Título: Diferenças no trabalho doméstico começam a se desenhar na infância
Autor: Almeida, Cássia
Fonte: O Globo, 18/08/2007, Economia, p. 30

DESIGUALDADE DENTRO DE CASA: Subordinação se repete no casamento, diz socióloga.

Meninas chegam a dedicar à família seis horas a mais do que os meninos.

A desigual distribuição dos trabalhos domésticos entre homens e mulheres começa a se delinear já na infância. O peso dos afazeres recai mais sobre as meninas, de acordo com estudo do IBGE. Nesse cruzamento de dados com base nas informações da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) na população entre 10 e 17 anos, a diferença já aparece: enquanto 82,6% das meninas nessa faixa etária ajudam nas tarefas da casa, somente 47,4% dos meninos se dedicam a esse trabalho caseiro:

- Há uma construção cultural de que cabe às meninas essas atividades. Mesmo com carga maior, elas têm rendimento escolar melhor, fazem mais tarefas domésticas e, mesmo quando estão no mercado de trabalho, a carga de serviço é maior que a dos meninos (oito horas semanais para os meninos ocupados e 14,1 horas para meninas também trabalhadoras) - diz Cristiane Soares, autora do estudo.

Renda mais baixa, mais trabalho dentro de casa

Segundo a socióloga Elisabete Dória Bilac, do Núcleo de Estudos de População da Unicamp, as meninas desde pequenas são ensinadas a assumir esse papel. Essa desigualdade já na infância acaba se reproduzindo na vida adulta:

- A socialização por gênero começa a ser criada cedo. A menina brinca de boneca e só ela ajuda a mãe nas tarefas domésticas. Essa situação de subordinação vai se refletir no casamento - diz Elisabete.

A estudiosa dessas questões de gênero, porém, não acredita que o movimento dos homens trabalharem mais em casa vai parar.

- Isso está mudando, lentamente, mas está. Conforme a mulher conquista mais autonomia, reivindica divisão mais igualitária nesse cuidado com a família e a casa.

Essa conscientização maior, no entanto, está mais restrita aos mais escolarizados e ricos. Ficou constatado na pesquisa que, nas famílias onde a renda domiciliar per capita é de até um salário mínimo, os afazeres domésticos ocupam mais tempo no dia das mulheres. Elas trabalham 33,2 horas por semana no cuidado dos filhos e da casa. Já nos domicílios em que o ganho per capita supera os três mínimos, a carga cai para 26,5 horas.

Mesmo nas famílias de renda mais baixa, o trabalho masculino é quase a metade do feminino. Nas famílias com ganhos inferiores a um mínimo, os homens trabalham 10,4 horas semanais.

A socióloga da Unicamp lembra que as diferenças de rendimentos entre os sexos nas faixas mais baixas de renda são menores. E vão crescendo conforme aumenta a escolaridade e a renda:

- Porém, entre os mais pobres, as mulheres trabalham mais em casa, mesmo contribuindo com parcela semelhante na renda familiar. Essas mulheres reivindicam menos e o machismo é maior.