Título: Acusados agora agem como baixo clero
Autor: Lima, Maria
Fonte: O Globo, 19/08/2007, O País, p. 8
João Paulo e Genoino, na Câmara, se negam a falar sobre a vida pós-crise.
BRASÍLIA. Sóbrios, discretos, humildes, gentis. Essas são palavras que definem hoje a postura, em público, dos petistas denunciados pelo Ministério Público no caso do mensalão e que conseguiram um novo mandato. Embora estejam sempre presentes nas comissões e no plenário, evitam os microfones e a imprensa. Cardeais da política num passado recente, hoje agem, publicamente, como deputados do baixo clero. Atuam nos bastidores.
Perguntados sobre a expectativa em relação à decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a denúncia do Ministério Público, tanto o ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (SP) como o ex-presidente do PT José Genoino (SP) avisaram que não dariam qualquer declaração. Não aceitaram falar também sobre as mudanças em suas vidas pós-crise, nem sobre o novo mandato. Como um mantra, de forma humilde, repetiam frases semelhantes:
- Não falo nada. Quem fala sobre esse assunto é o meu advogado.
Embora prefiram não tocar no assunto com a imprensa, em conversas reservadas confessam a ansiedade em relação à decisão do STF. Referem-se ao fato como a volta de uma artilharia pesada, sem trégua e sem direito a defesa. Aos amigos, Genoino justifica o silêncio alegando que já há uma condenação prévia de parte da classe média e da imprensa.
O líder do PT, Luiz Sérgio (RJ), que acompanha a angústia desses petistas, afirma que, apesar da ansiedade natural, eles estão tranqüilos:
- Há uma tranqüilidade sobre o que poderão ou não enfrentar. E o sentimento é o de consciência tranqüila: o mensalão não existiu enquanto mensalão. A lógica de uma quadrilha organizada não corresponde à verdade.
O Genoino que retornou à Câmara, pós-crise, é outra pessoa: menos efusiva, mais arredia. Nem de longe lembra o constituinte atuante e o deputado falante que não perdia uma chance de usar os microfones várias vezes durante as sessões. Hoje, não participa de debates acalorados, mas transita com naturalidade e conversa com os deputados de todos os partidos.
Muitas das conversas giram em torno dos livros que lançou após o episódio: "Entre o sonho e o poder", um depoimento, e "José Genoino - escolhas políticas", que conta sua história desde a militância política durante a ditadura à atuação como parlamentar. Nesta legislatura, tenta resgatar a veia regimentalista, que sempre o destacou, e usa a tribuna da Comissão de Constituição e Justiça para essa finalidade.
João Paulo, que ocupou por dois anos a cadeira de presidente da Câmara e sonhava galgar postos mais altos na vida política, nesta legislatura senta-se nas cadeiras laterais do plenário. Conversa com colegas, mas aparenta menos naturalidade. Quase nunca usa os microfones. Segundo os petistas, trabalha nos bastidores. Articulou a campanha para a eleição de Arlindo Chinaglia (PT-SP) à presidência e também atuou no debate sobre reforma política.
João Paulo tem bom trânsito na bancada petista e mantém relacionamento mais próximo com antigos colegas, como os também denunciados Paulo Rocha (PA) e José Mentor (SP) e o mineiro Virgílio Guimarães. O mensalão é tema evitado em reuniões formais.