Título: Longe das escolas do crime
Autor: Brígido, Carolina
Fonte: O Globo, 09/07/2007, O País, p. 3

Lula recebe plano para construir 187 unidades especiais para jovens e menores infratores.

OPrograma Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci) está pronto para sair do papel e ganhar as ruas. Hoje, o ministro da Justiça, Tarso Genro, vai apresentar a idéia e o orçamento para colocá-la em prática ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Se obtiver aval, o programa deverá ser implantado a partir de 1º de agosto. O mote do Pronasci é unir iniciativas da área de segurança e sociais, com especial atenção à juventude. Uma delas é a construção de 187 novos presídios e unidades correcionais para abrigar jovens infratores em todo o Brasil, a maior parte destinada ao menor. Nas instituições funcionarão escolas, laboratórios de informática, cursos de capacitação profissional e fábricas para garantir emprego aos detentos.

Do total de novos presídios e unidades correcionais, 160 serão destinados a rapazes. Boa parte será voltada aos menores de idade, mas haverá instalações também para os jovens entre 18 e 24 anos. As outras 27 prisões servirão para abrigar mulheres infratoras também com 18 a 24 anos.

A idéia é manter a separação do público mais novo, porque a recuperação nesta faixa etária é considerada investimento de retorno praticamente certo. Ao mesmo tempo, a construção de prisões para jovens busca tirá-los dos cárceres comuns, considerados "escolas de bandidagem", e mantê-los em um ambiente que represente punição, mas que garanta acesso a instrumentos que ofereçam uma saída da criminalidade.

A intenção é começar a construir as unidades correcionais e prisões ainda este ano para entregá-las no fim de 2008. As obras já foram orçadas, mas o Ministério da Justiça se recusa a divulgar as cifras antes de apresentá-las a Lula. Os custos serão divididos entre os governos federal, estaduais e municipais, além de prever mecanismos para o apoio da iniciativa privada.

Plano será adotado em 50 municípios

O secretário-executivo do ministério, Luiz Paulo Barreto, explica que os alvos do programa são jovens da periferia que não têm oportunidade de estudo e trabalho, e acabam entrando no mundo do crime. Para exemplificar, Barreto lembra do personagem Zé Pequeno, do filme "Cidade de Deus". Nascido na favela e sem estrutura familiar coesa, o garoto encontrou no crime uma chance de sobrevivência. Segundo a organização não-governamental Viva Rio, estima-se que haja no Brasil dez milhões de jovens entre 15 e 24 anos vivendo em situação de risco decorrente da violência. Os dados disponíveis levam a crer que 2% deles - cerca de 200 mil pessoas - já se envolveram efetivamente com o crime.

- O Zé Pequeno é o público-alvo do Pronasci. Ele não tem família integrada, o Estado não o atinge com políticas sociais, e ele acaba sendo absorvido pelo tráfico. Vamos agir em cima desse tipo de jovem, vamos resgatá-lo para evitar que, no futuro, ele vire mais um Zé Pequeno - compara o secretário.

Inicialmente, o Pronasci será implementado em cerca de 50 municípios localizados nas regiões metropolitanas de capitais com maiores índices de violência: Brasília, Vitória, Belo Horizonte, Belém, Curitiba, Recife, Rio de Janeiro, São Paulo, Porto Alegre e Salvador. Até o fim do segundo mandato de Lula (2010), o programa deverá ser ampliado para todo o Brasil.

Barreto explicou que o governo está especialmente preocupado com os menores de idade que vão parar em estabelecimentos do tipo Febem (Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor). Por isso, o ministério planejou fazer um banco de dados com todos os internos para saber quais são as condições familiares, sociais, econômicas e educacionais desses jovens.

A partir dos dados, pretende-se atender às demandas individuais dos menores infratores para apostar na recuperação deles. Por exemplo, oferecer educação a quem parou de estudar e incluir as famílias dos menores em programas de inclusão social e ressocialização.

Esse tipo de iniciativa, para Barreto, vai ajudar a diminuir a violência no país. Ele alega que, historicamente, o poder público brasileiro investiu apenas no combate à violência depois que ela se instalou. Os recursos normalmente são direcionados para a modernização dos equipamentos utilizados por policiais, como coletes, veículos e armas. Não há, na visão de Barreto, incentivo a medidas preventivas, com inclusão social.

- No Brasil, existe um investimento tradicional em segurança pública voltado para o equipamento das polícias. É importante também, mas só isso não reduz a violência e a criminalidade. O Brasil não investiu tradicionalmente em estratégia de prevenção. Precisamos olhar para o jovem que esteja sob risco de ficar em conflito com a lei no futuro. Senão, vamos ficar eternamente prendendo e jogando essas pessoas em um sistema prisional que não recupera - afirma Barreto.

Outro projeto do governo é dar ao detento a oportunidade de, com três dias de estudo, abater um dia da pena à qual foi condenado. Atualmente, os presos podem livrar-se de um dia de cadeia a cada três dias trabalhados. Para implementar a medida, será preciso modificar a Lei de Execuções Penais. Outra idéia é melhorar as condições de trabalho e de vida dos policiais. O governo pretende investir pesado na capacitação dos profissionais de segurança pública, além de financiar a construção de casas populares para policiais em locais distantes dos focos da criminalidade.

O plano - também conhecido como "PAC da Segurança" - em alusão ao Programa de Aceleração do Crescimento - inclui ainda incentivos à formação de polícias comunitárias e à disseminação do uso de armas de baixa letalidade. Outra medida prevista é a restrição ou mesmo a proibição da venda de bebidas alcoólicas em bares localizados ao longo de rodovias, para evitar acidentes.