Título: Pressão para indiciar Lacerda
Autor: Brito, Ricardo
Fonte: Correio Braziliense, 05/03/2009, Política, p. 6

CPI DOS GRAMPOS

Num aparente clima de tranquilidade, o relator da CPI dos Grampos, deputado Nelson Pelegrino (PT-BA), apresentou ontem seu relatório final em que rejeita pedir o indiciamento do ex-diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) Paulo Lacerda por falso testemunho. Mas essa calma deve ser quebrada na próxima terça-feira, dia da votação do relatório, quando parlamentares da CPI do PMDB e do PTB ¿ juntamente com a oposição ¿ devem cobrar o indiciamento do ex-chefe da Abin por ter mentido à comissão parlamentar.

Desde o final do ano passado, Pellegrino dava demonstrações de que não pretendia culpar Lacerda pela maciça participação de servidores da agência na operação Satiagraha, deflagrada em julho passado pela Polícia Federal. O ex-chefe da agência, que depôs em agosto à CPI, minimizou a cooperação dos agentes na ação policial, dizendo que se restringiu à análise de dados cadastrais de investigados em fontes abertas. Contudo, diretores e servidores da Abin sustentaram posteriormente que a participação teria sido maior do que a dita por Lacerda.

¿Os depoimentos são contraditórios e, por isso, não há elementos que comprovem que Paulo Lacerda mentiu à CPI¿, declarou Pellegrino, que em janeiro recebeu um adendo de 40 páginas com as explicações do ex-chefe da Abin. O relator considerou apenas como ¿atípica¿ e ¿inusual¿ a cooperação entre Abin e Satiagraha, lembrando que ela já havia ocorrido em operações anteriores. Segundo ele, o respaldo para a cooperação está na lei que criou o sistema brasileiro de inteligência, órgão que engloba, entre outras instituições, a Abin e a PF. Ele quer encaminhar os depoimentos ao Ministério Público para aprofundar as apurações.

¿Ficou muito evidente a mentira do ex-diretor da Abin¿, rebate o deputado Vanderlei Macris (PSDB-SP). ¿Vou insistir no indiciamento dele¿, afirmou o presidente da CPI, Marcelo Itagiba (PMDB-RJ). ¿Esse é um relatório calça curta¿, criticou o peemedebista Colbert Martins (BA).

O relator também não chegou à conclusão de que os equipamentos comprados pela Abin são capazes de realizar escutas telefônicas. Quando se revelou o diálogo de uma conversa do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, atribuiu-se a escuta ¿ nunca comprovada ¿ à agência. Por esse episódio, Lacerda e toda a cúpula da agência foi afastada por quatro meses até serem demitidos do cargo. Ele agora prepara-se para ser adido policial em Portugal.

O caso Lacerda deverá ser o principal ponto de disputa do relatório de 281 páginas de Pellegrino. O relator faz uma série de recomendações. Ele pede que o Ministério da Justiça estude a proposta de se criar um controle sobre escritórios de detetives particulares, que, em sua opinião, podem se valer de escutas telefônicas ilegais para fazerem suas investigações. Cobra também que os órgãos policias estaduais e federais utilizem pessoal próprio para fazerem as escutas e degravações de telefonemas. Pede ainda que a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) fiscalize com maior rigor as operadoras responsáveis atualmente por fazerem as escutas.

O relator pede ainda o indiciamento de cinco policias civis por suposto envolvimento em escutas telefônicas e ambiental sem autorização da Justiça. O deputado propõe um projeto de lei em que regulamenta as interceptações de telefonemas. Entre as principais novidades está a de que o juiz responsável por autorizar escutas telefônicas, ambientais e de dados ficará proibido de julgar o futuro processo criminal decorrente das interceptações.