezam nas bancadas para usar o microfone.

collor chegou cedo e com pose de vencedor. Os cabelos grisalhos dispensaram a tintura. Vestia um sóbrio terno azul-marinho, com gravata da mesma cor. Nos corredores, foi abraçado por parlamentares, assessores e curiosos. Numa cena impensável algum tempo atrás, posou para fotos ao lado de um grupo de manifestantes vestindo camisetas vermelhas da CUT. Para desgosto de uma das militantes, que ficou de lado, xingando em voz baixa.

A reunião foi marcada pelo nervosismo. A primeira polêmica surgiu no discurso de collor. O senador alagoano fazia um elogio a Ideli Salvatti e disse que sua adversária ¿é uma pessoa que cisca para dentro¿. A expressão indignou a bancada do PT, que a interpretou como um xingamento. O líder do partido, Aloizio Mercadante, cobrou que o ex-presidente se retratasse. ¿Foi um elogio¿, justificou-se collor. ¿A expressão identifica uma pessoa que agrega.¿ Mesmo assim, voltou atrás.

Depois, quem deu a canelada foi o senador Sérgio Guerra (PE), presidente nacional do PSDB. Os tucanos estavam aliados ao PT e Guerra provocou: ¿Espero que, se eleito, o senador Fernando collor não tire nova licença¿, provocou. Foi uma referência às duas licenças pedidas pelo parlamentar alagoano desde a posse, em 2007. Sob o pretexto de organizar o PTB em seu estado, ele ficou afastado durante quase oito meses, em dois anos de mandato. ¿Esperamos contar com a sua presença¿, disse o tucano, ¿porque nos últimos anos ele não passou muito por aqui¿.

collor respondeu com a voz embargada. ¿Sou uma pessoa experiente e sofrida¿, disse. ¿Quando o senador Sérgio Guerra tirou licença, não perguntei os motivos.¿ A resposta veio do líder do PSDB, Arthur Virgílio (AM). ¿O senador Sérgio Guerra nunca tirou licença. Apenas apresentou atestados médicos para justificar sua ausência, durante o tratamento de uma doença que quase lhe custou a vida.¿

A briga prosseguiu mesmo depois da votação. Ao sair da sessão, Mercadante criticou o acordo entre PMDB, PTB e DEM, que garantiu a vitória de collor. ¿Foi uma aliança espúria que interferiu no direito legítimo e democrático do PT de presidir a comissão¿, queixou-se. Ao saber das declarações, collor reagiu: ¿Eu repilo. Espúria, ele que vá procurar para saber onde vai achar. Relação espúria não. Foi um acordo inteiramente aberto que todo mundo participou, todo mundo soube. O senador Aloizio Mercadante precisa medir um pouco suas palavras para respeitar seus companheiros aqui do Senado.¿

Não é uma briga nova. Quando ainda era deputado, Mercadante foi um dos principais integrantes da comissão parlamentar de inquérito que investigou corrupção no governo collor. Foram os trabalhos dessa comissão que levaram ao impeachment do ex-presidente.

DE OLHO NO PAC A Comissão de Infraestrutura do Senado é responsável pela análise dos grandes projetos do governo, incluindo transporte, obras públicas em geral, telecomunicações e mineração, além de legislar sobre parceiras público-privadas e as agências reguladoras. No Congresso, é conhecida como ¿a Comissão do PAC¿, pela relação com o Programa de Aceleração do Crescimento.

Ascensão, queda e volta por cima

17 de dezembro de 1989 Com 35 milhões de votos, vence o segundo turno das eleições presidenciais, batendo Luiz Inácio Lula da Silva, do PT.

15 de março de 1990 Toma posse na Presidência da República. No dia seguinte, lança um plano econômico que confisca as contas bancárias e aplicações financeiras.

1991 Seu governo enfrenta várias denúncias de corrupção, em especial sobre a influência de seu tesoureiro de campanha, Paulo César Farias, o PC, com negócios públicos.

25 de maio de 1992 Seu irmão, Pedro collor, dá uma entrevista à revista Veja com pesadas acusações contra o governo. O Congresso cria uma CPI da Corrupção.

16 de agosto de 1992 Manifestações em todo o país pedem o impeachment do presidente.

26 de agosto de 1992 A CPI aprova o relatório, acusando collor de ser financiado pelo Esquema PC.

29 de setembro de 1992 A Câmara aprova a abertura do processo de imepachment e afasta collor do cargo.

29 de dezembro de 1992 collor renuncia para tentar salvar seus direitos políticos. Mesmo assim, o Senado cassa seu mandato.

Dezembro de 1993 O Supremo Tribunal Federal (STF) considera válida a sessão do Senado que cassou o mandato e os direitos políticos de collor, que fica inelegível.

Dezembro de 1994 Por cinco votos a três, o STF absolve collor no processo criminal por corrupção passiva.

Agosto de 1995 Muda-se para Miami, com o argumento de estudar.

2002 Depois de recuperar os direitos políticos, filia-se ao minúsculo PRTB e disputa o governo de Alagoas. É derrotado no primeiro turno.

2006 Elege-se para o Senado.

Fevereiro de 2007 Um dia depois de tomar posse no Senado, troca o PRTB pelo PTB, a convite do ex-deputado Roberto Jefferson.

4 de março de 2009 Elege-se presidente da Comissão de Infraestrutura do Senado.