Título: Um 'trem da alegria' a caminho
Autor: Braga, Isabel
Fonte: O Globo, 14/08/2007, O País, p. 3

Chinaglia anuncia que porá em votação emendas que beneficiam 310 mil servidores.

Opresidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), anunciou ontem que vai pôr na pauta de votação do plenário um polêmico projeto que tramita há oito anos e pode se transformar num grande "trem da alegria", beneficiando servidores não-concursados, trabalhadores temporários no serviço público e até funcionários requisitados de outros órgãos. Cálculos feitos por técnicos do Congresso revelam que as medidas, se aprovadas, poderão beneficiar cerca de 310 mil pessoas.

Chinaglia afirmou que vários líderes estão defendendo a inclusão, na pauta, da emenda constitucional 54, de 1999, que garante estabilidade a servidores da administração direta e indireta admitidos sem concurso público antes da Constituição de 1988. Há pressão para que sejam aprovadas, no rastro dessa emenda, duas outras propostas polêmicas: a efetivação de trabalhadores que têm contrato temporário e estão há mais de dez anos no cargo e a polêmica emenda 2/2003, do deputado Gonzaga Patriota, que efetiva no local de destino funcionários requisitados de outros órgãos.

- Tenho a exata dimensão de que ela tem conteúdo, no mínimo, polêmico. O problema é que a Câmara não pode ficar sem deliberar. Eles (servidores e parlamentares que pressionam pela aprovação) estão nos corredores há três, quatro anos, e isso (não votar) é até desumano. A Câmara tem que dar uma resposta, qualquer que seja ela - afirmou Chinaglia.

A emenda 54 dá estabilidade aos que entraram no serviço público entre 5 de outubro de 1983 e 5 de outubro de 1988, quando foi promulgada a Constituição, e esse grupo ficou de fora. Estende ainda o benefício da estabilidade aos que foram contratados por empresas estatais até 1991. Como a partir daí consolidou-se a exigência de concurso, há pressão para que esses funcionários sejam demitidos.

"Temos que reconhecer o erro"

Quando foi promulgada, a Constituição efetivou sem concurso todos os que estavam há mais de cinco anos no cargo. Ficaram de fora os que entraram entre 83 e 88. Em 1999 estavam nessa situação 120 mil funcionários, mas muitos se aposentaram, e hoje os beneficiados são cerca de 60 mil.

No dia 10 de julho passado, a emenda 54 ganhou um adendo: o deputado Zenaldo Coutinho (PSDB-PA) apresentou emenda ampliando a estabilidade no serviço público aos contratados de forma temporária por prefeituras, estados e pela União. Para ter direito a ser efetivado, sem concurso público, a pessoa tem que estar como temporária no cargo há pelo menos dez anos, contados da data da promulgação da emenda. A estimativa é de que estejam nessa situação pelo menos 230 mil funcionários. Zenaldo rebate a acusação de que seria um trem da alegria:

- Seria trem da alegria se fosse uma situação nova. Temos que reconhecer o erro de manter, sob o contrato temporário, servidores por mais de 10, 15 anos. É uma anomalia, e é preciso dar solução.

O tucano explicou que só no Pará são 20 mil pessoas trabalhando há mais de dez anos como temporários. Em São Paulo seriam em torno de 120 mil. Segundo ele, vários governadores apóiam sua emenda:

- São pessoas que pagam à Previdência, mas que, se forem demitidas, não têm direito a indenização. Os governos precisam de seu trabalho. A estabilidade não gera gastos.

Outro lobby que tenta carona na emenda 54 é o dos requisitados. A 2/2003, anexada à anterior, permite que o servidor requisitado opte por virar efetivo do órgão de destino. Basta que esteja há três anos consecutivos no lugar para o qual foi cedido.

Nesse caso, os servidores chegaram a prestar concurso. Por exemplo, uma pessoa que passou em concurso de uma prefeitura, mas foi requisitada para trabalhar na Câmara, será efetivada como servidor da Casa. Essa medida pode beneficiar 20 mil funcionários, muitos na Câmara, onde a pressão sobre os deputados é grande.