Título: Suspeita de sabotagem
Autor: Jungblut, Cristiane e Gois, Chico de
Fonte: O Globo, 23/07/2007, O País, p. 3

Aeronáutica estranha que todo o Cindacta-4 tenha falhado durante manutenção

Ahipótese de que uma sabotagem provocou, na madrugada de sábado, a pane elétrica do sistema de geradores de energia do Cindacta-4, com sede em Manaus e que opera o tráfego aéreo de toda Região Amazônica, está sendo investigada pela Aeronáutica, que, segundo sua assessoria de imprensa, vai considerar todas as hipóteses: se houve sabotagem, falha no equipamento ou falha no procedimento técnico. O trabalho de investigação, que terá duração de 40 dias, foi iniciado ontem pelo comandante da Aeronáutica, brigadeiro Juniti Saito, que esteve em Manaus, para verificar pessoalmente o problema que gerou situações de riscos no espaço aéreo brasileiro, obrigou o retorno de vôos internacionais aos pontos de origem e gerou novo caos nos aeroportos brasileiros durante o fim de semana.

Foi para evitar que o problema do Cindacta-4 se transformasse num novo foco da crise envolvendo agora a maior autoridade do governo no setor que o comandante Saito embarcou ontem pela manhã para Manaus, para acompanhar as primeiras investigações do Departamento de Controle do Espaço Aéreo (Decea) sobre o apagão elétrico. Os controladores de vôos, sempre apontados como responsáveis pela crise no setor aéreo, reagiram às especulações de sabotagem, argumentando que têm trabalhado em Manaus sob vigilância da Polícia da Aeronáutica. Disseram que não aceitarão ser responsabilizados por mais esse problema. Eles teriam feito vários alertas sobre a qualidade do equipamento do Cindacta-4.

Com a pane no Cindacta-4, o Sistema de Vigilância da Amazônia (Sivam) foi afetado: a sede do sistema (integrada ao Cindacta-4) deixou de visualizar as informações que são repassadas pelos radares distribuídos pela Amazônia.

Saito foi acompanhado de dois técnicos do Decea, um engenheiro elétrico e um técnico da área, que estão fazendo um trabalho preliminar que antecede a sindicância determinada pela Aeronáutica para investigar as causas da pane. Ontem, a Manaus Energia, concessionária responsável pela distribuição de energia na cidade, afirmou que não registrou falta de luz no Cindacta-4 durante o apagão.

Saito se irrita e cobra explicações em Manaus

O comandante Saito retornou de Manaus ontem à noite, mas a Aeronáutica não informou o resultado da visita. Houve preocupação dos militares com a reação dos controladores à hipótese de sabotagem. E, à noite, integrantes da Aeronáutica fizeram questão de dizer que nunca falaram que uma eventual sabotagem teria sido por parte dos controladores e sim pelos técnicos que fazem a manutenção do equipamento.

Segundo um militar, a hipótese de sabotagem é a que tem menor probabilidade porque teria que ser feita de forma camuflada, já que é sempre possível saber qual técnico estava de plantão no momento da pane. Em Manaus, Saito ficou por cerca de uma hora e meia na sede do Cindacta-4 e conversou com controladores. Fez duas perguntas: se havia algum problema nos equipamentos e como estava naquele momento o tráfego aéreo na região. Desde sábado, Saito passou a monitorar a situação em Manaus e, segundo interlocutores, ficou irritado com o fato. Ele cobrou explicações sobre o motivo de todos os sistemas terem falhado - o gerador de energia e o auxiliar - e, principalmente, porque houve o corte no fornecimento externo de energia, deixando o prédio do Cindacta-4 às escuras.

Inicialmente, integrantes da Aeronáutica admitiram a hipótese de sabotagem, mas ao longo do dia de ontem ressaltaram que todas as hipóteses devem ser levantadas e negaram que quisessem culpar os controladores. Uma fonte do setor contou que o próprio Saito teria desconfiado, a princípio, do fato de um procedimento de manutenção - o que provocou a pane - ter sido feito no horário de pico do Cindacta-4.

Em conversas reservadas, oficiais da Aeronáutica dizem que passar à população a idéia de sabotagem pode ser uma estratégia para tentar tirar o foco da deficiência na gestão e dos problemas na estrutura por falta de dinheiro.

- Se uma Força Armada não tem competência para vigiar um ponto vital do sistema, que são os geradores de energia, a situação é complicada. Falar em sabotagem, além de tentar desviar o foco, é dar um tiro no pé. É reconhecer a incapacidade de gestão - disse um oficial.

O problema no Cindacta-4 teria ocorrido na troca de baterias de um grupo de geradores para outro. Os militares argumentam que o técnico de plantão tinha experiência e estranhavam o fato de até o fornecimento externo de energia ter sido interrompido. Pode ter sido uma falha técnica, mas todas as hipóteses serão analisadas, segundo uma fonte da Aeronáutica.

COLABOROU Geralda Doca