Título: A História julgará
Autor: Barreto, Fábio M.
Fonte: O Globo, 21/09/2008, O Mundo, p. 43

Nos últimos 150 anos, a maior parte dos presidentes americanos que enfrentaram uma guerra tomou posse sabendo que a guerra era algo gigantesco. Nem tanto George W. Bush. Nem tanto a guerra ao terror. Os ataques de 11 de Setembro chegaram de forma inesperada.

Na verdade as três campanhas presidenciais entre a queda do Muro de Berlim e o 11 de setembro de 2001 foram as mais destituídas de debate sobre a política externa no século XX. A questão do comandante-em-chefe que hoje domina as campanhas quase não aparecia.

Quando pedi ao presidente Bush que refletisse sobre isso, ele voltou a 2001, lembrando-se sobre o que esperava que sua Presidência tratasse: reforma educacional, corte de impostos e transformação das Forças Armadas de uma estrutura da Guerra Fria em uma força mais móvel adaptada a conflitos de menor escala no século XXI.

Mas ele se tornou um presidente de tempos de guerra. E é assim que a História irá lembrar dele e julgá-lo.

Muitos livros já se adiantaram. O de Bob Woodward descreve o comandante-em- chefe como alguém incomumente distante e destacado. Um biógrafo mais favorável chamaria de equânime.

Na hora em que passei com ele, essa equanimidade estava em evidência ¿ numa calma e confiança em sua eventual defesa histórica.

Foi precisamente essa qualidade que lhe permitiu ordenar o aumento de tropas no Iraque diante da intensa oposição de ambos os partidos, militares e opinião pública. Esse tipo de decisão requer força interna. Alguns argumentam que foi confiança demais em seu senso interior que nos levou ao Iraque. Mas Bush não estava sozinho. Tinha a opinião pública e o Congresso com ele. E a História ainda não deu seu veredicto sobre o Iraque.

Quando perguntei sobre o sucesso em manter-nos a salvo por sete anos, foi rápido em dar o crédito a soldados que mantêm o inimigo distante e a funcionários aumentando a defesa em casa. Mas aludiu também a medidas tomadas, incluindo ¿ouvir inimigos¿. O que o presidente destacou com algum orgulho foi que, além de evitar um segundo ataque, deixa a seu sucessor poderes e instituições que este precisará para prevenir outros atentados.

Nesse aspecto, Bush se parece com Truman que desenvolveu novas ferramentas de guerra para uma nova era (o Departamento de Defesa, a CIA), expandiu os poderes da Presidência, estabeleceu uma nova doutrina para intervenção no exterior e entrou numa guerra (Coréia) impopular. Deixou o governo impopular. A História reviu o veredicto. Tenho poucas dúvidas de que Bush será objeto de reconsideração similar.

CHARLES KRAUTHAMMER é colunista do Washington Post