Título: Supersimples: 450 mil empresas podem perder
Autor: Batista, Henrique Gomes e D'Ercole, Ronaldo
Fonte: O Globo, 15/08/2007, Economia, p. 28

Carga tributária aumentará para prestadoras que gastam menos de 40% do faturamento com pessoal, entre outros casos.

BRASÍLIA e SÃO PAULO. A cinco dias do fim do novo prazo para adesão ao Simples Nacional, o Sebrae estima que 10% dos cerca de 4,5 milhões de pequenas e microempresas do Brasil - faturamento anual de até R$2,4 milhões - podem vir a ter prejuízo ao pagar impostos pelo regime tributário unificado, que inclui tributos federais, ICMS e ISS - o chamado Supersimples. Para evitar armadilhas que levarão a aumento da carga tributária, a recomendação é fazer um estudo detalhado caso a caso. O prazo para pedir a exclusão do sistema também vence no dia 20.

O Supersimples pode ser uma escolha ruim para empresas que se encaixam em três situações principais: prestadoras de serviço (como empresas de informática, contabilidade, academias e vigilância) com gastos com pessoal inferiores a 40% do faturamento; empresas que vendem para indústrias, que não poderão abater crédito do ICMS; e firmas muito pequenas que ainda não têm garantia de que o governo estadual vai refazer a legislação para manter a isenção do ICMS. Sem a isenção, elas terão aumento de custos.

- A lei é benéfica para, no mínimo, 80% das micro e pequenas empresas. Outras 10% teriam problemas, mas eles foram sanados na semana passada pelo Congresso em uma lei que deve ser sancionada amanhã (hoje). Outras 10% têm que analisar com calma, utilizando, inclusive, os simuladores presentes em sites dos Sebraes estaduais e da própria Receita Federal - afirmou Alessandro Machado, consultor da área de políticas públicas do Sebrae Nacional.

Esse é o caso do contador José Bonifácio Mariano da Silva, que toca, com a filha, um pequeno escritório de contabilidade na cidade satélite de São Sebastião, no Distrito Federal. Depois de muitos cálculos, ele chegou à conclusão de que a carga tributária subiria 20% em relação ao que paga hoje. Motivo principal: ele nem de longe gasta mais de 40% do faturamento com folha de pagamentos. Se esse patamar fosse atingido, e ele entrasse no Supersimples, teria redução de cerca de 50% nos impostos:

- Tinha pensado em aderir ao Supersimples, estou indicando isso aos meus clientes, mas, ao fazer as contas, percebi que seria ruim para mim.

Sindicato quer esclarecer pontos pouco claros

Além disso, as empresas que mais precisam de apoio - as micro, com faturamento de até R$240 mil por ano - podem sofrer grandes aumentos. Isso porque, segundo Carlos Roberto Victorino, diretor técnico da Victon Contabilidade e também da Federação Nacional das Empresas de Serviços Contábeis e das Empresas de Assessoramento, Perícias, Informações e Pesquisas (Fenacon), somente o Paraná revalidou os benefícios fiscais anteriormente existentes:

- Sem essas renovações, eles passam de um momento em que não pagam nada de ICMS para uma alíquota de 1,25%, elevada para uma empresa tão pequena - disse, lembrando que a alteração pode transformar uma proposta de redução de impostos de 26,67% em alta de 6,67% (caso do Rio Grande do Sul).

Novos problemas são descobertos a cada dia. Ontem, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, confirmou que há casos de aumento de carga tributária, e que eles serão objeto de melhoria, segundo o presidente do Sindicato da Micro e Pequena Indústria do Estado de São Paulo (Simpi), Joseph Couri. Ele explica que o Supersimples acaba com a possibilidade de compensação do PIS/Cofins para as empresas que adquirem os produtos das micro e pequenas:

- O ministro me garantiu que vai buscar uma solução. Ele pediu ao secretário da Receita Federal (Jorge Rachid), imediatamente, para ver se pode ser por medida provisória, lei ordinária ou lei complementar. Se a solução não sair, as empresas poderão ser obrigadas a conceder descontos de 9,5% em seus produtos ou perder mercado.

Além disso, o Simpi quer esclarecer outros pontos, como a proibição para que sócios, administradores ou equivalentes de uma empresa façam parte de firma optante do Supersimples. Couri também pediu ao ministro clareza para saber se as firmas que recebem benefícios culturais podem estar no sistema tributário.

Edson Carvalho, da Directa Auditores, lembra que há necessidade de outras análises. Segundo ele, por exemplo, o Supersimples pode ser ruim para empresas com lucro muito baixo ou prejuízo, pois o tributo incide sobre o faturamento, não sobre o resultado.

- Não dá para fazer uma análise simples do Supersimples. É preciso levar em conta diversos fatores - disse.

Nas próximas discussões, pode ser retomado ainda o debate sobre a inclusão no regime unificado das empresas personalíssimas (profissionais liberais que atuam como pessoa jurídica), de que trata a Emenda 3. A tramitação da regulamentação da atuação das firmas com essas características está parada na Câmara, e essas pessoas jurídicas foram excluídas do Supersimples.

- O momento é de implementar o Supersimples e de dar um formato final às empresas personalíssimas. Qualquer alteração ficará para outro momento - afirmou Milton Monti (PR-SP), relator do projeto da Emenda 3.

Dono de oficinas teve seus impostos reduzidos

O empresário Vicente Aparício, dono da AT Transportes e Serviços, com sede em Santos, recolhia os tributos federais pelo Simples até o mês passado, mas não deve aderir ao Supersimples. A razão é que a carga de tributos da empresa, que fatura menos de R$2,4 milhões e se enquadraria no novo regime, passaria de algo entre 7% e 8,4%, para cerca de 30% das receitas.

Pelas novas regras, sua empresa não poderá mais realizar a substituição tributária do ICMS, e terá de arcar com despesas com o INSS.

- A compensação tributária do ICMS é importante para o nosso ramo, e com o Supersimples ainda teremos de recolher o INSS patronal, que não pagávamos pelo Simples - queixa-se Aparício.

Luciana Ribeiro, diretora da Zlot, consultoria contábil que atende a AT Transportes, explica que as despesas com contribuição previdenciária, de que a empresa era isenta, passarão a 22% da folha.

Caso o Congresso não modifique o Supersimples, restará à AT Transportes migrar para o regime de lucro presumido, cuja carga é quase duas vezes maior que a do Simples antigo, mas ainda assim bem menor que a do novo regime.

Eduardo Vaz, dono de duas oficinas mecânicas em São Paulo, vive situação oposta. Com a mudança, suas duas empresas - a Auto Palace, que fatura R$1,1 milhão ao ano, e a Ferbes Reis, R$1,4 milhão - saíram do Simples e foram compulsoriamente enquadradas no Supersimples. A carga de tributos, que girava em torno dos 18% do faturamento, diminuiu três pontos percentuais este mês.