Título: Juro cai. Taxa de banco, nem tanto
Autor: Rosa, Bruno e Duarte, Patrícia
Fonte: O Globo, 26/07/2007, Economia, p. 29

Selic recuou 35%, mas diferença na intermediação de empréstimos cedeu só 14%.

Aqueda dos juros básicos da economia brasileira não foi acompanhada, na mesma proporção, pelos bancos nos spreads cobrados dos clientes. O spread é a diferença entre a taxa paga pela instituição financeira para captar recursos e os juros finais ao consumidor. Enquanto a taxa básica Selic caiu 35,21% desde agosto de 2005, para os atuais 11,5% ao ano, o spread registrou redução menor, de 13,98%, segundo levantamento da Austin Rating feito a pedido do GLOBO.

Ontem, o Banco Central (BC) informou que o spread de todas as operações de crédito recuou apenas 0,1 ponto percentual em junho, para 26,1 pontos percentuais. Para empresas, a queda foi de 0,2 ponto, para 12,6 pontos percentuais. Já nos empréstimos a pessoas físicas, o spread se manteve em 37,7 pontos. A Austin Rating estima que, este mês, o spread tenha recuado para 36,9 pontos.

Segundo os próprios bancos e analistas do mercado, o spread não caiu mais nos últimos meses porque as instituições financeiras expandiram muito sua carteira de crédito, incluindo clientes de baixa renda, para os quais ainda não há histórico sobre taxas de inadimplência.

- O spread caiu, mas de forma mais lenta que a Selic. Como a inadimplência está sob controle, os bancos passaram a calcular o risco futuro de calote dos desconhecidos que entraram em suas carteiras - afirma Alex Agostini, economista-chefe da Austin Rating.

Ele acrescenta que o compulsório elevado (parcela que o Banco Central recolhe diariamente do sistema financeiro, hoje em cerca de 53% dos depósitos à vista) e a alta carga tributária do país também inibem reduções maiores do spread. Qualquer que seja o motivo, os bancos acabam lucrando com as altas taxas de juros cobradas dos clientes:

- O risco se transforma em ganho, já que 40% da composição do spread é o lucro bruto das instituições financeiras. Em parte, isso explica os bons resultados dos bancos - diz.

Com a ampliação da carteira de crédito, a receita dos bancos com spread nos empréstimos a pessoas físicas cresceu 14% no ano passado, chegando a R$49 bilhões. Segundo a Austin Rating, com base nos dados de 146 instituições do Sistema Financeiro Nacional, a expectativa é que essa receita registre alta de 3% este ano, alcançando R$50,5 bilhões.

Agostini ressalta que a inadimplência responde por 17% do spread, e a carga tributária e os custos de administração têm peso de 43%. É o comportamento desses fatores que tem influenciado os juros cobrados no varejo, afirma Nicola Tingas, economista-chefe da Federação Brasileira dos Bancos (Febraban).

- A Selic é um orientador de tendência das taxas no varejo. Hoje, o principal ponto é a entrada de novos clientes no sistema financeiro, que têm aumentado o risco de inadimplência. Com o cadastro positivo, que deve sair até o fim deste ano, haverá uma melhora no cenário, já que isso vai permitir a queda nas taxas para os bons pagadores - afirma Tingas.

Nas filas dos bancos e no comércio, a redução das taxas passa despercebida pelos brasileiros, endossa Miguel José Ribeiro de Oliveira, vice-presidente da Associação Nacional dos Executivos de Finanças Administração e Contabilidade (Anefac).

- A queda poderia ter sido maior, já que a inadimplência tem se mantido estável nos últimos anos. O que acontece é uma mudança no perfil de quem toma empréstimos. Todos os componentes que formam o spread estão altos demais, como impostos e risco de calote, além da margem de lucro que fica no bancos - afirma Oliveira.

Em meio a juros ainda altos, muitos consumidores tentam não se endividar:

- No cartão de crédito, por exemplo, evito parcelar as compras, porque sei que os juros são altíssimos - diz a supervisora de atendimento Rita Palmiere.

Segundo balanço divulgado ontem pelo BC, a taxa média cobrada pelos bancos aos consumidores caiu apenas 0,4 ponto percentual no mês passado, indo para 37% ao ano e reforçando a mínima histórica. As empresas obtiveram a maior queda, de 0,6 ponto percentual, para 23,7% ao ano. Já para as pessoas físicas, o recuo foi de apenas 0,2 ponto, para 48,4%.

A boa notícia é que os juros cobrados no cheque especial foram os que mais recuaram em junho: 0,6 ponto. A taxa média - de 139,7% ao ano - voltou a cair abaixo do patamar de 140% após oito anos. Porém, permanece incrivelmente elevada. Em dezembro de 1999, os juros desta modalidade estavam em 138,8% ao ano. Para Altamir Lopes, chefe do departamento econômico do BC, ainda é um grande peso no orçamento, mas ele comemorou o fato de as taxas estarem voltando a seus pisos.

Apesar dos recuos, ainda há espaço para juros menores. Neste ano, a Selic foi reduzida em 13,21%, já as taxas médias para as empresas encolheram 9,54% e, para os consumidores, apenas 7,64%. A tendência, acrescentou o chefe de departamento do BC, é que o crédito continue crescendo e as taxas, declinando. Dados parciais de julho, mostram que os juros para pessoas físicas e jurídicas estavam em 48,1% e 22,9% ao ano, respectivamente.