Título: Tremor arrasa agricultura
Autor: Galhardo, Ricardo
Fonte: O Globo, 21/08/2007, O Mundo, p. 26

Principal região exportadora do país perde 60% da força de trabalho e a safra deste ano.

Pelo menos 34 mil moradores da zona rural de Ica, uma das cidades afetadas pelo terremoto no Peru, perderam suas casas. A informação é do ministro da Agricultura peruano, Israel Benavides. Com isso, cerca de 60% dos agricultores da principal região exportadora de produtos agrícolas do país estão impossibilitados de trabalhar. Segundo a Associação de Agricultores de Ica, o prejuízo imediato é de aproximadamente US$4 milhões. Cerca de 700 hectares de aspargos, a principal cultura da região, se perderam com o terremoto devido à falta de mão-de-obra, de irrigação (a região desértica é regada por bombas movidas a energia elétrica) e às fissuras no solo. O tremor surpreendeu os produtores justamente na época da colheita dos aspargos.

- Ainda é cedo para estimarmos o total das perdas mas estamos fazendo o possível para restabelecer a produção. A irrigação foi normalizada mas 34 mil pessoas estão impossibilitadas de trabalhar -- disse Benavides.

Segundo ele, o governo estuda medidas para dar condições aos desabrigados da zona rural de voltarem ao trabalho.

- Vamos liberar em curto prazo US$2 mil para cada família reconstruir sua moradia -- informou o ministro.

A produção de aspargos responde por quase 60% das exportações de Ica e no ano passado movimentou US$100 milhões. Outras importantes fontes de renda da região também sofreram danos como a produção do pisco, a bebida nacional que leva o nome da cidade devastada pelo terremoto.

- Da noite para o dia perdi toda a bebida que estava nos tonéis. O sismo derramou tudo pelo chão - lamentou Gabriel Gaviria, produtor de pisco na região de Ica, que estima ter perdido US$100 mil com o terremoto.

Frio castiga país e mata 70 crianças

Para os pequenos produtores que trabalham em culturas de subsistência a situação é mais dramática.

- Perdi tudo. Não tenho meios para plantar a próxima safra. O governo precisa pensar em um plano para que voltemos a produzir-- disse Santo Guarica, que sobrevivia com uma renda mensal de US$200 proveniente de uma pequena plantação de alfafa no povoado de Pampa de Ocas, a 11 km de Pisco.

Se para a economia os danos causados pela tragédia trazem perspectivas pessimistas, para os trabalhadores que perderam suas casas, pertences e fonte de renda, o impacto é imediato. Enquanto cerca de 200 mil pessoas lutam diariamente para conseguir um prato de comida, os que têm algo a oferecer aproveitam para lucrar com a desgraça. Os preços de alimentos triplicaram nos últimos cinco dias. Um quilo de açúcar subiu de dois para sete soles, o arroz, que custava 1,5 agora vale cinco soles. Os efeitos do aumento repentino dos preços pode ser sentido até em Lima. As empresas de ônibus aumentaram os preços das passagens em 50%.

Para o comerciante Julio Suarez, dono de um pequeno mercado em Chincha, o aumento dos preços é natural.

-- É a lei da oferta e da procura. Os outros comerciantes nem sequer abriram as portas com medo de saques. Decidi correr o risco e tenho o direito de ganhar algo com isso. Se acham caro, que não comprem - disse ele.

Em Ica, um tremor secundário de 5,9 graus na escala Richter causou a morte de um menino de 5 anos, soterrado pela parede de uma casa. Após o terremoto, o Peru enfrenta uma das maiores ondas de frio das últimas décadas. Pelo menos 70 crianças morreram em todo o país e cerca de 600 mil apresentaram problemas respiratórios.