Título: PF: negócio entre Renan e locadora é suspeito
Autor: Lima, Maria e Carvalho, Jailton de
Fonte: O Globo, 23/08/2007, O País, p. 10

Para peritos, presidente do Senado pode ser sócio oculto de empresa, que tem contratos com governo de Alagoas.

BRASÍLIA. A decisão do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), de incluir um contrato de empréstimo de R$178,1 mil com a Costa Dourada Veículos, locadora de carros de Maceió, entre suas fontes de renda pode complicar sua situação. Laudo do Instituto Nacional de Criminalística (INC), da Polícia Federal, põe sob suspeita o negócio e a relação da empresa com o governo de Alagoas. Um dos sócios da locadora é o empresário Ildefonso Antonio Tito Uchôa Lopes, suspeito de ser laranja do primo Renan em duas emissoras de rádio e um jornal.

Os indícios de irregularidades são tão veementes que os peritos excluíram o suposto empréstimo da lista de fontes de renda de Renan. O negócio não foi declarado à Receita Federal nem consta em registro de cartório. O laudo informa que seis órgãos do governo local, entre eles quatro secretarias estaduais, têm contratos com a Costa Dourada. O Tribunal de Contas do Estado e a prefeitura de Barra de São Miguel estão entre os clientes da empresa. "(...) Foi identificado que parte significativa das receitas de locadora de veículos eram provenientes de entes públicos", alerta o laudo.

"Essa história está muito mal contada", diz Casagrande

Para a perícia, o Conselho deve esclarecer quais os vínculos entre Renan, a empresa e os contratos com órgãos públicos. Isto porque parte dos pagamentos à locadora foram feitos em dinheiro vivo e não por ordem bancária, norma na administração pública.

- Essa história está muito mal contada. E, ainda por cima, reaparece em cena esse Tito Uchôa - afirmou o senador Renato Casagrande (PSB-ES), um dos três relatores do processo.

O laudo cita depósito de R$57 mil que o Departamento de Estradas de Rodagem fez numa conta da Dourada na CEF, em 7 de junho de 2004. Procurado pelo GLOBO, o diretor financeiro do DER, Sandro Fernandes, disse não lembrar do contrato. Ele disse que verificaria os arquivos e hoje daria uma resposta. Mas reconheceu ser incomum fazer pagamentos em espécie:

- Todo e qualquer pagamento tem que ser feito por ordem bancária.

Renan enviou cópia do suposto empréstimo ao INC na última sexta-feira, quando os peritos concluíam o laudo. Ele alega ter recebido R$87,8 mil da locadora em 2004, e R$99,3 mil, em 2005. O primeiro empréstimo, repassado em 19 parcelas ao longo de 2004, aproxima-se dos R$100 mil que teriam sido distribuídos entre os sócios da empresa naquele ano. O segundo empréstimo, R$99,3 mil repassados em 24 parcelas ao longo de 2005, foi superior ao lucro declarado da empresa no ano, R$71,4 mil. Com isso, Tito Uchôa e sua mulher, Bianca Lins Uchôa, que aparece como sócia da Costa Dourada, não receberam pro-labore e nem a divisão dos lucros da empresa.

Perícia: informações justificam nova investigação

Os peritos estranharam: "Passados mais de três anos das primeiras retiradas, não há registro de amortizações parciais dos recursos", avisa o laudo. Como suposto compromisso para quitar a dívida, Renan apresentou duas promissórias, uma no valor de R$214,8 mil e outra de R$294,5 mil. A primeira nota já está vencida desde 31 de março. A segunda vence em 31 de outubro.

Os peritos consideraram ainda mais inexplicável os valores das notas promissórias. Somadas, as duas notas chegam a R$509,4 mil, um valor superior ao empréstimo original de R$178,1 mil. Os peritos suspeitam que os repasses mensais têm mais características de retiradas (de um sócio, por exemplo) que de um verdadeiro empréstimo. Para a perícia, as informações justificariam uma investigação específica para saber se Renan seria sócio oculto da locadora.