Título: Parentes de vítimas do vôo da Gol pedem investigação sobre pilhagem
Autor: Otavio, Chico e Freire, Flávio
Fonte: O Globo, 06/08/2007, O País, p. 4

Falsário obteve empréstimo em nome de vítima que teve celular desviado.

RIO e SÃO PAULO. Parentes das vítimas do acidente com o Boeing da Gol, em 29 de setembro do ano passado, vão cobrar das autoridades responsáveis pelo resgate dos corpos - 154 pessoas morreram na queda do avião, no norte do Mato Grosso - o destino dos pertences encontrados no local. Advogado de 55 famílias, Leonardo Amarante disse ontem que seus clientes suspeitam do desaparecimento de bens das vítimas após o resgate.

Reportagem publicada ontem pelo jornal "O Estado de S.Paulo" denunciou que os corpos foram pilhados. Um falsário teria usado documentos de um dos passageiros, no mês passado, para obter um financiamento de R$20,4 mil para a compra de um carro.

Financeira aprovou crédito com dados de vítima

Nove meses depois do acidente, um funcionário da Finasa entrou em contato com Catherine Marie, filha caçula de Maria das Graças Rickli, para saber se a mãe já havia recebido o boleto da primeira prestação de um financiamento que estava atrasado - Graça foi uma das vítimas do acidente. Surpresa, Catherine descobriu que um falsário usara documentos da mãe para comprar um Gol de segunda mão de uma revenda, em Brasília, no dia 4 de junho.

Catherine teve grande dificuldade para sustar o financiamento e obter informações sobre o falsário na Finasa. Inicialmente, os funcionários da financeira relutaram em ajudá-la, mesmo depois de ouvir seus argumentos. De acordo com a reportagem, a Finasa concedeu o financiamento mediante a apresentação de uma carteira de identidade falsa.

Em novembro do ano passado, a mesma família foi vítima de outro caso. O advogado Maurício Saraiva recebeu a ligação de um homem que o chamou de "Pretinho". Ele tomou um susto, já que apenas sua mulher, Maria das Graças Rickli, o chamava assim. O homem, que se identificou como "consertador de celulares", disse que desconfiara da origem de um aparelho - que pertencia a Graça - quando ouviu seu suposto dono dizer a outra pessoa que recebera o celular de presente, no Rio, de alguém da Aeronáutica.

Olinda Malheiros, mãe de Thalita, vítima do acidente, disse que só recebeu parte dos bens da filha, que identificara por fotos exibidas em site da Gol. Segundo ela, foram devolvidos um secador, uma chapinha para alisar cabelo, um prendedor, um pé de chinelo, uma calça comprida e duas saias. Mas ela também reconheceu o celular, um alicate de cortar lacres e uma mala nunca devolvidos:

- Recebi cartões de crédito e documentos, mas a bolsa onde eles estavam e a carteira com dinheiro nunca apareceram. A máquina digital dela também sumiu.

Viúva vai entrar na Justiça contra Gol e FAB

A viúva Rosane Guthjar se prepara para entrar na Justiça contra a Aeronáutica e a Gol pelo desaparecimento de documentos e pertences de seu marido, Rolf Guthjar, morto no acidente. Ele foi uma das primeiras vítimas identificadas, mas ela só recebeu objetos e documentos do marido no fim de fevereiro, cinco meses depois. Embora ele levasse consigo muitos objetos pessoais, documentos e dinheiro, tudo numa maleta fechada a chave, ela só recebeu um celular, a carteira apenas com o CPF, o passaporte e um crachá da empresa do marido.

- O passaporte e o crachá estavam em perfeitas condições, sem umidade ou sujeira. Como o passaporte chegou intacto e o resto, que estava dentro da maleta, sumiu? - pergunta ela, intrigada. Salma Assad, tia do estudante de medicina Átila Assad, conta que nenhum dos documentos úteis dele foi devolvido à família.

- Como só uma carteirinha da escola e duas moedas foram devolvidas, se tudo estava na mesma carteira?

Em comunicado divulgado ontem, a Gol reiterou que só teve acesso aos pertences das vítimas depois que eles foram enviados pela Aeronáutica para o Distrito Federal.