Título: Comunista, China já reproduziu 106 bilionários
Autor: Scofield Jr., Gilberto
Fonte: O Globo, 21/09/2008, Economia, p. 39
Imóveis e ações na bolsa multiplicaram riquezas no país. Número de super-ricos era de apenas 15 em 2006
Gilberto Scofield Jr.
PEQUIM. Em 2002, quando a China já cativava o Ocidente como a potência emergente asiática do novo milênio, o país ainda não tinha um só bilionário sequer. Ser rico, como disse o reformador Deng Xiaoping nos anos 80, já podia ser considerado glorioso, o que não significava que uma cultura de super-ricos era algo palpável. Quatro anos depois, em 2006, a lista de bilionários chineses já tinha 15 pessoas, segundo o pesquisador inglês Rupert Hoogewerf, que há anos monta a lista dos mais ricos na China ¿ o Hurun Report ¿ com base não apenas em empresas listadas em bolsa, mas também em negócios particulares. Em 2007, este número havia subido para espantosas 106 pessoas. Os EUA, por exemplo, têm 415 bilionários.
É certo que muito da emergência destes bilionários da China se deveu à valorização espantosa das bolsas de valores chinesas nos últimos anos e à disparada nos preços dos imóveis no país ¿ dois fatores que vão puxar para baixo estas fortunas daqui para a frente, mas o fato é que a lista com nomes desconhecidos por ocidentais mostra uma nova face do enriquecimento chinês.
¿ A primeira leva de milionários chineses foi forjada nos anos 90 num ambiente de abertura recente e grande controle, portanto, numa economia pouco regulamentada e com leis pouco claras. Ali, valiam mais as conexões com o PCC do que a natureza do negócio em si ¿ conta Hoogewerf, que começou a compilar a lista em 1999 para a Forbes e acabou criando sua própria lista a partir de 2003. ¿ Agora, a China exibe uma leva de empreendedores de fato, gente que fez fortuna a partir de negócios concretos e do boom dos mercados financeiros ou com o auxílio de dinheiro de empresas de capital de risco.
Chinesa de 26 anos lidera o `ranking¿
De fato. Há pouco mais de 10 anos, fortunas foram construídas com privatizações nebulosas de estatais locais ou com a criação de empresas cujos donos se beneficiavam largamente de contatos com o governo central. Na virada do milênio, já se podia vislumbrar os primeiros ricos-empreendedores de fato, pessoas que fizeram crescer pequenas lojas de varejo transformando-as em redes, donos de restaurante que viraram franquias, gênios da internet que apostaram na rede primeiro e empresários que montaram impérios industriais de fábricas de fundo de quintal.
¿ Com exceção dos empresários de internet, os novos ricos subiram na pirâmide acumulando poupança de suas empresas, reinvestindo lucros, profissionalizando suas administrações ¿ diz Hoogewerf. ¿ É certo que, no início, sem fontes estáveis de crédito, a saída encontrada por muitos para crescer foi deixar de pagar impostos, o que só costumava ser regularizado quando a empresa ganhava porte. Também ainda se desenvolvendo, a Receita chinesa concordava com um acerto em que o pagamento futuro e constante de imposto era fixado em troca do perdão de parte da dívida. Nascia o empresário.
Na lista de 2007, os dois primeiros lugares são ocupados por mulheres. O primeiro lugar, com uma fortuna pessoal de US$17,5 bilhões, está Yang Huiyan, de 26 anos, em cujo nome está o controle da empresa de empreendimento imobiliário Country Gardens montada pelo pai, Yang Guoqiang, nos anos 90. Yang comprou terras no Sul da China no piso dos preços, de olho no desenvolvimento das zonas especiais econômicas de Xiaoping. Ali, começou a fortuna construindo moradia para classe média e revendendo terrenos para empreendimentos industriais pelo triplo do preço.
Profissionalização estimula empreendedorismo
O segundo lugar é de Zhang Yin, dona da empresa de reciclagem de papel Nine Dragons, com fortuna de US$10 bilhões. Os negócios de Zhang começaram com uma idéia simples: a Nine Dragon importa lixo de papel dos EUA, recicla o material na China transformando-o em papelão e embalagens para produtos variados, que são usadas por indústrias chinesas ou reexportadas para os EUA.
Alguns nomes, ainda que desconhecidos do público em geral, são empreendedores bem famosos em seus setores específicos. É o caso de Peng Xiaofeng, sexto na lista dos super-ricos, com US$5,3 bilhões, dono da LDK Solar, um dos pioneiros na fabricação de painéis de captação de energia solar e hoje o maior fabricante do produto no mundo.
¿ A profissionalização da economia chinesa traz desafios, como a busca de mais transparência, mas também abre oportunidades e serve de estímulo a outros empreendedores. A emergência do empreendedorismo na China está apenas começando ¿ diz.
oglobo.com.br/economia