Título: Renan manobra de novo, e oposição se retira do plenário
Autor: Vasconcelos, Adriana
Fonte: O Globo, 13/07/2007, O País, p. 8

SUCESSÃO DE ESCÂNDALOS: "Conclamo os senadores, pelo menos os do meu partido, a nos retirarmos e a não votarmos mais nada sob a presidência do senador Renan enquanto isso não for resolvido", discursou Tasso Jereissati.

Presidente do Senado adiou para terça-feira a reunião da Mesa prevista para ontem, que decidiria sobre pedido de investigação de denúncias contra ele. PSDB, DEM e PSOL protestaram saindo da sessão.

BRASÍLIA. Sem aparecer em plenário ou ao menos registrar presença no painel, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), não se sentiu ontem impedido de tomar sozinho a decisão de adiar para terça-feira - véspera do início do recesso parlamentar - a reunião da Mesa Diretora que decidiria ontem sobre os próximos passos do processo que tramita contra ele próprio no Conselho de Ética. O gesto, considerado mais uma manobra protelatória, provocou uma rebelião da oposição, que decidiu se retirar do plenário e ameaçou não mais participar de sessões comandadas pelo presidente.

O clima, mais uma vez, ficou muito tenso, mesmo com a ausência de Renan. Ele foi insistentemente chamado pelos senadores para comparecer ao plenário. E, embora estivesse na Casa, preferiu ir embora. A oposição apelou para que o vice-presidente da Casa, Tião Viana (PT-AC), alterasse a decisão de Renan sobre a reunião da Mesa. Mas, diante da recusa de Viana, representantes do PSDB, do DEM e do PSOL deixaram o plenário em protesto.

No fim do dia, oposição usa um tom mais moderado

A expectativa, e o combinado, era que ontem mesmo a Mesa decidisse pelo encaminhamento, ou não, à Polícia Federal de um pedido para que a perícia realizada nos documentos de defesa de Renan responda a pelo menos 30 perguntas. No fim do dia, num tom mais moderado, a oposição resolveu dar um prazo até terça-feira para que a Mesa decida.

- Conclamo os senadores, pelo menos os do meu partido, a nos retirarmos deste plenário e a não votarmos mais nada sob a presidência do senador Renan, enquanto isso não for resolvido. É essa minha palavra final, e peço a todos os senadores que sigam essa nossa decisão - propôs o presidente do PSDB, Tasso Jereissati (CE), aplaudido.

Numa reunião na liderança do PSDB, após a saída do plenário, os oposicionistas decidiram pelo recuo. Avisaram que permanecerão em vigília até terça-feira e que, se a Mesa do Senado não analisar o pedido encaminhado pelo Conselho, aí, sim, partirão para o boicote das sessões, se necessário. Eles ameaçaram também recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF) para que Renan seja impedido de interferir no processo do qual é réu.

- Vamos apelar a todos os recursos legais - disse Demóstenes Torres (DEM-GO).

Enquanto a oposição conclamava Renan a aparecer para explicar sua decisão, o presidente do Senado decidiu ir embora. Na saída, abusando da ironia, provocou o líder do DEM, José Agripino (RN), com quem disputou a presidência da Casa.

- Quem tem 28 votos não marca reunião da Mesa. Quem marca reunião é quem ganhou a eleição - provocou Renan, em referência aos votos de Agripino na disputa.

E negou manobras:

- Ninguém tem mais interesse em acabar com isso do que eu. Mas mandaram para a Mesa três documentos, e o terceiro chegou só às 16h32m.

Segundo Tião Viana, a quem coube anunciar a decisão, Renan optou pelo adiamento para que houvesse prazo para notificação das partes envolvidas - ele e o PSOL, autor da representação.

- O PSOL já se sente notificado - apelou, em vão, o senador José Nery (PSOL-PA).

O adiamento da reunião dividiu aliados de Renan. Alguns deixaram claro sua discordância, como a líder do PT, Ideli Salvati (SC), Patrícia Saboya (PSB-CE) e Garibaldi Alves (PMDB-RN).

- Gostaria de deixar consignado que lamento que a reunião da Mesa não tivesse sido realizada hoje (ontem). Pois vamos esticar este clima de acirramento - lamentou Ideli.

"Melhor instalar uma fogueira no Congresso"

Almeida Lima (PMDB-SE) foi um dos poucos que defenderam a decisão de Renan. Foi o único dos três relatores do caso que discordou da participação da PF na investigação, argumentando que isso só seria possível com a autorização do STF.

- Não sei por que tanto açodamento. O advogado tem direito de ser notificado pelo menos 24 horas antes do ato processual. Se querem atropelar isso, melhor instalar uma fogueira ou uma forca em frente ao Congresso e tacar fogo no presidente da Casa - defendeu Almeida, que ameaça apresentar um voto em separado, caso discorde dos dois outros relatores, Renato Casagrande (PSB-ES) e Marisa Serrano (PSDB-MS).

Inácio Arruda (PCdoB- CE), acusou a oposição de estar de olho no cargo de Renan:

- A questão se transformou em uma batalha política, que põe em confronto forças que têm anseios, desejos, e que querem, em última instância, o lugar do senador Renan. Se não considerarmos nesses termos, vamos querer dar uma de inocentes em um plenário onde não há nenhum inocente. Aliás, não há inocentes nem santos.

- Não é apenas uma questão dos adversários. Não sou adversária dele, mas penso que ele tem agido de forma intransigente, prejudicando a si próprio - reagiu Patrícia Saboya.

Para aliados de Renan, os dados da enquete publicada ontem pelo GLOBO reforçam a gravidade da crise. Dos 59 parlamentares ouvidos, em voto secreto, 37 afirmaram que a permanência dele na presidência atrapalha o Parlamento; 13 não viram problemas, enquanto quatro disseram não ter posição e cinco votaram em branco.

- A pesquisa mostra que a imagem do Senado fica desgastada, e que o sentimento das ruas cresceu de tal forma que atinge o Congresso - disse Sibá Machado (PT-AC), que renunciou à presidência do Conselho de Ética.

- O estrago já está feito. Mas uma renúncia seria fatal para Renan - ressaltou Gilvan Borges (PMDB-AP).

COLABOROU Gerson Camarotti