Título: É triste culpar os assentados
Autor: Alencastro, Catarina; Aggege, Soraya
Fonte: O Globo, 30/09/2008, O País, p. 3

Presidente do Incra reage a levantamento

Catarina Alencastro e Anselmo Carvalho Pinto*

BRASÍLIA e CUIABÁ. O presidente do Incra, Rolf Hackbart, disse que os 11 assentamentos do órgão que aparecem no ranking dos cem maiores desmatadores do país são antigos, criados entre 1995 e 2002. Ele culpou o modelo agrícola de monocultura pelo problema e disse acreditar que os desmatamentos tenham ocorrido em 1998. Devedor de R$265,6 milhões em multas para o Ibama, o Incra questiona o parecer que sustenta a cobrança.

- O Ibama multou o Incra com base numa foto de satélite de 1997. A maioria das fotos é de 97 e uma, de 2006. Quando é que houve o desmatamento? Até agora não nos informaram. O que me surpreende é que existe um grande desmatamento em unidades de conservação - rebateu Hackbart, acusando também o Ibama de permitir devastação em suas próprias áreas.

Hackbart desqualificou o levantamento afirmando que a localização que o Ibama aponta para o assentamento Itanhangá/Tapurah é 200 quilômetros distante de sua real posição. Ele contestou as declarações do ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, e garantiu que os assentamentos têm plano de manejo. Segundo ele, isso vem sendo feito desde 2003 e quase a totalidade dos assentamentos de Santa Catarina contam com o projeto que orienta o uso da terra para atividade agropecuária, levando em conta compensações ambientais.

- É muito triste o país ficar discutindo reforma agrária como o maior desmatador quando sabemos que quem mais protege o meio ambiente no país são os assentamentos, os ribeirinhos e os povos indígenas. Está se tentando mascarar o desmatamento como sendo responsabilidade da reforma agrária. A prioridade da reforma agrária é a proteção do meio ambiente, dos alimentos - protestou, lembrando que nos assentamentos listados vivem 7.239 famílias.

Em Mato Grosso, porém, dos 70 assentamentos rurais do Incra na Floresta Amazônica, apenas um tem licença ambiental. Em fevereiro, o Tribunal de Contas da União (TCU) deu prazo até junho para que o Incra regularizasse a situação, o que ainda não aconteceu.

- Eles (Incra) não estão conseguindo fazer o licenciamento. Por mais que a gente tenha boa vontade, há lá dentro uma série de problemas estruturais que os impede de dar conta do trabalho - disse ontem o secretário adjunto de Qualidade Ambiental da Secretaria de Estado de Meio Ambiente (Sema), Salatiel Alves de Araújo.

Em Mato Grosso, é o órgão ambiental estadual que emite as licenças. Entre os requisitos necessários para o licenciamento estão imagens de satélite e levantamento de todos os lotes da área. O Incra tem apenas oito servidores para realizar o trabalho em todo o estado. Uma vistoria realizada pelo TCU no final do ano passado já acusava o Incra de ser omisso em relação ao cumprimento da legislação ambiental. O relatório apontava que os assentamentos em áreas menores de 100 hectares eram responsáveis por 18% do desmatamento na floresta.