Título: À espera da tempestade
Autor:
Fonte: O Globo, 13/08/2007, Economia, p. 15

TREMOR GLOBAL

BCs europeus se articulam com mercado para enfrentar crise. Analistas esperam novas medidas

FRANKFURT, PARIS e NOVA YORK

Os bancos centrais da Europa se reuniram no fim de semana com altos executivos da área de finanças, segundo fontes, para avaliar as ameaças das hipotecas de alto risco (as chamadas subprime) americanas ao sistema financeiro e, possivelmente, traçar uma estratégia para enfrentar a crise. A volatilidade dos mercados deve continuar esta semana, afirmam analistas, e os BCs mundiais estão cercados de expectativas sobre novas intervenções. O BC japonês, logo na abertura dos mercados, injetou hoje US$5 bilhões no sistema financeiro.

Quinta e sexta-feira, os BCs de Ásia, Europa e EUA (Federal Reserve, o Fed) acalmaram um pouco os investidores ao injetar mais de US$300 bilhões nos mercados. A operação visava a minimizar a crise de liquidez resultante da exposição dos bancos às hipotecas subprime.

- O que vai conduzir os mercados? Subprime - disse Chip Hanlon, presidente da Delta Global Advisors. - A questão é se o Fed deixará (o mercado) seguir seu curso ou se virá em seu socorro.

O jornal britânico "Financial Times" afirmou ontem em seu site que o Banco Central Europeu (BCE) estaria estudando uma troca de moeda com o Fed, que lhe permitiria emprestar dólares a bancos da Europa. Nos próximos dias, vencem vários empréstimos, e os bancos americanos não pretendem estender os prazos de pagamento, já que as instituições européias também estão expostas ao subprime. Em entrevista ao jornal "Ouest France", o presidente do BCE, Jean-Claude Trichet, disse apenas que o banco continua atento ao comportamento dos mercados.

Fed: "dilema moral" para reduzir juros

Hoje será o teste dos mercados, após a intervenção da semana passada. Mesmo que tudo corra bem, analistas esperam um longo período de volatilidade. Enquanto Ira Jersey, estrategista de crédito do Credit Suisse, prevê que a turbulência vá até setembro, o economista-chefe da Moody"s, José Alfredo Coutino, acredita que ela vai se arrastar até o fim do ano, ou até meados de 2008. Ele alerta para a forte deterioração da qualidade do crédito imobiliário.

- O segmento de hipotecas subprime terá um forte reajuste, e já se prevê que 10% dos mutuários desse tipo vão perder seus imóveis até meados de 2008, quando hoje essa taxa está em 4%. É uma crise forte, e ainda não se sabe o tamanho do buraco - disse Coutino ao GLOBO. - Se a deterioração da qualidade do crédito continuar, o Fed, assim como o BCE, será instado a intervir muitas vezes.

Nos EUA, o calote nas hipotecas subprime, devido à altas dos juros, já elevou as taxas nos financiamentos imobiliários e derrubou as vendas de imóveis. Como as financiadoras vendiam títulos lastreados nos créditos a receber de hipotecas, elas não puderam honrar seus compromissos, daí a contaminação. Para o analista da Moody"s, o debate da semana vai girar em torno de medidas preventivas para evitar uma turbulência ainda maior.

Há quem especule sobre a hipótese de o Fed cortar os juros antes de sua próxima reunião, em setembro.

- Se a situação do crédito piorar, o Fed poderia cortar os juros esta semana. O Fed vai olhar para outras crises, como a do 11 de Setembro - disse à CNN David Kelly, assessor sênior da Putnam Investments. - Espero que o Fed não tenha de reagir, mas, se o fizer, será por causa dos mercados. A histeria é perigosa.

Outros analistas vêem um "dilema moral" na redução dos juros. Jan Hatzius, economista-chefe para os EUA do Goldman Sachs, disse ao jornal "International Herald Tribune" que alguns investidores fizeram operações arriscadas e estão sendo punidos agora. Se os juros forem reduzidos, a punição será menor.

A ansiedade dos investidores se deve a não saber o volume das perdas ligadas ao subprime. Isso deve persistir até a certeza de que nenhum banco ou fundo está perto de um colapso.

- A incerteza se transformou em pânico, e ficamos muito perto de uma crise de liquidez autopromovida - disse Marco Annunziata, economista-chefe do Unicredit Markets.

Ontem foi revelado que o banco francês BNP Paribas - que suspendeu saques em três fundos quinta-feira - e os alemães Deutsche Bank e Commerzbank estão entre os credores da financeira americana HomeBanc, que pediu concordata na sexta-feira.

COLABOROU Marília Martins, correspondente