Título: Tráfico mantém intimidação a candidatos
Autor: Mascarenhas, Gabriel; Lima, Ludmila de
Fonte: O Globo, 25/09/2008, O País, p. 13

Militares evitam entrar em favela da Baixada e equipe de Jandira é ameaçada por homens armados na Zona Oeste

Gabriel Mascarenhas, Ludmila de Lima e Sergio Duran

A presença do Exército nas eleições municipais do Rio não foi suficiente para garantir o clima de tranqüilidade das campanhas. No dia em que a Operação Guanabara chegou à Baixada Fluminense, traficantes soltaram fogos para intimidar fiscais do Tribunal Regional Eleitoral (TRE) na Favela do Lixão, em Duque de Caxias, onde as tropas permaneceram apenas do lado de fora. Apesar disso, os fiscais saíram da favela com dois caminhões basculantes cheios de propaganda irregular. Já na Zona Oeste, sem a presença de soldados, a candidata a prefeita pelo PCdoB, Jandira Feghali, se deparou com o poder do tráfico. Dezenas de traficantes ostentaram fuzis no trajeto da carreata pela Vila Vintém.

Outro episódio envolveu a equipe de filmagem da campanha do candidato do PRB a prefeito, Marcelo Crivella, orientada a não subir o Morro de São Carlos por causa dos criminosos.

A presença maciça de traficantes assustou integrantes da campanha de Jandira. Antes da Vila Vintém, a carreata da candidata já havia cruzado com homens armados com fuzis e pistolas na favela do Fumacê, também na Zona Oeste. A equipe do programa de TV de Jandira chegou a correr ao ver o grupo armado. Ela estava acompanhada dos candidatos a vereador William Coelho, Robertinho, Mário Del Rei (do PCdoB) e Edmilson Abs (PTN).

Embora a candidata afirme "não pedir licença" para entrar nas comunidades, Edmilson Abs - segundo um integrante da campanha - avisou, por celular, sobre a chegada da comitiva. Dentro da favela, o clima ficou ainda mais tenso quando carros de som de um candidato do PTC se infiltraram na campanha de Jandira. Mesmo com os pedidos da candidata, os veículos do candidato Sérgio Amorim, da coligação de Solange Amaral (DEM), provocaram os moradores e atrapalharam a carreata.

- Amigo, aqui a parada é da Jandira. Não é Solange, não - dizia a candidata do PCdoB ao microfone.

Crivella sobe; mas sua equipe, não

Do alto da caminhonete que levava a candidata, um narrador pedia para os eleitores não votarem "nessa elite, que mora na Barra". Após a agenda na Zona Oeste, Jandira, que já disse ser contra a presença das tropas, voltou a afirmar que não pede autorização para fazer campanha nessas áreas:

- Entro com pessoas que têm 50 anos de moradia, com candidatos que têm trabalho há anos no lugar. Eu não peço licença - disse ela, que até domingo concentrará a campanha na Zona Oeste.

Em outro ponto da cidade, no início da Rua São Carlos, onde a equipe de Crivella chegou depois da entrada do candidato, era constante a presença de motoqueiros fazendo rondas no acesso à favela. Ao passar por repórteres, um morador disse à imprensa para não subir, devido à falta de segurança. A equipe de filmagem da campanha aguardou por mais de três horas a saída do senador.

Segundo integrantes da equipe, a determinação de não entrar com equipamentos em favelas dominadas pelo tráfico ocorreu depois de um outro incidente na Vila Aliança, antes da ocupação pelas tropas. O carro de filmagem foi abordado por um grupo de homens armados. O bando retirou a equipe do carro e a revistou, sob ameaças.

- Se acharmos alguma coisa, vocês não saem daqui - teria dito um dos bandidos.

O episódio serviu de orientação para que a equipe não entre mais em comunidades, se não houver segurança. Depois de caminhar por cerca de três horas no interior das favelas, Crivella disse não ter sofrido qualquer intimidação do tráfico:

- Não vi homens armados, subi sem problemas.

A assessoria de campanha justificou a decisão da equipe de TV de não entrar como "algum erro de informação" recebida pelos funcionários.

Na Baixada, local em que estavam as tropas, também houve problemas. Na via de acesso à Favela do Lixão, um faixa dava um recado para o Exército: "Nesta comunidade tem democracia. O seu voto é livre". Ao lado, barricadas feitas com troncos de árvores impedia a entrada de carros na comunidade. Por determinação do juiz eleitoral Paulo César de Carvalho, a faixa foi arrancada. De manhã, os mil militares foram recebidos com fogos de artifício nas favelas de Gramacho, também em Caxias, e do Lixão. Ninguém foi preso e não houve apreensões; poucos candidatos se aventuraram a fazer campanha, apesar da ocupação. Em visita ao Lixão, o presidente do TRE, Alberto Motta Moraes, disse já esperar que a presença do Exército pudesse afugentar os candidatos.

- Aqui, não vi nenhum. Alguns políticos não querem associar a figura deles às Forças Armadas. Ainda há no nosso país esse conceito de Forças Armadas atreladas à revolução - disse Motta Moraes, em referência ao golpe militar de 64.

Por meio da assessoria de imprensa, o Exército afirmou que os pontos de ocupação são escolhidos pelo TRE e que não foi procurado para acompanhar os fiscais no interior do Lixão. Outros 2.500 militares ocuparão, a partir de hoje, as favelas de Vila Vintém, Pilar, Beira-Mar, Amarelinho e Acari.