Título: Socorro americano revisado
Autor: Passos, José Meirelles
Fonte: O Globo, 29/09/2008, Economia, p. 17

Câmara prevê votar hoje pacote, com participação do governo em empresas e limite a bônus

José Meirelles Passos*

Uma versão ampliada, contendo várias alterações significativas, do pacote de US$700 bilhões para socorrer bancos e financeiras de Wall Street foi concluída ontem - depois de dez dias de intensas negociações entre o governo dos Estados Unidos e o Congresso. O novo texto prevê a participação do Estado nas empresas em dificuldades e restrições aos vultosos salários dos executivos. Além disso, restringe os poderes do secretário do Tesouro, Henry Paulson, na forma de dispor desses recursos. Ele terá de informar detalhadamente ao Congresso todas as operações acima de US$50 bilhões.

O novo texto propõe garantias mais concretas aos contribuintes - de cujo bolso sairão os recursos -, além de impor mudanças ao funcionamento do mercado financeiro. Uma delas é a limitação dos milionários salários dos diretores-executivos das empresas do setor.

- Estamos começando uma tarefa muito importante. A de estabilizar os mercados e proteger todos os americanos, e fazer isso de uma forma que proteja o máximo possível o contribuinte - disse Paulson.

Apesar de o acordo ter sido celebrado formalmente no início da noite de ontem, entre os líderes da Câmara e do Senado com o Departamento do Tesouro, ainda não há garantias de que ele será aprovado - ou, pelo menos, aprovado exatamente como está registrado no documento preliminar de 106 páginas. O original, preparado pelo Tesouro, tinha três páginas e meia.

A Câmara pretende votar o pacote hoje. O Senado planeja fazer isso na quarta-feira. O objetivo de seus líderes é o de não somente aprovar a nova legislação, como também obter o maior índice possível de votos - ou seja, o suficiente para evitar que o presidente George W. Bush possa vetar alguns de seus itens.

Deputados e senadores ainda poderão propor modificações, o que estenderia as negociações.

- Conversamos intensamente com as nossas bases, mas agora temos que obter os votos necessários para a aprovação - disse Harry Reid, líder da maioria democrata no Senado.

Nancy Pelosi: "A festa acabou!"

Ao saber do acordo, Bush emitiu um curto comunicado, pedindo pressa aos parlamentares: "Essa é uma votação difícil, mas com as melhorias que fizemos na lei (o pacote sugerido) estou confiante de que o Congresso fará o que é melhor para a nossa economia, aprovando logo essa legislação". E acrescentou que, sem o plano, "os custos para a economia americana seriam desastrosos".

O pacote tem cinco pontos essenciais. O primeiro estabelece que os US$700 bilhões para a compra de hipotecas e títulos podres serão desembolsados em três etapas. A primeira, imediata, é de US$250 bilhões, a segunda, de US$100 bilhões e a terceira, de US$350 bilhões - esta depende de aval do Congresso.

O segundo ponto estabelece a imposição de restrições à compensação dos executivos das firmas que venderem bens hipotecários ao Tesouro. O terceiro determina a criação de um conselho para fiscalizar as operações contidas no pacote.

Pelo quarto ponto, o Tesouro terá a opção de se transformar em acionista das empresas que participarem do programa. Dessa forma, à medida que estas voltem a ter lucro, os contribuintes que agora ajudam a salvá-las seriam compensados. Por último, o Tesouro poderá criar um programa de seguros para garantir os bens das empresas que estão com problemas.

- A festa acabou! Terminou a era dos "pára-quedas dourados" para os operadores de Wall Street que voavam alto - comemorou Nancy Pelosi, líder democrata e porta-voz da Câmara, ao anunciar o acordo, referindo-se às restrições que serão impostas aos generosos pacotes de indenização daqueles profissionais.

Preocupada com a rejeição que esse pacote despertou nos americanos em geral, a deputada procurou defini-lo de outra maneira, buscando minimizar o fato de estar usando dinheiro público para salvar empresas privadas cuja ganância provocou a crise.

- Não se trata de uma operação de salvamento de bancos e financeiras, e, sim, da compra de papéis dessas empresas - afirmou Nancy. - Os contribuintes nunca mais pagarão pelos erros dos excessos cometidos em Wall Street.

Na verdade, ainda não há garantias disso. O pacote, afinal, contém medidas que visam apenas a fazer o mercado voltar a funcionar de forma dinâmica. Ele dá fôlego a bancos e financeiras para que voltem a emprestar, reabrindo o crédito para os consumidores. Ou seja: busca reativar a economia. Mas não estipula as necessárias correções dos problemas que causaram tal crise.

Isso, explicaram legisladores, fará parte de uma segunda fase.

- Sabemos que houve avareza e falta de fiscalização em Wall Street. Por isso, vamos realizar investigações para saber como chegamos a esse ponto - prometeu Harry Reid, líder da maioria democrata no Congresso.

Barney Frank, líder dessa mesma maioria na Câmara, reforçou:

- Iremos à raiz do problema no próximo ano, para que isso jamais volte a acontecer.

Candidatos manifestam apoio

Ambos os candidatos presidenciais manifestaram apoio ao pacote, embora deixassem transparecer que este não lhes agradava totalmente.

- Isso é algo que vamos ter de fazer força para engolir e seguir em frente. Mas a opção de não fazer nada é simplesmente inaceitável - disse o republicano John McCain.

Seu adversário, o democrata Barack Obama, disse que não havia outra saída a não ser agir:

- Essa crise é um escândalo. E agora nos vemos forçados a limpar a sujeira. Temos de agir já. Mas agir responsavelmente, porque estamos numa situação em que nossos empregos, nossa vida e a estabilidade de toda nossa economia estão em risco.

Bush fará um pronunciamento hoje, às 8h35m (horário de Brasília), sobre o pacote.

Ontem à noite, as autoridades reguladoras americanas ainda tentavam acertar a compra do Wachovia, o quarto maior dos EUA, pelo Wells Fargo ou pelo Citigroup, informou o "New York Times". Em Tóquio, o Nikkei operava em ligeira alta, de 0,48%, como reflexo do acordo sobre o pacote de resgate americano.

(*) Com agências internacionais

BANCO BELGA FORTIS VAI RECEBER 11,2 BI , na página 18

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