Título: Na escola, sem saber o bê-á-bá
Autor: Weber, Demétrio
Fonte: O Globo, 25/09/2008, O País, p. 3
RETRATOS DO BRASIL
Segundo IBGE, Brasil tem 2,1 milhões de alunos entre 7 e 14 anos que são analfabetos
Demétrio Weber
OBrasil tem 2,4 milhões de analfabetos com idade entre 7 e 14 anos, dos quais 2,1 milhões (87,2%) freqüentavam a escola no ano passado. A estimativa faz parte da Síntese de Indicadores Sociais do IBGE, divulgada ontem. Entre as crianças de 7 anos, 29% não sabiam ler e escrever, embora 90,8% delas fossem estudantes. No Nordeste, o percentual de jovens e crianças iletrados atingia impressionantes 44% da população nessa idade. No Norte, 39,6%.
O IBGE divulgou também o índice de analfabetismo na faixa dos 8 aos 14 anos: 5,4%. Mais uma vez, a presença de estudantes era majoritária. Do 1,3 milhão de analfabetos no grupo, 1,1 milhão (84,5%) estão na escola.
O analfabetismo entre crianças de 8 a 14 anos pode ser ainda mais preocupante, segundo especialistas. Isso porque desconsidera a população de 7 anos, que teoricamente estaria na 1ª série do ensino fundamental (2º ano, onde o fundamental dura nove anos), ainda em fase de alfabetização.
- Não dá para imaginar que quase 30% (das crianças de 7 anos) tenham aprendizagem mais lenta. Acima dos 8 anos, é um absurdo. Mesmo com ritmo lento, a expectativa é que o aluno se alfabetize no segundo ano de escola - diz o coordenador de pós-graduação da Faculdade de Educação da USP, Romualdo Portela de Oliveira.
A síntese usa dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad-2007), feita em setembro de 2007. Portanto, o analfabetismo foi constatado mesmo nos meses finais do ano letivo. Das crianças de 8 anos, 14,1% permaneciam analfabetas, apesar de 92,4% delas estarem na escola. No Nordeste, o índice atingia 26,8%, contra 5,4% no Sul.
Aos 10 anos, 5,2% são iletrados
Os indicadores põem em xeque a qualidade do ensino, ainda que o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), do Ministério da Educação (MEC), tenha apontado melhora em 2007.
- É muito grave que qualquer criança esteja na escola e não aprenda - disse a secretária de Educação Básica do Ministério da Educação (MEC), Maria do Pilar.
Para a parcela analfabeta da infância brasileira, a escola parece ter pouco a oferecer. Segundo a síntese, 5,2% das crianças continuavam iletradas aos 10 anos, embora 85,6% delas assistissem às aulas. Nessa idade, elas já deveriam estar na 4.ª série (5.º ano).
O assessor da Organização das Nações Unidas para a Ciência, a Educação e a Cultura (Unesco) no Brasil, Célio da Cunha, diz que é preciso melhorar a formação dos professores:
- Não se pode deixar entrar em sala um professor que não domine o instrumental básico para alfabetizar.
O secretário de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade do MEC, André Lázaro, prefere não falar em culpados, mas entende que a responsabilidade é do poder público e não de professores ou alunos.
Para Maria do Pilar, a gravidade do analfabetismo aos 8 anos deve ser relativizada, pois as crianças podem estar ainda no ciclo de alfabetização. Segundo ela, inadmissível seria um estudante completar 14 anos analfabeto. Só que isso acontece, segundo o IBGE. Aos 14 anos, 1,7% dos brasileiros (58,1 mil) eram analfabetos. Desse total, 45,8% estudavam.
Na média, o número de séries concluídas pelos brasileiros acima de 15 anos aumentou de 5,8, em 1997, para 7,3, em 2007, mas ficou abaixo do que seria adequado. A média de anos de estudo das crianças de 11 anos ficou em 3,3 e não em 4 anos, que seria o correto. Jovens de 14 anos atingiram 5,8 anos - o correto seriam 7. E os de 17 alcançaram 7,9 séries completadas, e não 10, como desejável.