Título: O patrão mandou chamar
Autor: Duarte, Alessandra
Fonte: O Globo, 26/09/2008, O País, p. 3

Cesar anima auditório lotado de servidores convocados para ato pró-Solange

Alessandra Duarte

Oevento não estava na agenda oficial da campanha de Solange Amaral (DEM), mas mais de 250 pessoas compareceram. Foram convocadas pelo "patrão", como Solange costuma chamar seu padrinho político, o prefeito Cesar Maia: eram professores e funcionários da rede municipal, além de diretores de escolas e creches - cargos comissionados, que dão direito a gratificação -, e anteontem à noite estavam no ginásio do Tijuca Tênis Clube para um evento de campanha com Solange, o vice na chapa, Pedro Fernandes, a secretária municipal de Educação, Sônia Mograbi, e Cesar. Enquanto Solange atacou o governo estadual, afirmando que o governador Sérgio Cabral disse que "os professores não gostam de trabalhar", Cesar, que discursou por último - tal qual a atração principal, guardada para o ponto alto de um espetáculo - disparou contra os adversários, sem saber que no evento havia uma equipe do GLOBO.

- A Igreja Universal do Reino de Deus tem 10% dos evangélicos. Tem televisão, rádio. Se só tem 10%, esse dinheiro vem de dízimos? Os outros (evangélicos de outras igrejas) não pagam dízimos? Só a Universal recebe dízimo? É muito estranho - disse Cesar. - A Solange, prefeita, nunca mais vai ouvir minha opinião? Será que o Crivella não vai ouvir o bispo Macedo nas decisões que ele vai tomar? Será que aquela equipe da qual ele participa é um grupo que não vai ser ouvido?

O prefeito então atacou o PMDB e seu candidato, Eduardo Paes:

- Alguém pensa que o grupo do PMDB, que opera de forma mafiosa, vai dar liberdade para alguém governar sem entregar as secretarias que interessam para aquela máfia? Será que a Secretaria de Urbanismo vai ser ocupada tecnicamente?

Sobre Jandira, curta declaração:

- A Jandira? Aquela arrogância, aquela prepotência... Dona da verdade, dona da esquerda.

Fernando Gabeira, candidato do PV, foi o mais poupado - mas nem tanto.

- Quem pode falar alguma coisa contra a coragem do Gabeira, contra seu currículo? Ninguém. Sou amigo do Gabeira. É capaz de manter a ética pessoal, conheço e garanto. Mas a ética política... Que discurso é esse de ordem urbana para quem defendeu o "liberou geral" durante sua vida quase toda? Peraí. Atrás de voto? Todos nós o admirávamos pela coragem com que ele defendia o "liberou geral", de ir à Câmara dos Deputados com chinelo feito de folha de maconha.

O pior ficou para Eduardo Paes:

- As Apacs todos dizem que vão rever. Esses dias, o Eduardo: "só vou discutir as (Apacs) que estão na Justiça". São todas! Todas estão na Justiça. Cínico, mentiroso, hipócrita. Vai destruir a Zona Sul. Vai querer mexer e destruir a Zona Sul.

A rede de educação é a maior estrutura da máquina da prefeitura, tanto em número de equipamentos (1.062 escolas e 252 creches) quanto de profissionais (pouco mais de 46 mil, somando professores, corpo administrativo e psicólogos). Além de chamar os servidores para o encontro - por telefone ou no boca-a-boca das dependências de escolas municipais, segundo servidores presentes -, as equipes de Solange e do prefeito arrumaram ainda o transporte para a festa: pelo menos cinco ônibus foram alugados para levar e buscar servidores.

Com a presença de candidatos a vereador como Paulo Cerri (que é líder do governo Cesar e tenta a reeleição pelo DEM) e Rojane (ex-subsecretária de Educação, do mesmo partido), o evento, que teve refrigerantes e petiscos, começou com a secretária de Educação, que centrou seu discurso nos feitos de Cesar para a pasta:

- Jamais vi um prefeito com compromisso com a educação como Cesar Maia. Um prefeito que equiparou o diretor de creche ao diretor de escola, que paga igual. Vocês sabiam que tem uma prefeitura de um determinado partido que paga metade para quem é professor da educação infantil? A Cesar o que é de Cesar.

Pedro Fernandes, ao discursar, também disse que os benefícios dados aos servidores por Cesar podem estar em risco se Solange não for eleita. O espetáculo estava chegando ao ponto alto: veio a hora de Solange discursar.

- Ontem quase não acreditei no que vi: o governador do PMDB falar dos servidores públicos. O governador dizia que policiais eram débeis mentais. Ontem, chamou os médicos de vagabundos. E outro dia disse que os professores não gostavam de trabalhar. É assim que o PMDB quer disputar eleição com a gente? Maltratando o servidor? - afirmou Solange, se apresentando como defensora dos servidores contra os ataques de seus adversários na campanha: - Todos eles começam a agredir o governo. Depois agridem o profissional, depois agridem a merenda...

Para o procurador regional do Ministério Público eleitoral, Rogério Nascimento, evento de campanha organizado por superior hierárquico de um profissional é abuso de poder econômico e político:

- Mesmo que não tenha havido coação para o servidor ir ao evento. Convite de chefe é ordem. Houve constrangimento ao servidor. Qualquer ação que faz um candidato se beneficiar do acesso a um determinado setor dos eleitores é abuso do poder político e econômico.

Ontem à noite, Solange participou de um jantar de apoio de funcionários da Comlurb, na Churrascaria Estrela do Sul, na Tijuca, com lista de presença na porta, onde alguns colocavam a matrícula. Acompanhada do deputado federal Rodrigo Maia, presidente nacional do DEM, Solange disse que "o candidato do PMDB tem que explicar por que o governo do estado abandona seus hospitais". Rodrigo prosseguiu nas críticas, afirmando que "se o Eduardo, que já fez parte do nosso grupo mas trocou de lado, vencer as eleições, certamente não vai governar conosco, vai governar com os que estão na TV com eles":

- Ou a filha do Garotinho é candidata para não ter poder?

COLABOROU: Paulo Marqueiro