Título: Para ex-ministro, não há crise, mas 'acidente' na Casa
Autor: Medeiros, Lydia
Fonte: O Globo, 08/07/2007, O País, p. 10
Marco Villa aponta desmoralização de valores republicanos.
Ziguezague nas investigações sobre as fontes de renda do senador Renan Calheiros, recusa dos colegas em assumir a apuração do caso, suspeitas sobre o presidente do Conselho de Ética, renúncia de Joaquim Roriz e acusações contra seu suplente, Gim Argello. Nas últimas semanas, esses foram sintomas do clima que prevalece na Casa - já chamada de "o céu" pelo falecido senador Darcy Ribeiro.
- O Senado é uma velha instituição. Grandes iniciativas para o progresso do país partiram da Casa, que sempre abrigou grandes personalidades. Esse não tem sido o Senado de hoje - analisa o ex-presidente da Câmara, ex-ministro do STF e da Justiça Célio Borja.
- Há uma desmoralização dos valores republicanos, e há a impunidade, que chegou a ponto raramente visto na história republicana. Há uma grave crise. Para mim, a maior das últimas décadas no Senado - diz o historiador Marco Antonio Villa.
Célio Borja, contudo, discorda em parte da avaliação do professor. Para ele, a reação do Conselho de Ética, com a nomeação de novos relatores para o processo de Renan, mostrou que o Senado ainda funciona e cumpre seu papel:
- Não há uma crise. Há um acidente. O Parlamento cumpre sua função constitucional. Não convém transferir para a instituição o problema. É mania de grandeza - diz. - O caso Renan não afeta a instituição. Só se ela deixasse de funcionar. Se o Conselho não faz o que deve, recusa-se a julgar, aí o problema seria da instituição.
"O suplente é uma anomalia", afirma Villa
Ambos concordam, contudo, na identificação das causas dos problemas. Um deles, a legislação que concede mandatos a suplentes que não receberam um só voto nas eleições. Hoje, eles são 13 dos 81 senadores.
- Em razão do regime eleitoral, ao lado de grandes figuras o Senado passou a ter os que chegam pelo dinheiro. Não têm nome, mas o fabricam com os recursos que dispõem. Ou associam-se a políticos, bancando suas campanhas e ocupando vagas de suplentes. Isso diminuiu a estatura do Senado. Não moral, mas política - diz Borja.
Villa compara a figura do suplente aos senadores biônicos criados pela legislação do regime militar. Também chegavam à Casa sem o voto popular:
- O suplente é uma anomalia. Equivale à permanência de senadores biônicos. Só que piores. Aqueles eram eleitos por um colégio eleitoral estadual.
A sucessão de escândalos indigna eleitores, que entopem o correio eletrônico dos senadores. Para Villa, a revolta não produzirá mudanças a curto prazo:
- Não há associação entre crise política e crise econômica. Quando há, é explosivo.
Célio Borja é mais otimista:
- Vejo um horizonte de mudança. Meus netos estão desanimados, mas eles pensam que o Brasil nasceu com eles.