Título: Solavanco nos mercados
Autor: Rosa, Bruno
Fonte: O Globo, 27/07/2007, Economia, p. 25

AMEAÇA GLOBAL

Medo com hipotecas nos EUA derruba bolsas. Dólar sobe 3% e risco-Brasil aumenta 21%.

O temor de que a crise nas hipotecas de alto risco dos EUA (as chamadas subprime) se alastre pela economia americana derrubou os mercados do mundo inteiro ontem. No Brasil, a Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) registrou o terceiro pior dia do ano, fechando em baixa de 3,76%, aos 53.893 pontos, depois de cair quase 6% ao longo do dia. O dólar subiu 3,27% e fechou a R$1,927 - voltando, assim, a um patamar acima de R$1,90. Acompanhando os demais países emergentes, o risco-Brasil disparou 21,42%, para 221 pontos centesimais.

Em meio a investidores arredios, uma empresa adiou seu lançamento de ações na Bovespa, e o Tesouro Nacional cancelou um leilão de títulos no mercado. Houve fortes perdas também nas bolsas americanas e européias. Em Nova York, o índice Dow Jones chegou a cair mais de 3% e fechou em queda de 2,26%. Foi o pior pregão desde o fim de fevereiro, quando a Bolsa da China despencou, e os índices americanos caíram quase 4%.

O mau humor nos mercados foi detonado pela divulgação de uma forte queda na venda de casas novas nos EUA, o que aumentou o pessimismo sobre o mercado imobiliário americano. Com a aversão a risco cada vez maior, os investidores estrangeiros retiraram suas aplicações de países emergentes. O risco-Colômbia, por exemplo, subiu 21,94%, para 189 pontos. A taxa brasileira ficou em 221, o maior nível desde dezembro do ano passado. Já o dólar registrou a maior alta (3,27%) desde maio de 2006.

Calote imobiliário terá ápice em 2008

Os analistas, porém, viram nas turbulências de ontem mais um ajuste dos mercados do que um sinal de uma crise de grandes proporções. Para Jason Vieira, economista-chefe da Uptrend, as quedas nas bolsas refletem o medo de que a crise no subprime contamine outras áreas do crédito. Com a correção no mercado acionário ao longo desta semana, a aversão a risco está aumentando com força. Isso intensificou a procura pelos títulos do Tesouro americano, considerados os mais seguros do mundo, que, assim, passaram a render menos. Os papéis com vencimento em dez anos fecharam com taxa anual de 4,77%, com queda de 2,59%. Isso influenciou o risco-país dos emergentes, que é a diferença entre os juros pagos pelos papéis desses países e os juros do Tesouro americano.

- O risco-Brasil tem avançado porque a rentabilidade dos títulos americanos está caindo, aumentando a diferença entre as taxas dos dois países - diz Vieira.

Roberto Padovani, estrategista de investimentos sênior para a América Latina do Banco WestLB, acredita que a atual queda dos mercados é passageira. Segundo ele, as perdas globais são um ajuste técnico e não vão mudar o bom momento econômico do país. Para a analista de ratings soberanos da agência de classificação de risco Standard & Poor"s Lisa Schineller, a turbulência dos mercados não deve desviar o Brasil da rota de grau de investimento, recomendação dada quando o país é considerado seguro para aplicações. Segundo ela, o Brasil aproveitou a farta liquidez global e hoje está mais preparado para lidar com problemas externos.

De qualquer maneira, desde terça-feira, quando começou a turbulência nos mercados, a Bolsa brasileira já caiu 7,13%. Ontem, o Ibovespa, índice que reúne as 54 ações mais negociadas na Bolsa, não registrou uma alta sequer.

Daniella Marques, gestora de renda variável da Mercatto Gestão de Recursos, ressaltou que a crise no subprime pode afetar o consumo no médio prazo, já que parte da poupança dos americanos está no aluguel de imóveis.

O governo americano informou ontem que as vendas de casas novas caíram 6,6% em junho, contra estimativa de recuo de 1%. Foi a maior queda no ano. E duas construtoras divulgaram prejuízos no segundo trimestre. A D.R. Horton teve perdas de US$823 milhões, contra um lucro de 293 milhões no mesmo período de 2006, e a Beazer Homes perdeu US$123 milhões, frente a ganho de US$102 milhões na mesma comparação.

As preocupações com o mercado imobiliário aumentaram quando o grupo australiano Absolute Capital suspendeu até o fim de outubro os resgates de dois de seus fundos atrelados a subprime que, juntos, têm mais de 200 milhões de dólares australianos (cerca de US$175 milhões).

O banco Wells Fargo, por sua vez, informou que vai fechar sua unidade de empréstimos que não são de primeira linha no atacado. Trata-se de linhas que financiam recursos para terceiros. A decisão foi tomada por causa da crise nas hipotecas subprime. Segundo a presidente da Wells Fargo Home Mortgage, Cara Heiden, a turbulência continuará a curto prazo.

Segundo estudo da Economy.com, braço da Moody"s, divulgado ontem, os calotes nas hipotecas devem atingir seu ápice em meados de 2008. O estudo estima que as execuções por não-pagamento chegarão a 10% nas hipotecas de alto risco, contra os 4% atuais.

(*) Com agências internacionais