Título: A hora do terceiro turno
Autor: Novo, Aguinaldo e Ordoñez, Ramona
Fonte: O Globo, 03/08/2007, Economia, p. 23

Economia aquecida leva empresas a adotarem jornada adicional e elevarem horas extras.

Oaquecimento da economia tem levado empresas de vários setores a ampliar o número de turnos de trabalho e também o volume de horas extras de seus funcionários. Ontem foi a vez de a PSA Peugeot Citroën anunciar a contratação de 700 empregados. Todos vão trabalhar num terceiro turno de produção que será ativado até dezembro na fábrica de Porto Real (RJ), ajudando o consórcio a dar conta das encomendas que devem alcançar volume recorde neste ano. A mudança também é visível em segmentos como de produtos alimentícios e bebidas, minerais não-metálicos (cimento, vidro, cerâmica, cujas vendas crescem na esteira da ampliação do mercado imobiliário), metalurgia e material elétrico.

Uma pesquisa inédita do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre), da Fundação Getulio Vargas (FGV), captou esse movimento. Pela sondagem, que considerou 1.018 empresas de todos os portes no país, a indústria de transformação mantém hoje 2,4 turnos em média de produção. É o maior resultado da série, iniciada em outubro de 2001.

Vendas de veículos batem recorde

Considerando uma média anual, o setor de material de transporte (montadora e autopeças) apresentou a maior variação no período, passando de 1,9 em 2002 para 2,4 turnos de produção cinco anos depois. Também se destacam produtos alimentares (1,7 para 2 turnos), minerais não-metálicos (2,1 para 2,3), metalurgia (2,3 para 2,5) e material elétrico e de comunicação (1,8 para 2,1). Na contramão, aparecem os setores que têm enfrentado maiores problemas por causa do dólar fraco, como têxtil (2,7 para 2,6) e vestuário e calçados (1,8 para 1,7).

Só no primeiro semestre, as vendas de carros novos no mercado interno cresceram 26% frente ao mesmo período de 2006. Os dados preliminares de julho (212.952 unidades) apontam para novo recorde no mês. À exceção da General Motors, todas as grandes montadoras já abriram novos turnos de trabalho. A Ford foi a primeira: em agosto de 2004, criou um terceiro turno na fábrica de Camaçari (BA). Desde fevereiro, a Fiat trabalha com esse turno extra, empregando mais 2.900 funcionários. A Volkswagen, por sua vez, criou um terceiro turno na fábrica de Taubaté (mais 700 empregos) e um segundo turno para a linha de produção do Gol em Anchieta (outras 700 vagas).

- O setor já começa a se queixar da falta de matérias-primas ou componentes - afirmou o economista Aloisio Campelo, do Ibre.

Dados da Confederação Nacional da Indústria (CNI) indicam crescimento contínuo das horas trabalhadas na produção. Em maio (último dado disponível), o índice chegou a 115,7 pontos, o maior da nova série histórica, que começa em janeiro de 2003. Com ajuste sazonal, as horas trabalhadas na produção cresceram 1,1% em maio, pelo quatro mês consecutivo. Na comparação com maio de 2006, houve expansão de 4,1%. Já no acumulado de janeiro a maio, o crescimento das horas trabalhadas é de 3,6%.

Mas esse aumento não corresponde necessariamente à abertura de novos postos de trabalho. Parte disso esconde horas extras. Um trabalho da Fundação Seade mostra que, em junho, 32% dos assalariados da indústria na região metropolitana de São Paulo trabalharam além da jornada permitida na Constituição, que é de 44 horas semanais.

A Peugeot Citroën decidiu criar o terceiro turno em Porto Real entusiasmada com o crescimento de 23% nas vendas no primeiro semestre deste ano e de 50% só em junho. O anúncio foi feito ontem pelo diretor-geral de Brasil e Mercosul, Vincent Rambaud, ao informar que o novo turno vai gerar 700 empregos, além dos atuais 2.700. A fabricante aumentará sua capacidade de produção de cem mil veículos anuais para 150 mil.