Título: Escândalo da mala derruba assessor
Autor: Figueiredo, Janaína
Fonte: O Globo, 10/08/2007, O Mundo, p. 30
Kirchner reage rápido a apreensão de dólares com venezuelano e tenta conter dano a campanha.
Em plena campanha eleitoral e com a primeira-dama argentina, Cristina Fernández de Kirchner, como grande favorita, o presidente Néstor Kirchner reagiu em tempo recorde para tentar evitar que um escândalo envolvendo funcionários do Ministério do Planejamento e um misterioso cidadão venezuelano, que sábado passado tentou entrar no país com US$790 mil, prejudique a imagem de seu governo e, sobretudo, de sua candidata à Presidência. Na noite de quarta-feira, horas depois de a Justiça ter confirmado que o interventor do Ente Regulador de Estradas, Claudio Uberti, estava no mesmo jatinho que transportou o venezuelano Guido Alejandro Antonini Wilson, portador da mala, o presidente argentino se reuniu com o poderoso ministro do Planejamento, Julio De Vido, e decidiu exigir o afastamento de Uberti. Ontem, o funcionário, considerado um dos principais negociadores dos acordos financeiros e energéticos entre Argentina e Venezuela, demitiu-se.
- Eu não escondo nada. Quando alguma coisa acontece, o povo deve saber - declarou o presidente, tentando virar o jogo e transformar um escândalo que ontem foi a notícia do dia em Buenos Aires e Caracas numa oportunidade de demonstrar o compromisso de seu governo com o combate à corrupção. - Não ponho as mãos no fogo por ninguém.
De Vido argumentou que Uberti cometeu o erro de trazer da Venezuela pessoas alheias à delegação oficial. O que o ministro, o presidente e seus colaboradores não explicaram foi por que o presidente da estatal petrolífera argentina Enarsa, Exequiel Espinoza, que fretou o avião, foi ratificado no cargo. A Enarsa afirmou que Wilson embarcou a pedido de representantes da Petróleos da Venezuela (PDVSA), que também estavam no avião que sábado partiu de Caracas para Buenos Aires, às vésperas da chegada de Chávez à Argentina. Segundo analistas, o comunicado - um dia após o presidente venezuelano deixar o país - foi a maneira achada por Kirchner de responsabilizar Caracas pelo escândalo.
- Houve abuso da boa fé dos funcionários argentinos por parte dos venezuelanos, que pediram que fosse trazida uma pessoa que tinha uma mala com tal quantia de dinheiro, sem que ninguém soubesse - acusou o chefe de gabinete, Alberto Fernández.
Para Venezuela houve conspiração
Representantes da oposição pediram ontem a renúncia do ministro De Vido, cujo ministério enfrenta, ainda, denúncias de suborno.
Na capital venezuelana, autoridades chavistas, mais uma vez, optaram pela teoria da conspiração. - Quando o presidente é recebido de braços abertos pelos governos sul-americanos, deve ser montado algum tipo de manobra, como dizer que esse senhor (Wilson) era parte da comitiva presidencial - afirmou o vice-presidente venezuelano, Jorge Rodríguez.
Terça-feira, quando foi informado sobre o assunto, Chávez negou qualquer vínculo com o portador da mala. No entanto, vários elementos vinculam o presidente venezuelano ao caso: em primeiro lugar, no mesmo avião que transportou Wilson estavam importantes funcionários da PDVSA; em segundo, durante um ato na Casa Rosada, segunda-feira, Chávez se referiu a Uberti como um negociador muito próximo a seu governo. Ao falar sobre um acordo com a Argentina para comercializar ônibus, comentou:
- Claudio (Uberti) me disse que no próximo dia 15 de agosto chegarão os ônibus à Venezuela.
A única crítica à atuação dos funcionários da PDVSA partiu do superintendente tributário e alfandegário da Venezuela, José Vielma Mora, que admitiu que "o incidente constitui um dano ao país". Enquanto Kirchner e Chávez tentam botar panos quentes no assunto, os US$790 mil estão num cofre do Banco de La Nación, no aeroporto internacional de Ezeiza. Para retirar o dinheiro, Wilson, acusado de contrabando de dinheiro, deveria pagar uma multa equivalente a 50% do montante retido pela Polícia Federal.