Título: Excitantes e anestésicos
Autor: Cruvinel, Tereza
Fonte: O Globo, 08/08/2007, O Globo, p. 2

O deputado Ciro Gomes acha danosa ao país a forma como se discute, ou se rejeita, ou se aprecia, a estável popularidade do presidente Lula, mesmo quando falhas do governo deveriam alterá-la. Como agora, depois do acidente da TAM, seguido de agravamento do caos aéreo. Raivosa e excitada, a oposição limita-se a culpar o governo. Reconfortado pelas pesquisas, o governo tende a se acomodar. E assim, diz Ciro, problemas e soluções não são discutidos a sério. Não se chega a uma síntese.

Do lado do governo, pode haver os que se acomodam, fecham os olhos e atribuem todas as críticas à implicância da mídia e à frustração das oposição. Mas esta não é uma recomendação nem é a regra no governo, diz o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, comentando os estranhamentos causados pela pesquisa Datafolha em que, duas semanas depois do desastre de Congonhas, da comoção, de sua inevitável vinculação ao caos aéreo, expondo o governo como único culpado até que surgissem as causas determinantes, 48% dos entrevistados ainda o consideram bom e ótimo.

- Devemos ver tudo com muita calma, tantos os protestos e as críticas como os altos índices de aprovação. O governo tem falhas, não tira dez em tudo, temos consciência disso. Mas o governo também tem méritos, não é o descalabro, o trem descarrilhado a que é freqüentemente comparado. A maioria da população tem discernimento, sabe que alguns problemas vêm de muito tempo e não serão resolvidos no curto prazo. Falo da saúde, por exemplo, e mesmo da infra-estrutura aeroportuária, das estradas e outros gargalos de infra-estrutura, que não apareceram agora. Movimentos como o "Cansei" são legítimos, devemos respeitá-los. Mas a pesquisa mostra que a maioria da população pensa de outro modo, é menos imediatista na cobrança de soluções. Até porque, na vida destas pessoas, tudo é difícil e tudo demora. Elas não são mais complacentes, são mais realistas - diz o ministro.

E elas percebem com muita nitidez, acrescenta, as mudanças na economia real. O aumento da renda e do crédito, os preços estáveis e a maior chance de consumir.

O presidente do DEM, Rodrigo Maia, discorda, é claro, da caracterização de oposição raivosa, feita por Ciro. E acha que os dias mostrarão que a avaliação de Lula e do governo não é resistente e inalterável como sugere a primeira pesquisa após a tragédia. E, pela razão elementar de que a contaminação das opiniões leva algum tempo, descendo dos estratos sociais superiores para os inferiores.

- Nossas pesquisas mostram que existe, sim, uma importante corrosão na avaliação do governo. O ótimo/bom reduziu-se em 12 pontos percentuais no Nordeste e em 7 pontos percentuais no Sudeste. Perdas semelhantes ocorreram também no Sul. Nós também temos calma, vamos aguardar.

O ruim, diz Ciro, é que a espera, de um lado e de outro, venha acontecendo em ambiente de exaltação, beligerância e reducionismo dos problemas. Em tal ambiente, não se discute, não se chega a uma síntese, não se constrói qualquer consenso. E, nesta dança imóvel dos radicalismos recíprocos e dos ódios correntes, não se avança.