Título: Sarney, um aliado discreto
Autor: Camarotti, Gerson
Fonte: O Globo, 16/07/2007, O País, p. 4

Senador é o principal articulador da defesa de Renan nos bastidores.

BRASÍLIA. Nas sete semanas em que o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), tornou-se o pivô de uma crise política que atingiu a imagem da instituição, ele tem contado com o apoio de um discreto conselheiro: o senador José Sarney (PMDB-AP). Apesar de não aparecer na linha de frente dos integrantes da tropa de choque de Renan, Sarney tem sido o principal articulador político da defesa do alagoano desde que ele foi acusado de ter despesas pessoais pagas por um lobista da empreiteira Mendes Júnior.

Fiel ao seu estilo, Sarney quase não tem aparecido no plenário, para não ser abordado pela imprensa sobre o assunto. Na semana passada, quando o GLOBO fez uma enquete com todos os senadores, Sarney foi o único não localizado. A enquete revelou que 63% dos senadores avaliam que a permanência de Renan prejudica a imagem da Casa. Sarney não participou das sessões constrangedoras em que senadores pediram o afastamento de Renan.

Longe dos holofotes, o ex-presidente tem sido incansável. Nos piores momentos, ele articulou encontros de Renan com o presidente Lula. Em troca da audiência, Sarney teria convencido Renan a não presidir a sessão do Congresso que votou a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2008. No dia seguinte, Sarney resumiu o que acha das acusações:

- Ele está sofrendo uma campanha e nada foi provado contra ele.

Desde que estourou a crise, esse foi o terceiro encontro que Sarney conseguiu marcar entre Lula e Renan. Sempre que perguntado sobre Renan, Sarney desconversa. Se perguntado sobre nova eleição no Senado, corta o assunto.

Sarney esteve ao lado de Renan em todos os momentos. Foi ele quem escalou o primeiro relator, o senador Epitácio Cafeteira (PTB-MA), para arquivar o processo por quebra de decoro contra Renan no Conselho de Ética. E destacou o senador Gilvan Borges (PMDB-AP) para a tropa de choque do alagoano.

Pelo menos três vezes por semana, Sarney tem recebido a visita de Renan em sua residência. Numa única noite, semana passada, os dois se falaram por telefone duas vezes.

- Sarney tem sido um grande conselheiro de Renan - atesta o líder do PMDB na Câmara, Henrique Eduardo Alves (RN).

Em conversas reservadas, Sarney costuma avaliar os erros e acertos da estratégia política e jurídica de Renan. E, na contabilidade de Sarney, tem mais erros do que acertos. Há um mês, foi taxativo: é preciso arquivar imediatamente esse processo. E profetizou que se isso não fosse feito, a situação ficaria fora de controle. Foi o que aconteceu.

Sarney alertou Renan para a estratégia da defesa, com os excessos de esclarecimento. Principalmente ao colocar à disposição as provas de compra e venda de gado. Constatou-se irregularidades na documentação, que agora terá nova perícia da Polícia Federal. Mas a preocupação de Sarney é com o que classificou de "inoportunidade" dos ataques de Renan. Na semana passada, o presidente do Senado disse a tucanos e democratas que, para tirá-lo do cargo, eles teriam que "sujar as mãos".

- A cota de erro de Renan tem sido grande! - desabafou Sarney para um interlocutor.

Como o pai, Roseana Sarney (PMDB-MA), líder do governo no Congresso, tem tido discreta. Roseana tem trabalhado nos bastidores em favor de Renan. Não por acaso. Sarney reconhece que foi Renan quem ofereceu um partido e estrutura para a filha Roseana quando ela deixou o PFL e estava sem legenda.

Renan brigou pela indicação de Roseana para o cargo de líder de governo, além de todas as indicações de Sarney para o governo Lula. Teve um momento em que os dois estiveram em lados opostos. Em 2004, Renan ajudou a derrotar a emenda da reeleição para cargos do Congresso, o que impediu Sarney de permanecer na presidência do Senado. Mas Renan fez uma rápida recomposição. Para agradar Sarney, o alagoano manteve as principais diretorias da Casa sob o comando do antecessor.