Título: Diferenças que Jobim pode fazer
Autor: Cruvinel, Tereza
Fonte: O Globo, 27/07/2007, O Globo, p. 2

Minha mulher não deixa". Mais uma vez, Nelson Jobim escorou-se nela para negar que esteja no páreo para 2010. Ele está certo, foi nomeado para vencer uma crise, não para empinar projetos políticos. Mas a verdade é que ele agregará valor político ao governo, fortalecerá a coalizão, será um forte pólo de influência e, se tiver êxito, pode, sim, tornar-se uma alternativa sucessória para Lula. A presença de Jobim fará diferença.

Ao procurar um substituto para Waldir Pires, Lula buscou essencialmente alguém com os atributos para enfrentar a crise aérea mas acabou, calculadamente ou não, atraindo um ator político importante. Se Jobim tiver êxito na Defesa, sua escolha poderá ter sido um dos maiores acertos políticos de Lula. Jobim é um típico quadro de Estado, que entra no governo, depois de ter prometido sair da esfera pública, para não ganhar um centavo a mais (é aposentado pelo teto salarial do serviço público). Entra habilitado a contribuir também nas áreas jurídica e política, tornando-se um protagonista importante. No próprio governo já se admite a possibilidade (não a probabilidade, pois é cedo para falar disso) de ele vir a ser uma opção de Lula para a sucessão de 2010.

Agora, temos de vê-lo como aposta para enfrentar a crise do setor aéreo, sua reestruturação, depois que mazelas acumuladas, explicitadas pelo acidente com o avião da Gol, foram exacerbadas e agravadas pela lentidão do governo em reagir e tomar medidas fortes no prazo certo. Nas entrevistas e discursos da posse e da transmissão de cargo, Jobim mostrou que tem os atributos para vencer o desafio, embora, na vida, as circunstâncias nem sempre nos permitam fazer uso deles. Muitas vezes, elas neutralizam nossas qualidades. Mas está claro que uma delas é propícia. Ele tem a força, a carta-branca, a autorização plena do presidente para fazer o que for preciso. "É preciso harmonia. Serei o maestro. A composição e a música são do presidente", disse ele ontem, completando o "quem manda é o ministro" da véspera. Reiterou que será o gestor supremo, mencionou diretrizes que já estão claras (estavam em lenta gestação e foram aceleradas depois da tragédia aérea pelos ministros do Conac) e outras que ainda vai examinar. Já fez diferença no tom do governo ao tratar da tragédia de Congonhas, com o minuto de silêncio de ontem, a fala sóbria e a viagem a São Paulo. "A História não registra intenções, só resultados", disse, numa passagem quase rude para com Waldir. Pelos resultados, vamos esperar. Voltemos ao significado político da entrada dele no governo.

Quem entrou não foi um técnico, para ser um nome a mais, mas alguém capaz de cumprir diferentes tarefas, assumindo uma importância que pode ir além da pasta da Defesa, um ministério que, desde sua criação, nunca teve seu titular alçado ao topo do governo, como seria natural. A presença de Jobim valoriza o governo e valoriza a coalizão com o PMDB, que teve como principais artífices ele próprio, o deputado Michel Temer e o ministro Tarso Genro, então coordenador político. Depois ele se afastou, por causa dos atritos internos no PMDB. Com Jobim, Lula ganha um ministro que tem interlocução qualificada com o PSDB, e isso é ganho nestes tempos beligerantes.

Para 2010, Lula não tem, hoje, um candidato pronto no PT, e construir um não é fácil. No campo lulista, há candidaturas não petistas em gestação, como a de Ciro Gomes, pelo bloco de esquerda, mas ela enfrenta resistências no PT. Com o enfraquecimento de Renan Calheiros, torna-se mais possível uma reunificação do PMDB. Ungido por Lula, Jobim poderia ser verdadeiramente um candidato da coalizão PT-PMDB. Ou só do PMDB, mas com o apoio de Lula, se o PT insistir em nome próprio só para constar. Isso está em todas as contas, ainda que não esteja nas de Jobim, como ele jura dizendo que Adrienne, sua mulher, não deixaria.

Dois gaúchos

O ministro da Justiça, Tarso Genro, atropelou a Anac e mandou a Polícia Federal e a Secretaria Nacional de Direito Econômico fiscalizarem e punirem as empresas aéreas que estiverem violando o direito do consumidor. Matéria prima é o que não falta, nesta área, nos principais aeroportos do país.

A seguir, circularam boatos de que Tarso estaria provocando Jobim, seu conterrâneo, que sempre esteve na trincheira oposta, na política gaúcha. Mas Jobim foi informado e endossou. Depois da transmissão de cargo, Tarso fez calorosas declarações sobre o novo colega.

- Jobim é um quadro extraordinário, de quem sou amigo há 45 anos. Temos formações políticas diferentes, mas sempre dialogamos e nos identificamos na defesa da democracia e dos valores básicos da política. O fato de ele já ter anunciado sua retirada para a advocacia e a vida privada, e de voltar para servir ao governo numa hora e numa área difícil, só o valoriza como homem público. Estou certo de que ele enriquecerá o governo e de que sua presença tornará mais sólida a coalizão governista.

A COLUNA de anteontem afirmou ter ocorrido no governo passado a troca do DAC pela Anac. O governo passado tomou a decisão e enviou a lei ao Congresso. Sob Lula, foi aprovada, e a agência implantada, sob protestos da oposição pela escolha de uma diretoria de perfil muito político. E, agora se prova, inadequado.